Momentos de atualização e reflexão.
Uma maior distância histórica vai permitir
compreender melhor o que hoje vivemos.
Por agora, observamos, registamos
e interpretamos sinais.
A natureza do relatório: Quem? Como? Porquê?
O quê?
Relatório de Tendências Socioculturais, com foco nas realidades de Lisboa.
Como?
Mediante uma pesquisa empírica, de campo e secundária usando seis métodos diferentes.
Quem? Estudo realizado pelos estudantes do Mestrado em Cultura e Comunicação, com o apoio de doutorandos em Estudos de Cultura e de docentes do Programa em Cultura e Comunicação.
Onde? Estudo organizado e editado pelo Laboratório de Gestão de Tendências e da Cultura, um projeto do Programa em Cultura e Comunicação e do CEAUL (Centro de Estudos Anglísticos da Universidade de Lisboa), Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
Quando? O processo de estudo e sistematização dos resultados teve lugar entre entre Fevereiro e Maio de 2021 e Fevereiro e Julho de 2020.
Este trabalho nasce de uma experiência pedagógica de oito anos que parte da abertura, em 2012, da Pós-Graduação de Especialização em Comunicação de Tendências até ao momento atual onde a análise de tendências socioculturais tornou-se um conteúdo e tópico de investigação no âmbito do Mestrado em Cultura e Comunicação e do Doutoramento em Estudos de Cultura. A par disso, bebe também da experiência de uma “escola” portuguesa em Estudos de Tendências que se começa a desenvolver em Lisboa desde 2009 e que em 2014 vê o surgimento do Trends Observer como uma rede científica que ainda hoje é uma importante referência e base para a nossa investigação. Tudo isto, com diferentes fases e mediante vários projetos, acaba por sublinhar a cidade como um polo da análise de tendências com produção científica na área. Neste contexto, surge o Projeto/Laboratório de Gestão de Tendências e da Cultura, associado ao Programa em Cultura e Comunicação e ao CEAUL, ambos unidades da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Esta é uma articulação entre a pesquisa em desenvolvimento num contexto de centro de investigação e a formação em contexto de estudos pós-graduados. Tendo em conta a grande quantidade de informação e um processo de observação contínua, este relatório não assume uma natureza fechada e estará em constante atualização até Dezembro de 2021. No âmbito dos diferentes métodos de análise aplicados na fase de observação e recolha (do coolhunting às entrevistas e aos inquéritos), selecionámos um largo conjunto de dados e de resultados para apresentar abaixo no relatório, sendo que pretendemos incluir mais até Dezembro através de um processo de curadoria partilhada.
Fruto deste contexto, e com um roteiro metodológico publicado e aceite entre os pares (aliás, parte também da experiência internacional de profissionais e especialistas), surgiu a necessidade de criar um mapa de tendências socioculturais próprio. A experiência adquirida neste processo pelos intervenientes e a existência de um corpo de docentes e jovens investigadores de doutoramento permitiu formatar o briefing para o exercício de identificação de tendências (baseado nos trabalhos de Gomes, Cohen, Cantú, Lopes, 2021; Gomes, Cohen e Flores, 2018) e trabalhar o mesmo com os estudantes do Mestrado em Cultura e Comunicação da FLUL. Este ponto é muito importante para nós. Este é um exercício científico, mas primeiro que tudo pedagógico. Os objetivos passaram também por formar estudantes de mestrado e introduzir os mesmos nesta prática de análise, revendo os resultados de aprendizagem. A par disto, os estudantes do Doutoramento em Estudos de Cultura, a desenvolver investigação em Estudos de Tendências, agiram como tutores dos mestrandos e apoiaram a orientação e o desenvolvimento da pesquisa e da análise. Não é demais sublinhar a importância de todos estes estudantes, sem os quais o estudo não teria tido lugar e que aplicaram os diferentes métodos numa análise empírica, de campo e de revisão literária. A motivação de todos foi clara e daí resulta a complexidade deste trabalho.
Noutra nota que importa sublinhar, fruto dos projetos anteriormente desenvolvidos e da missão do Laboratório, decidimos dar um cunho local a este relatório. Apesar deste tipo de investigação pretender identificar tendências macro internacionais – partido das influências da globalização e a disseminação global de mudanças nas mentalidades; a nossa pesquisa colocou Portugal e principalmente a cidade de Lisboa em destaque. Por outras palavras, trabalhamos com tendências socioculturais observadas à luz das suas manifestações no nosso contexto e os resultados sublinham essa importante orientação.
Equipa e Ficha Técnica
Tendências Socioculturais 2021: a transição dos coletivos”.
Copyright © 2021 Laboratório de Gestão de Tendências e da Cultura, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Editado e Organizado por Nelson Pinheiro Gomes
Colaboradores Autorais 2021: Amanda Melo, Luísa D. Cortés, Ana Manhique, Lucas Corrêa, Andressa Maia, Isabel Gomes, Maria Frederico, Catarina Domingues, João de Atayde e Melo, Luíza Caxiano, Eduardo Altafim, Vanja Favetta, Érica Monteiro, Margarida Simões, Tatiana Abrahão, Júlia Rocha, Ni Min.
Colaboradores Autorais 2020: Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques, Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos, Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, Marianna Rosalles, Francisco Mateus, Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes.
Revisão do ADN e Textos das Tendências:
Nelson P. Gomes; William A. Cantú; Manuel Pinto Grunfeld; Leonardo Zeitune; Sarita Olveira.
Grupo de Foco para Discussão das Hipóteses:
Nelson P. Gomes; Suzana Cohen; William Cantú; Ana Marta Flores; Illa Branco; Raquel Sodré; Fernanda Rosales; Jefferson Pereira; Manuel Pinto Grunfeld; Leonardo Zeitune; Filipa Moreira; Patricia Gonçalves.
Design e layout por William Cantú
Organização de
Laboratório em Gestão de Tendências e da Cultura
Programa em Cultura e Comunicação e Centros de Estudos Anglísticos da Universidade de Lisboa
FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA
Publicado digitalmente em 19-07-2021, Lisboa.
https://creativecultures.letras.ulisboa.pt/index.php/gtc-trends2021
nelsonpinheiro@campus.ul.pt
Metodologia
A Identificação e Análise de Tendências Socioculturais
Para a estruturação desta pesquisa seguimos as abordagem de identificação de tendências propostas por Nelson Pinheiro, Suzana Cohen e Ana Marta Flores (2018). A mesma foi desenvolvida com base na articulação das perspetivas de diferentes autores (a sublinhar Dragt, 2018; Raymond, 2010; Vejlgaard, 2008; entre outros) e pretende informar um modelo de Trendspotting e Trendwatching, ou seja, de identificação e análise de tendências. Este exercício pressupõe três fases: (1) observação cultural e recolha de dados (Gomes, Cohen e Flores, 2018, pp. 66-73) onde a hipótese é enquadrada tendo em conta um cruzamento das fontes analisadas; uma pesquisa qualitativa com os públicos (como sublinhado por Raymond, 2010), abordando entrevistas e inquéritos; e um conjunto de coolhunts (ver Rohde, 2011; Gloor e Cooper, 2007) – o coolhunting assume aqui um papel de destaque, como prática de inspiração etnográfica/netnográfica que procura sinais criativos que indicam a emergência de novas práticas e representações no âmbito de alterações nas mentalidades. (2) A sistematização da informação (Gomes, Cohen e Flores, 2018, pp. 74-75) pressupõe uma interpretação aprofundada dos dados e a sua análise num contexto de geração de ligações por afinidade (ver também Dragt, 2017; Mason et. al, 2015) para sistematizar a informação e criar grupos de dados que permitem construir uma perspetiva clara sobre a arquitetura e natureza das tendências. (3) a última fase pressupõe o desenho e a arquitetura do ADN da tendência (Gomes, Cohen e Flores, 2018, pp. 87-77) onde, com base nos grupos sistematizados, identificamos a natureza da tendência sociocultural e construímos o seu ADN e o texto descritivo da mesma. Estes textos passam depois pelo crivo de um grupo de pares, especialistas em Estudos de Tendências e em dinâmicas socioculturais, através de um processo Delphi ou de um grupo de foco, de forma a rever o texto final à luz dos dados da investigação.
Horizonte Temporal e Escopo
As tendências não nascem e morrem de um ano para o outro e também não sofrem alterações profundas num minuto. Neste sentido, queremos reproduzir interpretações baseadas em elementos recolhidos no ano específico da análise (o mais rico em termos de alguns dados), mas não queremos desconsiderar os elementos recolhidos nos anos anteriores. Fruto do nosso conhecimento das dinâmicas das tendências (das suas mutações, articulações e transformações), é importante compreender a sua evolução num espectro mais largo. O nosso objetivo não é comercial, onde existe a pressão para apresentar “algo novo” a cada ano. O nosso objetivo consiste em monitorar as mudanças no mapa sociocultural que impacta a cidade de Lisboa e o seu macro contexto. Assim, cada relatório considera também os dados e as leituras dos anos anteriores, articulando os mesmos com a visão mais recente sobre novas dinâmicas e fenómenos.
Em termos de espaço, temos consciência que o processo de globalização dissemina mentalidades num ritmo cada vez maior e num expectro crescentemente internacional. Neste sentido, estas macro tendências são também um reflexo desses movimentos de ideias estruturadas. Por outro lado, compreendemos as limitações desta perspetiva, pois cada realidade geográfica é específica. Isto obriga ainda mais a uma articulação entre redes/instituições e especialistas para partilhar os diferentes objetos e as suas interpretações contextualizadas. Importa gerar uma discussão com pessoas diferentes, oriundas de espaços diversos e com experiências e visões também diversas. Este estudo, consciente de todas estas questões, contribui para uma perspetiva local, inserida num contexto ocidental, com foco nas realidades da cidade de Lisboa.
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Aplicação do Exercício
Como já foi referido, este trabalho surge de um contexto pedagógico e está inserido em unidades curriculares de 2º e 3º ciclo no âmbito do Programa em Cultura e Comunicação. Os estudantes de mestrado que participaram em 2020 foram organizados em cinco grupos, cada um com uma hipótese inicial e um conjunto de tópicos culturais associados. Cada grupo desenvolveu a sua pesquisa e o processo de identificação de tendências, seguindo o modelo de três fases atrás descrito que foi traduzido num briefing com instruções específicas pelo docente responsável, o Prof. Nelson Pinheiro. A investigação, desde a primeira fase até à entrega dos textos preliminares das tendências, teve lugar entre 5 de Fevereiro e 15 de Maio de 2020. Cada grupo, para além do docente responsável, teve o apoio de um tutor – doutor ou estudante de doutoramento a desenvolver investigação na área dos Estudos de Tendências. Em 2021, fruto da evoluções do contexto pandémico, cada grupo foi destacado para a monitorização de uma macro tendência identificada no ano anterior e identificação de possíveis micro tendências; e para a hipótese de uma micro tendência relacionada com as manufacturas urbanas e culturais colectivas.
Nesta primeira fase os alunos abordaram seis métodos diferentes, de acordo com o seu exercício:
Método 1 – Desk Research, Pesquisa de fontes secundárias.
Também conhecida como pesquisa secundária, procura identificar trabalhos já realizados sobre a hipótese e os seus tópicos, ao contrário do trabalho empírico e de campo realizados de raiz para a investigação. Foram considerados relatórios e outras fontes capazes de trazer dados iniciais para a pesquisa. Este exercício foi desenvolvido tanto por estudantes de 2020 como de 2021, sendo que em 2021 também se promoveu uma breve revisão literária.
Método 2 – Clipping dos Media
Partindo da premissa de que os media sublinham questões de destaque em discussão na praça pública, este relatório beneficiou da recolha notícias dos principais jornais nacionais e de outras fontes internacionais relacionados com as hipótese dos grupos de 2021.
Método 3 – Coolhunting
O método de Coolhunting foi aplicado com base numa amostra por conveniência. Em média, cada grupo de 2020 e 2021 identificou 20 sinais Cool. Destes, cada grupo analisou em profundidade os que consideraram mais representativos da hipótese/tendência. Na análise dos resultados foi considerado o universo total de sinais identificados por cada grupo, com destaque para os significados e insights impressos nos sinais mais representativos das hipóteses.
Método 4 – Análise Audiovisual
Partindo da premissa que a produção audiovisual tem o potencial de traduzir mudanças nas mentalidades e a emergência de novas narrativas e construções simbólicas, importa compreender os significados que se encerram nestes produtos. Para tal, os grupos de 2020 recolheram informações sobre (1) os filmes exibidos em Portugal nos últimos cinco anos (1860 títulos revistos) e (2) as produções disponíveis na plataforma Netflix em Portugal. Cada grupo analisou as sinopses e os conteúdos de cada objeto e sublinharam as devidas associações com as hipóteses, de modo a compreender o peso e a expressão de cada tendência no total das produções analisadas.
Método 5 – Inquéritos
Cada grupo de trabalho desenvolveu um inquérito para habitantes, trabalhadores ou estudantes da cidade de Lisboa a ter lugar online com recurso a comunidades das redes sociais. Os inquéritos tiveram lugar entre 20 de Abril e 9 de Maio 2020, tendo o exercício obtido um total de 496 participações, no âmbito de uma amostra aleatória. Em 2021, certos grupos decidiram também fazer questionários para confirmar as informações recolhidas.
Método 6 – Entrevistas
Em 2020, cada grupo de trabalho realizou entrevistas semi-estruturadas por conveniência com indivíduos do público geral, ou com profissionais/especialistas relacionados com os tópicos das hipóteses. No total, tiveram lugar, entre 15 de Abril e 13 de Maio de 2020, um total de 51 entrevistas. Destas, 12 com o público geral e 39 com profissionais ou especialistas nas temáticas.
Em Maio de 2021, após reunirem os dados de cada método e de tirarem as conclusões iniciais (que partilhamos neste relatório mais abaixo), cada grupo de estudantes sistematizou a informação e os resultados e agruparam os mesmos por afinidades em insights (pistas estratégicas) sobre a natureza da tendência em estudo. Com isto, de seguida, estruturaram algumas bases para o ADN das micros tendências. Com estes dados e os principais resultados da pesquisa, os investigadores e jovens investigadores do Laboratório em Gestão de Tendências e da Cultura reviram as descrições já estabelecidas e o ADN das tendências, mediante um processo de vários grupo de foco, que deram lugar aos textos finais da tendências no dia 16 Julho de 2021.
Referências:
DRAGT, Els (2017). How to Research Trends. Amsterdam: Bis Publishers.
GLADWELL, Malcolm (2006). The Tipping Point: How little things can make a big difference. New York: Little Brown.
GLOOR, Peter e Scott Cooper (2007). Coolhunting: Chasing down the next big thing. New York: Amacom.
GOMES, Nelson; Cohen, Suzana; Flores, Ana Marta (2018). “Estudos de Tendências: Contributo para uma abordagem de análise e gestão da cultura”. Moda Palavra, V.11, N.22.
HIGHAM, William (2009). The Next Big Thing. London: Kogan Page.
MASON, Henry; MATTIN, David; LUTHY, Maxwell; DUMITRESCU, Delia (2015). Trend Driven Innovation. New Jersey: Wiley.
PORTA, D.; KEATING, M. (2008). Approaches and Methodologies in the Social Sciences: A pluralist Perspective. Cambridge: Cambridge University Press.
RAYMOND, Martin (2010). The Trend Forecaster´s Handbook. London: Laurence King.
ROHDE, Carl (2011). “Serious Trendwatching”. Tilburg: Fontys University of Applied Sciences and Science of the Time.
VEJLGAARD, Henrik (2008). Anatomy of a Trend. New York: McGraw-Hill.
O nosso código sociocultural.
“Culture is ordinary” and “a whole way of Life” (R. Williams)
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Tendência Narrativas Ancoradas / Anchored Narratives
macro // Narrativas Ancoradas
Esta tendência sublinha a importância dos repositórios simbólicos e os processos de construção de narrativas. Num mundo em constante e crescente mudança – cada mais plural, fluido e líquido – estes repositórios atuam como âncoras. Eles permitem uma construção simbólica com base (1) em elementos sólidos das memórias coletivas e (2) numa personalização tanto criativa como mimética. O resultado são construções fluidas – entre o passado e a experiência individual – com um objetivo de projeção futura, ou seja, desenhadas para um futuro. Futuro este que, de certa forma, já habita a consciência do presente. Desta forma, este processo de construção de narrativas é tanto um resultado como uma causa de mudanças.
Estas estórias e narrativas são criadas com base nas fontes simbólicas e fruto de uma curadoria que procura gerir uma fluidez entre memória e a personalização criativa das estórias. São reciclagens sígnicas num constante processo de revisão dos significados, uma contínua revisitação dos símbolos que se encontram nos espaços físicos e digitais e que geram novas formas de narrar e de envolver os públicos. Isto considerando uma imersão que ultrapassa as diferentes fronteiras do real e da perceção.
Através de estórias, as marcas ganham personalidade e uma nova natureza; os espaços criam narrativas a ser experienciadas; as comunidades geram processos de reconhecimento e identificação que transitam entre o coletivo e a construção individual; criam-se novos processos de relação entre públicos, artefactos e instituições; o autentico é debatido e redesenhado/revisitado. A legitimidade do processo e das narrativas fica emaranhada na fluidez das referências e das camadas das estórias, em ondas de visões orientadas para o futuro e o passado. A tensão entre o sólido e o líquido exige um recurso à memória coletiva e parece que, cada vez mais, intensifica-se o recurso a este repositório de âncoras simbólicas. Veja-se os conceitos de Bauman, Lipovetsky e Don DeLillo.
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micro // Arquipélagos urbanos e digitais
A experiência na cidade difere-se entre os seus habitantes, a partir de uma matriz fortemente relacionada com o acesso ao próprio espaço urbano. No cenário das grandes cidades observamos a formação de novas zonas, dispersas no espaço coletivo mas centrais em termos de referenciais identitários, culturais e da produção de identidades. Estas ilhas compõem um arquipélago de realidades que entram em contato no convívio quotidiano, provocando encontros de descoberta e tensão entre identidades, práticas, representações e discursos mediados por diversas manifestações socioculturais. Falamos de cidades híbridas como espaços não fixos que possibilitam navegações. Aliás, como a nossa filiação identitária é plural, muitas vezes navegamos pelos diferentes espaços identitários, de realidade em realidade, de narrativa em narrativa, articulando o divergente através da vivência dos espaços. Estes últimos, para além do ambiente físico, ganham dimensões virtuais a partir de conteúdos digitais interativos que podem ser acedidos em qualquer lugar. O fluxo e a interação globais, físicos e digitais, atingem um novo escopo de possibilidades, ligando pessoas a espaços através da promoção de experiências que agora podem ultrapassar limites anteriores.
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micro // iNostalgia
O sentimento de nostalgia, enquanto saudade idealizada do passado, promove representações, práticas e artefactos anacrónicos, influenciando comportamentos, espaços e produtos nas dinâmicas atuais. Esta tendência tem ao seu alcance o repertório simbólico e o contexto em que habitam os artefactos e a memória coletiva. Muitas vezes, é uma construção idealizada através da memória, da narrativa, ou da construção de outro. Uma articulação e hibridização entre a nostalgia de algo vivenciado e de algo sonhado, ou assimilado por contacto secundário. Uma convergência de memórias e de imaginários. A saudade do que não foi vivido sublinha também uma nostalgia pelo que poderia ter acontecido se as circunstâncias fossem outras. Não obstante, neste mundo em crescente mudança, as memórias fortes e os símbolos mais sólidos são guias, uma segurança, e uma estabilidade que permite navegar as mutações de identidades e padrões de produção/consumo cultural. Esta micro tendência vai para além da coisa, sublinhando-se a importância do sentido que, sendo sempre algo individual, parte da estrutura coletiva e não privada – é partilhada. Valendo-se de referenciais consolidados no imaginário coletivo, o desenho de experiências; de obras audiovisuais; e de outras soluções ao nível de produtos culturais e serviços recorrem à adaptação ou atualização de narrativas já existentes num constante remake do repositório simbólico global. Em novas nuances, o analógico, antes obsoleto, provoca agora associações simbólicas com impacte positivo num processo de identificação emocional entre os públicos. A partir destes conteúdos vivenciamos um tempo que se mostra cada vez mais curto entre o que é novo e o que é velho, misturados nas possibilidades de acesso proporcionadas pela rede.
Micro // As Linguagens (In)Flexíveis
Cada vez mais, importa estar contextualizado nos repositórios simbólicos mais pertinentes do momento. Do digital, ao mundo dos jogos, e à crescente pulverização de comunidades urbanas surgem cada vez mais dialectos com um potencial para separar e juntar indivíduos. Isto obriga a uma fluência cultural cada vez mais plural e capaz de gerar articulações inovadoras entre diferentes ambientes e grupos. A crescente velocidade de mudança das linguagens, dos objetos e das práticas aliada à crescente mutação e mudança do cool promove uma necessidade de atualizar constantemente as literacias do quotidiano para manter um processo atualizado de codificação e de descodificação dos discursos e da produção cultural. As próprias ferramentas, muitas delas digitais como aplicações, moldam as linguagens. Importa ponderar estratégias à luz deste novo sistema de produção de significados e representações.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Tendência Identidades Protagonistas / Protagonist Identities” open=”no”]
macro // Identidades Protagonistas
Esta tendência sublinha uma tensão, de grande mudança, entre os protagonismos coletivo e individual. Uma tensão entre (1) as categorias coletivas em debate e (2) o fim das mesmas numa construção apenas individual, resultando num hibridismo e numa revisão constante do conceito de identidade. Uma porosidade pendular que tanto enaltece as categorias como recusa os rótulos. Uma tendência que sublinha várias representações e construções identitárias em diálogo permanente e perpétuo, na busca por um resultado final que não existe e cujo futuro imaginado muda a cada momento.
Assim, por um lado, a ânsia por representatividade, para além do que disposto e disponível pelas diferentes tipologias de autoridades – órgãos governamentais e a sociedade em geral – surge pela urgência do auto-identificar, auto-pertencer e auto-expressar. A equidade nas relações humanas passa a ser o foco principal. Vivenciamos uma constante revisitação de categorias, que também se tornam alvo de contestações, disputas e resistência: a memória oficial parece não bastar enquanto forma de representação de diferentes grupos que coexistem nos mesmos espaços. Vemos, então, a atualização de ferramentas socioculturais para a manutenção e valorização de memórias coletivas e matrizes identitárias individuais e comunitárias, acompanhando as transformações dos modos de vida e as possibilidades sociais, económicas e tecnológicas. A procura pelas histórias fundadoras não desaparece, agregando uma proposta de reciclagem do olhar sobre o passado que permita a inclusão de matrizes identitárias não hegemónicas enquanto voz ativa; e do peso de novas dinâmicas híbridas e tribais muitas vezes baseadas na partilha de determinadas representações/artefactos e práticas de consumo.
Em simultâneo, verificamos que as denominações e formas de expressões identitárias atuais, e mais tradicionais, não são suficientes na demanda por uma autoexpressão que com o passar dos tempos se tornou mais plural do que nunca. Atualmente vivemos a expansão de categorias identitárias, uma construção que surge de dentro de cada um para fora e para o visível. A memória é desafiada pelas vozes que surgem de dentro e pela liquidez na construção das arquiteturas identitárias individuais e grupais. Uma construção de identidades protagonistas sem fronteiras e sem restrições.
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micro // Corpos Políticos
Num contexto de falta de equidade na representatividade e de confiança nas autoridades e nos media, somos nós corpos políticos, os principais agentes ativos de transformação. Surge assim um movimento de grupos que procuram, de forma coletiva e individual, tomar as rédeas e promover políticas, transformando os sistemas atuais e enfrentando medos e reações adversas das classes dominantes. A expressão destes corpos políticos é múltipla e já não é uma questão física e material. Ela está latente nos discursos e na rotina online. É uma política orientada não só para ideias, mas também para identidades.
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micro // Polarizações
Vivemos num mundo polarizado, gerado pelas diferentes perspetivas sobre política, economia, identidades, práticas e crenças. A polarização é uma contra força em relação à pulverização de narrativas, de identidades e de perfis, gerando novos tipos de públicos: polarizados. A polarização vem de fora (do coletivo) para dentro (para o indivíduo) como a negação de algo. Não há meio termo nem lugar para os que não estão nos polos. Sublinhe-se a necessidade de escolher um lado claro, uma escolha imposta. Podemos ser “cancelados” de acordo com o lado escolhido. A desinformação, a falta de informação, a iniquidade, e o acesso fácil – muitas vezes anónimo ou impessoal – a plataformas sociais para a partilha de opiniões promovem esta violência que se ancora no antagonismo em relação ao outro.
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micro // Tribos Cool
No seio desta liquidez identitária de uma perene, mas agora em destaque, tensão entre uma matriz individual e comunitária, sai reforçada a discussão sobre a construção de estilos de vida associados aos interesses e traços identitários de cada um. Tal como nas décadas anteriores, eu pertenço a grupos e a tribos mas a forma como navego nos mesmos é cada vez mais líquida. Eu desenvolvo a minha interpretação das dinâmicas, representações, práticas e artefactos por trás de cada grupo e escolho aqueles que fazem sentido para mim, numa negociação constante com a tribo e com a minha própria voz. A minha identidade é um mosaico de associações, num guião que escrevo a cada dia, e com isto acabo por contribuir para a reinvenção dos próprios grupos a que pertenço.
micro // Exponencialmente Real
Num mundo onde existe um excesso de produção de conteúdo e cada vez mais ferramentas e técnicas de manipulação, o consumidor quer identificar-se com narrativas originais que permitam (i) um processo de identificação; (ii) um processo de descoberta e/ou resolução de problema numa dinâmica quase “gamificada”; (iii) o desenvolvimento de competências e de ideias; (iv) um entretenimento imersivo e por vezes interativo. É verdadeiramente um “reality show”, onde rotinas são expostas, promovidas, validadas e/ou vendidas. Sim, de certa forma, os estilos de vida “estão à venda”. Isto obriga as marcas, os influenciadores e a população em geral a um escrutínio crescente – muitas vezes até uma perseguição para encontrar falhas e denunciar. Isto numa perspetiva de grande visibilidade e escrutínio público-privado, podendo homologar indivíduos, personagens, produtos e marcas, entre outros. Estas necessidades e a capacidade de escrutínio obrigam a um excesso na procura pela originalidade e sugerem a necessidade de uma transparência total. Estamos perante uma fusão e vulnerabilidade entre o físico e o digital (a queda das fronteiras), entre o próprio e o público, pelo que estas identidades protagonistas devem estar acessíveis em todos os momentos e aspetos do quotidiano, permitindo uma imersão total que cria uma tensão no conceito de real e que gera uma exposição num contexto promovido de anti-privacidade consentida. Aliás, a pandemia veio sublinhar ainda mais o fim da divisão entre espaços/momentos privados e públicos, exigindo uma hipérbole do visível em binómios como online-offline, em direto-diferido, físico-digital, trabalho-escola-lazer, entre outros. Tudo isto resulta na necessidade de ir a novos níveis para estabelecer relações de afinidade e isso passa também por abrir portas ao nosso quotidiano, ou a formas de produção e logística, numa imersão na vida do outro que influencia grandes grupos.
Outras Macro Tendências Relacionadas: Ligações Ergonómicas; Redesenho de Estilos de Vida.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Tendência Ligações Ergonómicas / Ergonomic Connections” open=”no”]
macro // Ligações Ergonómicas
O acesso é a palavra chave desta mentalidade. Acesso melhorado, facilitado, imediato e nas melhores condições possíveis. Assim, o desenvolvimento tecnológico aposta em articular as funcionalidades e a natureza de soluções para os estilos de vida dos consumidores e utilizadores. Com diferentes aplicações queremos acesso a produtos que chegam à porta de casa o mais rapidamente possível – da comida a jogos de computador. O acesso a lazer – músicas, filmes, séries, entre outros – procura também uma curadoria à medida e que tenta encontrar as expressões, no momento, de desejo dos públicos. Tudo isto sem falar no acesso à informação e às pessoas. Com a pandemia, vemos uma crescente necessidade de acompanhar tudo digitalmente, o que gera um mundo permanente de “reality show/tv” sobre qualquer aspecto quotidiano em direto. Aliás, transferimos muitas atividades que antes só fariam sentido no físico para o digital. Queremos estar conectados sempre que necessário, com segurança, para sociabilizar, trabalhar, conversar e estudar. E quando não queremos, surge cada vez mais uma pressão para desconectar em determinados momentos sem sentimentos de culpa ou de medo. Para tal, as soluções tecnológicas precisam ser dinâmicas e versáteis. Os diferentes dispositivos promovem uma convergência entre funcionalidades, fisicalidades e estilos de vida, sublinhando a internet das coisas, muitas vezes com uma faceta de entretenimento ou até de gamificação. Assim, é cada vez mais clara a articulação entre estilos de vida, acesso facilitado/total e dispositivos que servem como extensão do corpo humano, sugerindo até uma naturalização do processo e o fim das fronteiras entre soluções das realidades física e digital. Um acesso desenhado para as necessidades e desejos de cada indivíduo e de cada comunidade ao nível dos diferentes espaços e momentos do quotidiano.
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micro // Detox Digital
Surge, cada vez mais, a consciência de que há um uso excessivo do domínio virtual e de dispositivos tecnológicos. O que, consequentemente, se traduz numa decadência da privacidade, devido à sobrepartilha de informação na internet e nas respetivas redes sociais, incluindo cedência de dados, etc. Porém, estar-se ciente da atenção dada ao domínio tecnológico fomenta comportamentos associados à fuga do virtual. Muitas das vezes, esse desejo apoia-se no uso de dispositivos que são fruto do próprio avanço tecnológico. É um paradoxo. Usam-se serviços e produtos criados pelo próprio desenvolvimento da tecnologia, com o objetivo de travar o uso excessivo de dispositivos criados por esse mesmo desenvolvimento tecnológico.
Também vemos um controlo das movimentações via telemóvel, o reconhecimento facial, a medição de temperatura como bilhete de acesso a espaços públicos e privados e a partilha de dados de saúde no geral. Tudo é ampliado numa epidemia de repercussão mundial que tende a modificar as noções de privacidade, de civilidade e de liberdade. Tem lugar um processo de ação e reação: O excesso de informação, a aceleração do tempo, o aumento da pressão, a redução das fronteiras, a polarização, e este controlo, entre outros fatores, geram a necessidade de uma desconexão e do cuidado com o corpo e a mente. Mas num mundo onde tudo é controlado, revisto e criticado; onde o dito e o não dito são escrutinados; e onde a falta de privacidade impera cada vez mais, importa problematizar a ideia de uma observação/escrutínio, a vigilância consentida.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Tendência Sistemas Sustentáveis / Sustainable systems” open=”no”]
macro // Sistemas Sustentáveis
A preocupação com a sustentabilidade surge a partir da constatação da finitude dos recursos naturais, o desperdício descontrolado, o consumismo e outros fatores que atuam como causas da degradação do meio ambiente. Estas questões são paradigmáticas do momento e o próprio contexto de pandemia levantou questões sobre resultados do confinamento e do desconfinamento. Contudo, em destaque surge o debate sobre a sustentabilidade do sistema socioeconómico. Este contexto colocou sobre a mesa os problemas críticos sobre a forma de trabalhar, de estudar e de fruir, pelo que surge um sentimento coletivo de urgência. Esta tendência pode ser observada em padrões ao nível do comportamento individual, na elaboração de legislação, na gestão, no design, na moda. Procuram-se inovações e soluções que permitam uma maior colaboração para que seja possível encontrar soluções sustentáveis para o desenho societal atual e para o modelo que conhecemos. Aqui os agentes são indivíduos, organizações e empresas que estão a adotar atitudes sustentáveis. Nas suas diversas naturezas, da ecológica à socioeconómica, não se trata de uma tendência tribal, mas sim de uma mudança de paradigma antes restrito a certos grupos e hoje amplamente debatido. A sustentabilidade é uma pauta central. Com mais informação a circular vemos uma crescente mutação nas atitudes e nos comportamentos. Mas a sustentabilidade não se restringe apenas a uma mudança na forma de produção e de consumo, visto que há lugares que trabalham a questão promovendo uma nova maneira de as pessoas se relacionarem com o contexto atual e com ambiente. Essas novas relações de interdependência demonstram uma ineficácia de muitas políticas para o impacto zero. Isto estimula tanto indivíduos como organizações a encontrarem soluções em relação ao impacto positivo e recuperação do meio ambiente. Este é o ponto mais importante e atual da tendência: já não basta reduzir o impacto após o final do ato de consumo ou durante o processo de produção, a mentalidade emergente por trás da sustentabilidade propõe agora atividades e estratégias para reverter o impacto negativo já causado e começar a contribuir de forma ativa e positiva para (i) a recuperação do meio ambiente, numa lógica inversa à de simples contenção dos danos diariamente causados; (ii) a sustentabilidade dos sistemas/estruturas sociais e dos modos de vida; (iii) novas formas de produção com impacto positivo, onde a própria ideia de reaproveitamento pode despertar a atenção, o interesse e a discussão entre grupos e gerações.
Micro // Organismos Colaborativos Urbanos
Comunidades com identidades, representações, práticas e conhecimentos/técnicas específicas juntam-se cada vez mais para produzir, encontrar soluções criativas para os problemas mais presentes e juntar esforços. A dificuldade em transformar “o saber fazer” num meio de sustento e a necessidade, em certos casos, de exercícios criativos leva ao surgimento, e amadurecimento, de grupos enquanto comunidades para suprimir essa(s) necessidade(s) como estruturas cooperativas que geram um fortalecimento do ecossistema produtivo, local e criativo.Por norma, são criados espaços que permitem a colaboração, a multidisciplinaridade, a partilha e a criação numa óptica de crescente democratização dos sistemas de criação conjunta. Eles abordam instrumentos e tecnologias facilitadoras para uma produção com alto valor simbólico e de design onde a impressão de traços identitários e de estórias é muito importante. Não obstante, recorrentemente, recuperam patrimónios tanto simbólicos como de práticas, ancorados em tradições – aqui, fica clara uma relação com a nostalgia, com práticas de produção manuais, como uma passagem quase “hereditária” de conhecimentos. Por um lado, é contraposto à aceleração do mundo que permite uma valorização do local, um sentimento de fazer parte do processo e uma nova forma de compreender a sustentabilidade dos sistemas e da relação produção-consumo;Sublinhe-se a procura e o interesse na impressão de identidades e na troca entre os diferentes grupos e comunidades dos espaços. São espaços que marcam a cidade, são comunidades que constroem com o local. Comunidades com uma certa autogestão política e uma autossuficiência e independência, inclusive nos seus próprios códigos de comportamento. No fundo, estamos a falar de organismos dinâmicos que traduzem mentalidades e necessidades emergentes com um propósito positivo. Eles querem provocar uma participação ativa e cidadã, muitas vezes com uma leitura crítica e criativa das questões do mundo para encontrar por soluções concretas para os problemas encontrados. Não são realidade novas, especialmente fora das grandes cidades. Mas nos principais centros urbanos há uma crescente consciência da finitude dos recursos que atua como motivação e, cada vez mais, há uma visibilidade e exposição destas comunidades. A sua crescente transformação no seio das macro tendências e a ressignificação das práticas coloca estes movimentos noutro patamar, potenciado inclusive por cultura colaborativa assente tanto no património como na tecnologia e no digital. É mais um sinal do sonho do mundo colaborativo.
Outras Macro Tendências Relacionadas: Narrativas Ancoradas; Identidades Protagonistas; Ligações Ergonómicas; Redesenho de Estilos de Vida.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Tendência Redesenho dos Estilos de Vida / Lifestyle Redesign” open=”no”]
macro // Redesenho de Estilos de Vida
Esta é uma macro tendência profundamente afetada pela pandemia e ainda em processo de mudanças visíveis. Perante o contexto dos últimos meses, todo um conjunto de práticas foram alteradas desde a forma de trabalhar, de estudar, de viver em família, já para não falar na questão do lazer. Sublinhou-se ainda mais a liquidez e o fim de fronteiras entre os processos físicos e digitais e a realidade virtual ganha um novo espaço no quotidiano como solução para um novo modo de vida. A própria noção de lazer, para além das plataformas digitais, sofre mudanças numa relação com o espaço físico onde o espaço público e exterior sai beneficiado, mas muito do lazer é transferido para a casa. Aliás, outra das grandes alterações tem lugar ao nível da habitação. Cozinhamos mais em casa, temos os nossos pequenos jardins caseiros, parte do desporto e exercício físico vem também para dentro de casa e a mesma passa a ser um espaço multifuncional. Há uma ressignificação do papel e da natureza da casa, impactando as relações sociais e os hábitos de afeto no geral. Existe uma grande mudança nas relações, um medo de abrir o espaço privado, e isto teve resultados rápidos que ainda não compreendemos na totalidade.
Tudo isto tem impacto ao nível do nosso bem-estar e privacidade. O controlo a organização e a disciplina pessoal são formas de lidar com uma falsa sensação de segurança. A pressão por um melhor desempenho no trabalho e a presença de ferramentas digitais de interação potenciam a ansiedade, a depressão, o medo pelo futuro e questões relacionadas com a saúde mental e física. Além disso, a discussão sobre a necessidade de abrir mão da privacidade em nome da saúde de todos voltou à ordem do dia e está entre as principais preocupações no momento. Diante de todo esse cenário, cresce a necessidade de encontrar estratégias que garantam bem-estar, principalmente no ambiente familiar. Além disso, há que procurar a confiança em atividades no mundo exterior.
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micro // Viver a Casa
Os acontecimentos disruptivos levam a mudanças de eixo e na forma como se vê e se vive no mundo. Com a pandemia da covid-19, muitos redescobriram a casa como um verdadeiro lar, outros tiveram de improvisar o local de trabalho dentro da própria casa. O facto é que o ambiente residencial está a sofrer ressignificações e transformações para que possamos viver mais e melhor dentro do espaço privado. As dinâmicas neste espaço mudaram radicalmente e onde os integrantes de uma mesma família tinham os seus próprios ambientes agora os espaços são ambivalentes e possuem diferentes propósitos.
Importa reforçar que esta tendência está relacionada com transformações no trabalho e na educação. Isto levará à diminuição de fluxos nos grandes centros, ao aumento do nomadismo digital, diminuição do trânsito, ofertas de trabalho e de estudo a nível global. Isto pode levar ao fim de certos espaços comerciais e empresariais e a uma nova visão sobre espaços digitais profissionais.
Eis o que descobrimos na forma de insights.
Fase 2 – Sistematização dos Dados e Resultados / Insights” open=”no”]
// Insights da tendência I
» Surgimento de narrativas que, cada vez mais, sublinham indeterminação, virtualidade e a ideia do “agora”, intituladas de Narrativas do Futuro. Ganham espaço as narrativas conspícuas capazes de atravessar a linha entre o real e virtual, a ficção e não ficção, bem como géneros e media. (A. Maia, I. Gomes, M. Frederico)
» É preciso compreender as narrativas não pelo que são, mas pelo que poderão significar para o seu destinatário. A rememoração como elemento das narrativas contemporâneas parece ser um padrão relevante, o resgate de memórias perdidas e a reapropriação de determinados passados históricos tem ligações recorrentes com narrativas de resistência e tem tomado constante espaço no debate público. (A. Maia, I. Gomes, M. Frederico)
» Neste mundo pandêmico a instabilidade emocional nos fez olhar ainda mais para o passado e procurar aquilo que dá sentido à vida. O simples ganhou espaço nas narrativas diárias ao observarmos no passado apenas aquilo que é essencial para o nosso bem estar. Neste processo o passado simbólico é resgatado através de narrativas que dialogam entre os diversos espaços, personificando assim a linguagem do simples e essencial (A. Melo e L. Cortés).
» Observamos várias referências a um conjunto de acontecimentos marcantes do século XX, que sublinhamos como Grandes Narrativas. Ainda com um certo distanciamento temporal, elas são fatores de influência no modo de pensar do mundo ocidental contemporâneo devido ao forte impacto que tiveram na construção das identidades e na ordem global como um todo. Entre outros tópicos abordados com frequência, temos a polarização entre comunismo e capitalismo, guerras no Médio Oriente, e migrações e refugiados. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Uma das formas de manifestação da necessidade de compartilhar vivências e experiências passadas é através da produção de filmes e séries biográficos, baseados em fatos e em adaptações de histórias clássicas que apostam em referências do imaginário comum para criar processos de identificação, reconstruir representações do passado ou ainda sanar uma certa curiosidade por realidades diferentes, valendo-se de um discurso de autenticidade e veracidade atribuídos pela ideia de “real”. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Considerando um contexto de intensificação de fluxos simbólicos, económicos e dos próprios indivíduos pelo mundo, incluindo crises financeiras e políticas, a nostalgia é ressignificada enquanto mecanismo de fuga emocional, adquirindo outras camadas através da comercialização de objetos ou até mesmo vivências. Cria-se, então, um Mercado da Saudade, com a retomada de elementos culturais característicos no âmbito do mainstream, que passam por um processo de atualização e de revalorização. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» A ideia de nostalgia associada a símbolos de um passado distante, grandes feitos remotos e modos de vida anacrónicos, é atualizada, distanciando-se de uma áurea analógica. Numa nova nostalgia – a nostalgia dos Millennials -, observamos a reprodução e valorização de obras audiovisuais das décadas de 80 e 90, para além de remakes e da referenciação desse conteúdo em outros produtos. Objetos que fizeram parte da infância dos adultos de hoje ganham versões atualizadas, como as máquinas fotográficas instantâneas ou as consolas de jogos. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Narrativas de diferentes momentos históricos, protagonizadas por diferentes grupos, compartilham os mesmos palcos, formando camadas de história que compõem o ambiente urbano. Assim, os espaços na cidade atuam de forma a reforçar ou suprimir memórias de determinados agrupamentos, criando e promovendo uma memória oficial em detrimento das demais. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Apesar de observarmos a multiplicação de fontes de estórias e narrativas que geram o reconhecimento de diferentes matrizes identitárias, a família, devido ao papel que ocupa enquanto instituição pioneira na socialização dos indivíduos e na apresentação de visões e possibilidades de mundo, ainda possui um papel de destaque no processo de mediação de valores e realidades. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Como um reflexo direto do impacto das grandes narrativas nas identidades coletivas, a nacionalidade e a ideologia política ainda figuram como fatores determinantes no reconhecimento identitário, seja através da afirmação ou, pelo contrário, num movimento de negação. Isto tem reflexo na polarização cultural do tecido social, expressa na composição multicultural das grandes cidades, com habitantes que assumem a sua condição de imigrante enquanto fator identitário, e no discurso reproduzido sobre o passado, especialmente no contexto posterior à Segunda Guerra Mundial. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» As Metrópoles são arquipélagos de realidades que se tangenciam no convívio urbano. Desse encontro, surgem disputas, também de viés identitário, movimentando um fluxo de afirmações e de contestações. Assim, a identidade das grandes cidades é marcada pela confluência e contato de várias culturas que resultam de vivências heterogêneas de um mesmo espaço. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Num cenário de múltiplas identidades e agrupamentos/tribos cada vez mais específicos de consumidores, as marcas que procuram traçar uma ligação com o seu público para além do produto e/ou serviço material que oferecem acabam por se destacar. As expectativas giram em torno de posicionamentos relacionados com causas, propósitos e motivações, apontando para uma a personificação das marcas que passam a figurar no imaginário como entidades dotadas de opinião e deveres cívicos. Elas são julgadas a partir de diversas formas de manifestação pública, como campanhas publicitárias ou ainda parcerias com influenciadores e outros formatos de brand avatars. Este nível de ligação com o público exige posições claras sobre questões complexas – não ficar em cima do muro -, um recorte preciso para se dialogar com coerência por entre discursos/narrativas e as ações concretas. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Temos um movimento de afirmação através da cultura, da arte e do entretenimento que traz visibilidade a grupos sociais tradicionalmente excluídos através da auto-representação, além de comunicaram realidades e necessidades de mudança a públicos que não teriam necessariamente um compromisso com estas causas. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» A otimização de tarefas quotidianas através da dinâmica de “gamificação” parece ser um processo em constante atualização e ainda distante de encontrar uma aplicação e/ou modelo ideal que prenda os usuários a longo prazo. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Estabelecimentos comerciais, como lojas e restaurantes, ganham novas formas de atração, para além do serviço e produtos comercializados: a identidade como experiência. Através de uma promessa de vivência que amarra o ambiente, o produto e a imersão do público em determinado contexto, as narrativas identitárias são expostas e contextualizadas, provocando a sensação de pertencimento e de participação do público, que de ente passivo, se torna parte operante da estória proposta nesses lugares. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» O espaço urbano das grandes cidades e as suas atrações desligam-se do ambiente exclusivamente físico, ganhando dimensões virtuais a partir de conteúdos interativos que podem ser acedidos em qualquer lugar do mundo. Com a pandemia do Covid-19 e a disseminação em massa de opções de lazer digital, isto ficou ainda mais evidente. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» A procura do consumidor por vivenciar uma experiência memorável associada aos produtos que escolhe (além do bem material em si), pode ser desdobrada em duas matrizes diferentes: uma pautada pela inclusão do público em diferentes graus do processo de produção; outra que se vale da promessa de experiência e prestígio fornecida por marcas consolidadas e pelo seu capital simbólico. A primeira, diretamente associada a uma cultura maker e à sensação de proximidade e inclusão fornecida pelo pôr a mão na massa, ainda que de modo fugaz e contextualizado; a segunda, reflexo direto da identificação de valores e estatuto impressos nas marcas, em que o simples reconhecimento visual de um logotipo já carrega referências quanto a estilos de vida, identidades e aspirações. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» A memória coletiva serve de base para o desenvolvimento de narrativas acerca do passado e a sua construção no presente. Considerando o contexto da globalização, as memórias coletivas nacionais são questionadas, com uma crescente percepção de que se tratam de construções. Observamos, então, a maleabilidade identitária dos grupos e das comunidades, através do exercício de indagação sobre versões do passado e características identitárias apresentadas como rígidas e determinantes pelas estórias reproduzidas de geração em geração e exaltadas em monumentos, datas comemorativas e outras expressões simbólicas. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Somando resultados de diversas etapas da pesquisa, constatamos que a nostalgia habita a mente coletiva: as pessoas consideram-se nostálgicas, reconhecem traços na cidade e observam uma orientação nesse sentido tanto em relação a comportamentos como produtos comercializados. Disto, observamos uma divisão entre o que realmente está ancorado numa existência passada (vintage) e o que simula essa bagagem histórica (retro). No ambiente urbano, diversos estabelecimentos valem-se da memória coletiva e do sentimento de nostalgia para posicionarem-se como tradicionais, criando narrativas que atendam a essa vontade de ligação com o passado. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» A procura por um consumo mediático mais ativo, característico da Era Digital, e por opções imersivas de entretenimento ainda encontram limites em termos de produções audiovisuais. Os conteúdos interativos para cinema e televisão que se valem de um conceito híbrido entre jogo e o formato audiovisual convencional enfrentam barreiras em termos tecnológicos, narrativos e de próprio interesse do público, que não ainda está familiarizado com um “meio termo” entre esses dois campos. Assim, vemos um campo em desenvolvimento ainda incipiente, mas com potencial de desenvolvimento futuro. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Através de amplos catálogos, plataformas de SVOD como Netflix, Hulu e Amazon Prime Video, agregam públicos com os mais distintos perfis. Tal qual o papel centralizador da televisão analógica nas décadas de 60 e 70 enquanto atividade familiar e eletrodoméstico de destaque na sala de estar, a nova televisão também atua pela premissa de centralização, desta vez ligada às plataformas de acesso, e não mais o aparelho em si, e ao consumo do mesmo tipo de conteúdos. Trata-se de um apanhado de nichos servidos de forma conjunta, respondendo à transformação do audiovisual enquanto meio de comunicação massivo para uma formação heterogénea de tribos que recorrem ao mesmo meio para aceder a conteúdos diferentes. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
» Entre as muitas práticas sociais afetadas pelo contexto do Covid-19, a rotina de trabalho e a vivência do espaço urbano sofreram grandes modificações. O home office instaurou-se como medida de proteção à saúde e viabilização da manutenção dos postos de trabalho; a circulação pela cidade mantém-se dentro de restrições e muitos dos espaços de convívio terão de ser repensados, inclusive após a pandemia. Nesse contexto, a questão do direito à cidade; o acesso a opções de lazer para populações vulneráveis, bem como ao próprio trabalho; e as condições de infraestrutura fora das áreas centrais afetam as dinâmicas sociais e podem impulsionar desigualdades já existentes. (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques)
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// Insights da tendência II
» A pandemia trouxe um grande impacto sobre a luta pela equidade das relações humanas, promovendo disparidade de empregos e rendas entre homens e mulheres, além do crescimento da discriminação racial e das desigualdades sociais. O parodoxo no processo de construção de identidade, que visa tanto reformular e enaltecer categorias identitárias quanto recusar rótulos, tem se tornado mais forte do que nunca. Algumas denominações tradicionais têm sofrido ressignificações, já que não conseguem mais expressar as transformações nos modos de vida e mentalidades da sociedade contemporânea em suas definições “originais”. (J. Rocha, Ni Min)
» Mesmo que num estado ainda emergente, as possibilidades do uso de novas tecnologias para a expansão das capacidades do ser humano aumentam em número. É um movimento que já existe há alguns anos e está num processo de consolidação. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» A temática do transhumanismo não é nova. Porém, ainda aparece muito relacionada com as novas tecnologias, por vezes com um certo ar de ficção científica, apesar da existência de um movimento e de especialistas que chancelam suas teorias. Diversas tecnologias e experiências recentes indicam que a expansão do corpo humana e a sua articulação com a máquina ou os aprimoramentos genéticos serão possíveis num futuro não tão distante. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» As questões identitárias figuram como temática pioneira, presente em mais de metade dos formatos e géneros dos conteúdos audiovisuais analisados para a hipótese, sejam eles ficção ou documentários. As produções sobre esta temáticas fazem-se necessárias em resposta à busca de autoconhecimento e representatividade. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» 18,6 % dos respondentes dizem não se encaixar nas denominações de auto-expressão de orientação sexual mais tradicionais. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» No que diz respeito a tópicos essenciais a serem discutidos nos próximos cinco anos aparecem os temas igualdade, discriminação, política, autoridades e diversidade. Os temas género, identidade, diversidade, igualdade e representatividade (palavras naturalmente associadas) estão muitas vezes ligadas a expressões como discriminação e intolerância. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» A discriminação é entendida como algo muito presente, de forma estrutural e enraizada, mantida pelos grupos que possuem o poder, que tem medo de o perder, e que mesmo com toda a luta é muito difícil ser combatida. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» A desconfiança articula-se, na maior parte das associações, com tecnologia e autoridade. As redes sociais aparecem como a estrutura de menor confiança, seguidas pelos governos municipal e nacional. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» Há também um entendimento de valorização de autoridades genuínas, não políticas, mas que tenham estudado, sejam especialistas e tenham capacitação para falar de um determinado assunto, o que em tempos de debates virtuais é cada vez mais importante. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» As redes sociais e notícias associadas aparecem como meios e conteúdos menos confiáveis no contexto da pandemia. Em contrapartida, essa desconfiança tem feito com que as pessoas evitem acreditar em notícias falsas, confirmando fontes e a veracidade dos fatos. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» Entende-se a desconfiança, em muitos casos, como uma ferramenta de proteção contra as opressões sofridas, que são sentidas de forma muito forte, até mesmo contra a própria vida. A raiva também é referida, principalmente relacionada com a política e as autoridades. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» A política também é vista de forma mais ampla e como ferramenta de transformação. Os nossos corpos também são políticos e tudo o que produzimos tem, ou pode ter, um posicionamento político. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» No âmbito do conceito de género vemos a possibilidade de ampliação do mesmo dentro das próprias categorias tradicionais, bem como a liberdade para se expressar da forma que preferir. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
» A igualdade surge como um conceito de aceitação da diferença. Uma palavra que pode se articular com este conceito é equidade, o entendimento dessas diferenças e desigualdades presentes na sociedade para que as pessoas sejam tratadas de forma mais proporcional e justa. (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos)
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// Insights da tendência III
» A sociedade também acelerou o uso do digital para suprimir as suas necessidades. O comércio eletrónico, as entregas de refeições, as transações bancárias eletrónicas, entre outros, promoveram os atos digitais. Através deste processo podemos concluir que poderá haver uma aceleração no uso de tecnologias que exijam menos contacto humano (chamados contactless), como por exemplo, a utilização de drones e de veículos autónomos. Sendo assim, percebe-se que a sociedade começa a desvalorizar o contato físico, seja com produtos ou serviços. (E. Monteiro, M. Simões, T. Abrahão)
» Como resposta à tão fácil e intensa ligação à tecnologia e à internet surgem contra-movimentos. Este tem como foco ideias, projetos e objectos cujo objectivo é restringir e limitar o uso excessivo e o acesso ao virtual e à tecnologia. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» É notável a existência de vários sinais e serviços relacionados com o bem-estar do indivíduo e com o seu respetivo conforto. Isto através de serviços que facilitam a vida no que toca à poupança de tempo e ao conforto, embora também facilitem o isolamento. Exemplos disso são as transferências bancárias e a encomenda de comida para casa através de aplicações. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» Possibilitam-se novas experiências que sublinham, cada vez mais, a automatização e o conforto humano. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» Durante épocas difíceis, como o atual contexto de pandemia, evidenciam-se comportamentos, serviços e práticas no que toca à solidariedade e à compaixão. Sublinhou-se o acesso e a disponibilização de serviços, muitos deles gratuitos, potenciados por redes e ferramentas tecnológicas durante a época de isolamento. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» Estão em emergência vários produtos e novos serviços que facilitam a interação, a mobilidade e a personalização. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» É evidente a queda das fronteiras, outrora existentes, entre o mundo físico e o mundo virtual. Agora, mais do que nunca, o virtual assume uma importância vital para que o físico possa continuar a decorrer com normalidade. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» A tecnologia e a inovação também geraram uma nova forma de arte – a Arte dos novos media. Os indivíduos desejam um tipo de imersão artística mais interativa, de modo a possuir uma experiência mais personalizada e única. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» Os comportamentos, sinais, práticas e serviços relacionados com estes tópicos não surgiram apenas em uma indústria ou em uma área, mas sim nos diversos aspetos da vida, por exemplo, na indústria do turismo, na educação, na medicina, no entretenimento, entre outros. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» São tidas em atenção as novas formas de tecnologia e inovação no trabalho e na formação empresarial, de modo a facilitar a comunicação empresarial e o seu desenvolvimento a longo prazo. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
» O público geral aparenta estar alerta e ciente do impacto das novas tecnologias. Consideram que as suas grandes vantagens são, por exemplo, a disponibilidade e um fácil acesso à informação, a eficácia e rapidez na comunicação, a acessibilidade a serviços inovadores e personalizados, o progresso na área da medicina, e mais fontes de lazer e entretenimento. Porém, o público não ignora as suas possíveis desvantagens como, por exemplo, o afastamento do contacto físico entre as pessoas, o vício nas novas tecnologias e nos respetivos dispositivos, o sedentarismo e a substituição de pessoas, em postos de trabalho, por robots. (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang)
// Insights da tendência IV
» As comunidades organizam-se por afinidades e interesses compartilhados, tendo como propósito maior criar uma sensação de pertencimento. Atender a essa demanda pode ser benéfico para as instituições que a explorem. (E. Monteiro, M. Simões, Tatiana Abrahão)
» Com a mudança de postura dos consumidores nos últimos anos, reforçado pelo movimento Maker, as empresas e instituições podem entregar os seus produtos e serviços “inacabados” com a possibilidade de inclusão dos consumidores em seus processos (e.g. design, autenticidade, funcionalidade). Dar acesso às plataformas de criação como forma de colaboração e criação de novos produtos mais aderente à realidade e preferência aos consumidores pode ser uma vantagem competitiva. (E. Monteiro, M. Simões, Tatiana Abrahão)
» As manufaturas culturais têm como principal objetivo facilitar a criação e a produção de novas soluções para problemas atuais através da colaboração entre os seus participantes, que podem desenvolver as suas ideias sem ter medo de errar. O movimento “Maker” procura estimular a inovação, através de um trabalho satisfatório e significativo, que permite que os seres humanos voltem a ser criadores e produtores ao invés de somente consumidores. (J. Rocha, Ni Min)
» Há uma procura por soluções a problemas atuais a partir de processos coletivos e colaborativos, em que a sociabilidade tem uma importante relevância. A cultura maker provoca uma vivência ativa e cidadã em seus participantes, com uma leitura crítica e criativa em relação às questões do mundo, bem como uma procura por soluções concretas para os problemas encontrados. (A. Melo, L. Cortés)
» Há um movimento de democratização da cultura maker e de sistemas de cocriação em geral. Esse caminho é feito a partir da simplificação dos meios necessários para a realização dos projetos e do acesso às ferramentas necessárias. Em meio ao isolamento social decorrente da pandemia, há a necessidade de repensar formas de produção da cultura maker, que migram para ambientes digitais ou híbridos. Isso faz com que a ideia de comunidade se expanda para além das fronteiras físicas e ideias e práticas circulem de maneira mais livre. (A. Melo, L. Cortés)
» Está presente na cultura maker o entendimento de que a educação ultrapassa o ambiente escolar e de que esse processo deve estar em sintonia com as inovações presentes na sociedade. A pandemia nos fez repensar novos modelos educativos em meio ao ambiente digital. Existe a necessidade de novas formas de aprender que envolvam valores pertinentes para a cultura digital, como inteligência socioemocional, criatividade, autonomia, habilidades multitarefas, senso de comunidade, democratização do conhecimento, cidadania e capacidade crítica. (A. Melo, L. Cortés)
» Os espaços compartilhados deixam de ser apenas coworkings onde diversos indivíduos trabalham de forma individual em um mesmo espaço, e passam a ser espaços para os participantes co-criarem e partilharem conhecimentos entre si. Os setores abrangidos passam a ser mais abrangentes e não apenas limitados a setores de tecnologia e marketing, mas também da culinária, literário, artístico, entre outros. Os espaços compartilhados começam a apostar no desenvolvimento de espaços direcionados para o “DIY” (Do It Yourself) principalmente a partir do mote da reutilização, são criados espaços, dentro do conceito de oficina, em que as pessoas poderão aprender a transformar os seus próprios pertences, nomeadamente a restauração de móveis. (C. Domingues, J. Atayde e Melo, L. Caxiano)
» O mundo das Manufaturas tem cada vez mais o seu enfoque no B2C, ou seja, na relação Business to Consumer, principalmente com o impacto da pandemia na economia. As Manufaturas têm conseguido se adaptar e até impulsionar a produção criativa assente no ambiente, na sustentabilidade e em novas lógicas de comunidade. A adaptação de velhas dinâmicas incorporadas em novos projetos e produtos parece ser uma constante nas manufacturas culturais. A ligação é talvez a palavra-chave para esta indústria daqui em diante – onde o jogo das memórias, das sensações, das experiências, da inclusão, das narrativas individuais e coletivas assume um ponto assente na criação do produto. (A. Manhique, L. Corrêa)
» A cocriação na sua transversalidade e multi/interdisciplinaridade é cada vez mais valorizada. Vemos produtos que requerem a comunhão de diferentes áreas de interesse. Para além disto, a experiência também é cada vez mais entendida como uma comodidade – um produto – manufaturado por indústrias que percebem a importância de um mundo e mercado virtuais e digitais. (A. Manhique, L. Corrêa)
» Proliferação de uma série de novos espaços criativos tendo em comum o facto de serem criados “por baixo”, por iniciativa comunitária. Esta descentralização se concretiza na prática do código aberto e na viabilização da ligação entre indivíduos e comunidades. Em teoria, a cultura maker dispensa a detenção do direito autoral, sugerindo uma revolta contra a centralização do poder. (E. Altafim, V. Favetta)
» A pandemia impulsionou não apenas o DIY, mas também as empresas a participar nessas práticas para manter o poder de produção. As empresas refletem as dinâmicas da cultura maker, passando a adotar práticas co-criativas dentro de suas próprias estruturas. (E. Altafim, V. Favetta)
» As empresas são chamadas cada vez mais a serem parte ativa da mudança. Entretanto, “zerar”
o impacto negativo não é mais suficiente, agora precisamos regenerar. Nesse contexto, as empresas têm a oportunidade de liderar um processo de transformação global em prol do impacto positivo. (E. Altafim, V. Favetta)
» As marcas precisarão ir além. Neutralizar o impacto com compra de créditos de carbono ou práticas de reflorestamento têm os seus dias contados. O desafio atual é dar para o meio ambiente muito mais do que se extrai, essa é a lógica da regeneração. Isso impacta as empresas a diversos níveis e é relevante desde as cadeias de fornecedores até às expressões em campo comunicativo, bem como na mobilização em prol das causas. (E. Altafim, V. Favetta)
» A pandemia tornou evidente e indiscutível a relação de interdependência entre o indivíduo e o meio ambiente, facto que pode influenciar uma aceleração da consciência socio-ambiental. A procura de soluções sustentáveis para o sistema societal é acompanhada e potencializada com as redes sociais, canais estes que permitem a partilha e a articulação entre indivíduos e comunidades. (E. Altafim, V. Favetta)
» Com o aumento da população urbana, as cidades tomam centralidade no debate mundial sobre a necessidade de novas práticas e políticas de produção. As manufaturas culturais podem ser entendidas como um projeto de resolução de desafios urbanos urgentes. (A. Maia, I. Gomes, M. Frederico)
» A ideia de bens comuns promove um dissenso à propriedade privada e à “financeirização”, propondo diferentes alternativas de acesso a espaços e produtos. A partilha de conhecimentos e saberes se mostra como elemento crucial de uma experiência comunitária. (A. Maia, I. Gomes, M. Frederico)
» A sustentabilidade amplifica-se, abrangendo cada vez mais indivíduos. As atitudes com baixo impacto ambiental são cada vez mais expressivas e visíveis. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» Trazer as práticas de sustentabilidade para o quotidiano tem sido uma constante, visto que a questão deve ser tratada como uma forma de promover o bem-estar. Desconsiderar a sustentabilidade é cada vez mais inaceitável. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» Deixando de estar restrita ao campo da ecologia, a palavra sustentabilidade passa a ter um novo significado, referindo-se a formas de manter empreendimentos durante a pandemia. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» Adotar a economia circular é uma forma de promover um novo modelo econômico que promova o uso sustentável dos recursos e consiga diminuir o desperdício, de forma a conseguir a melhor partilha e ressignificação de produtos. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» A sustentabilidade faz as pessoas procurarem experiências e produtos que as façam se sentir conectadas a um bem maior, de forma a se colocarem como parte de uma rede de ligações, onde as suas ações têm um impacto. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» Dando mais atenção à natureza, podemos ser inspirados a criar produtos mais inteligentes e sustentáveis. A criatividade e a sustentabilidade podem unir-se através da ressignificação de materiais e objetos que seriam descartados. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» As empresas podem ser inovadoras sem abrir mão da sustentabilidade, procurando uma organização voltada para a diminuição da produção de resíduos. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» As ações comunitárias são capazes de reforçar a união entre as pessoas por meio do desenvolvimento de ações sustentáveis na cidade. Aliás, a ampliação dos espaços verdes no ambiente urbano pode proporcionar, por meio do contato com a natureza, um maior bem-estar aos seus moradores. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» As pessoas procuram atividades e lugares que proporcionem experiências naturais e ecológicas como forma de fugir ao stress e poluição das grandes cidades. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
» A reciclagem como forma de ressignificar materiais pode ser utilizada por empresas para fabricar novos produtos. (Marianna Rosalles, Francisco Mateus)
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// Insights da tendência V
» Em tempos pandêmicos, e ainda mais digitais, a aceitação de quem nós somos pelo olhar do outro passa por uma esfera real e simbólica de apropriação e venda de um estilo de vida. As “nossas narrativas estão à venda”, assim como também estamos dispostos a consumir aquilo que se iguala ao estilo de vida com que nos identificamos (A. Melo e L. Cortés).
» O ser humano vive uma luta constante para atingir o bem-estar físico e emocional. Equilibrar esses dois pontos sensíveis é algo de difícil equação. O volume e o ritmo laboral (rotina produtiva) somados à transformação contínua nas formas de interação social (cada vez mais digital) exercem uma influência relevante nesse desequilíbrio. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» Em muitas situações, a busca pelo autoconhecimento e autocuidado está associada à nostalgia. Nesses casos, retornar a locais e situações do passado traz um sentimento de bem-estar e de satisfação. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» A imprensa, de maneira geral, reserva um espaço relevante para notícias sobre saúde mental, principalmente aquelas provocadas e/ou reforçadas pela pressão laboral, ritmo de vida e ambiente digital. Também há vasto material sobre atividades de busca pelo autocuidado. Aqui verificamos como a atual pandemia monopoliza atenções e comportamentos. Diariamente se dedica um elevado número de tempo com as estatísticas relacionadas com a doença, a nível nacional e internacional. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» A TV e o cinema, principalmente nos últimos anos, têm abordado com mais frequência estórias relacionadas com a procura pelo bem-estar físico e emocional. Também há uma quantidade considerável de narrativas relacionadas com os efeitos da presença e exposição digital massiva no quotidiano. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» No período de pandemia, em Portugal, o confinamento não foi sentido de maneira tão dura como em outros países porque muitos portugueses aderiram ao isolamento social por iniciativa própria. O maior choque não foi a obrigação do confinamento, mas o desmantelamento da antiga rotina e a incerteza sobre como será a nova rotina pós-pandemia e que mudanças isso ocasionará. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» Pelo fato de já estarem familiarizados com alternativas digitais de interação, os indivíduos adaptaram-se à imposição das mesmas como forma privilegiada de comunicação com o mundo exterior. No entanto, o excesso de tecnologia promove o stress entre as pessoas. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» Os indivíduos tendem, mesmo após a pandemia e o confinamento, a ficar mais tempo em casa (por receio de uma segunda vaga de infecções). Por esse motivo, as casas estão a tornar-se espaços mais aconchegantes e também mais funcionais para a prática do teletrabalho. Mais plantas, mais espaços para lazer e relaxamento. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» Antes da pandemia, as pessoas já se sentiam mentalmente cansadas e pressionadas por resultados. Após o início do confinamento, elas continuam cansadas e sentem-se mais pressionadas. Além disso, estão cada vez mais reféns do ambiente digital para a realização das mais variadas tarefas. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» A privacidade (principalmente digital) já era motivo de preocupação antes do início da pandemia, e consequente isolamento/distanciamento social. No entanto, essa preocupação foi relativizada com a necessidade de rastreamento da população para contenção da disseminação do vírus. Isso reacendeu o debate sobre o tema e pode resultar na flexibilização das normas sobre preservação de dados. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» As intervenções artísticas podem ajudar a melhorar a saúde e o bem-estar, contribuindo para a prevenção de problemas mentais e físicos. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» Instituições de saúde e governos tendem a investir em prevenção para evitar surtos virais futuros e/ou dar uma resposta mais rápida a situações de disseminação de doenças; Isso inclui monitorar a saúde tanto da população local quanto das pessoas que realizam deslocamentos (turistas, por exemplo). (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
» O comportamento preventivo deverá ser seguido pela população. Por isso, é previsível que tenham lugar maiores cuidados higiênicos, investimento em saúde preventiva e equipamentos de monitoramento individual da saúde. (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes)
Fase 1 – Desk Research
Capítulo 1
1.1. Das Narrativas à Memória: conceitos e articulações
(Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques, 2020)
» Identidade
Para encontrarmos uma definição de identidade recorremos ao teórico cultural Stuart Hall que afirma que “Cultural identities come from somewhere, have histories. But, like everything which is historical, they undergo constant transformation. Far from being eternally fixed in some essentialized past, they are subject to the continuous “play” of history, culture and power. Far from being grounded in a mere “recovery” of the past, which is waiting to be found, and which when found, will secure our sense of ourselves into eternity, identities are the names we give to the different ways we are positioned by, and position ourselves within, the narratives of the past” (HALL, 1994). Ao apresentar três conceitos de sujeito que foram sendo modificados ao longo do tempo (Iluminismo, sociológico e pós-moderno), Hall considera que esse terceiro é o predominante na sociedade contemporânea – uma versão fragmentada do sujeito e que, ao contrário das outras, deixa de enxergar a identidade como permanente e passa a considerá-la como definida histórica e não biologicamente (HALL, 2005, p. 10-17).
Hall enxerga a globalização como uma possibilidade de “levar a um fortalecimento de identidades locais ou à produção de novas identidades.” (HALL, 2005, p. 84).
Fonte: Google Trends <https://trends.google.com.br/trends/explore?q=identity> Acesso em: 01 mar 2020.
Fonte: Google Trends <https://trends.google.com.br/trends/explore?q=identity> Acesso em: 06 mai 2020.
No início deste trabalho desenvolvemos uma pesquisa no Google Trends com o objetivo de dimensionar o interesse do público geral nos assuntos relacionados à hipótese. Em março de 2020, notamos que há uma linearidade na busca pela palavra “identidade” na internet, no período de 12 meses, mesmo com pequenos altos e baixos. Em maio do mesmo ano, realizamos novamente a pesquisa, e é possível perceber que a linearidade contínua – embora esteja em queda.
De acordo com “Proudly Local, Going Global”, um dos artigos que faz parte de uma série que destaca o relatório das dez principais tendências mundiais do consumidor em 2020, o orgulho e o poder na cultura local se tornarão mais definidos e relevantes em 2020. Segundo o artigo, a tendência “Proudly Local” captura o desejo do consumidor de adotar e apelar para um senso de individualidade e identidade nacional crescente a partir da inspiração local (EUROMONITOR, 2020).
No artigo “How to Prepare for the 2020 Consumer”, os estudiosos apontam que há uma preferência crescente por produtos e marcas locais, vistos como mais autênticos e representando melhor a individualidade. Ainda segundo o mesmo artigo, marcas de nicho iniciam sua rota global para o sucesso acentuando suas credenciais locais. Ao mesmo tempo, as multinacionais estão se tornando mais sofisticadas na modelagem de seus produtos para gostos e preferências locais, sem perder sua identidade de marca principal. Sendo assim, as marcas precisarão considerar os gostos e preferências locais e adaptar seus produtos e serviços de acordo. Sintonizando-se com a tendência Proudly Local, Going Global é uma estratégia de negócios atraente para conquistar e reter a lealdade do consumidor (EUROMONITOR, 2020).
» Experiências
De acordo com a perspectiva de Walter Benjamin, a experiência encontra-se ligada com o conceito de corpo, técnica e vivência. As áreas urbanas, a modernidade e a nova temporalidade efêmera, veloz e de consumo momentâneo vão ao encontro de uma nova percepção de sentidos, a uma nova sensibilidade, que é traduzida na construção de novos espaços empresariais e lúdicos que facilitam a mobilidade na cidade moderna (BENJAMIN, 1995). A cidade educa os sentidos e a sua percepção cria uma memória que sobrevive ao choque e à velocidade da vida moderna. A forma de comunicação da experiência é a narrativa, transmitida através de representações artísticas (cinema) e literárias (romance, jornal – com maior rapidez, comunicação a longa distância). Destaca a narrativa oral que entra em declínio na vida moderna (BENJAMIN, 1995).
Benjamin considera que a experiência é um processo complexo que exige um tempo longo de reflexão, que, de forma alguma, é compatível com o carácter quantitativo e qualitativo do tempo veloz da era moderna e da sua produção massificada. O ritmo da experiência e da narrativa é um trabalho artesanal, manual, anterior ao surgimento do capitalismo e do modo de vida moderno. As transformações sociais da vida moderna e o ritmo veloz quotidiano da metrópole, muito devido ao desenvolvimento tecnológico, contribuíram para o empobrecimento da memória, afectando a percepção sensorial. Desta forma, o conceito de experiência dá lugar ao conceito de vivência (BENJAMIN, 1991).
Fonte: Google Trends <https://trends.google.com.br/trends/explore?q=experience> Acesso em: 03 mar 2020.
Fonte: Google Trends <https://trends.google.com.br/trends/explore?q=experience> Acesso em: 06 mai 2020.
A pesquisa no Google Trends do termo “Experience”, diferente de identidades, evidencia uma queda considerável no interesse do público – o início do declínio do gráfico foi no começo de março, mas obteve o ponto mais baixo na segunda metade desse mês. O contexto desse período é marcado pelo início do distanciamento social, por causa da covid-19, em diversos países ocidentais, o que pode ser um dos motivos pelos quais o interesse em experiências tenha decaído.
» Narrativas
Segundo Jane Stadler, pesquisadora da comunicação, as narrativas oferecem um meio de compreensão e análise da própria vida do indivíduo, e uma forma de conectar-se com as vidas dos outros. Segundo a autora, estruturas instigantes e atípicas de narrativas aumentam a relação entre narrativa e identidade, além de evidenciar as limitações de narrativas com estruturas formuladas. A autora também realça a relação entre biografia e identidade pessoal (STADLER, 2008, p. 5). Stadler também reflete acerca do cinema, afirmando que, nesse contexto, o entretenimento não é restrito ao prazer de se associar e compreender a história de outras pessoas, mas inclui, também, os prazeres visuais do voyeurismo – que envolvem assistir aos corpos celestiais de estrelas do cinema interpretando papéis românticos e heróicos (STADLER, 2008, p. 57). Segundo Singer, o fenômeno do cinema como uma instituição social afirma e apoia o prazer de assistir ao providenciar um contexto que facilita o cultivo dessas possibilidades, legitimando-as ao reconhecer a necessidade desse tipo de espaço e, também, criando-o (SINGER apud STADLER, 1990, p. 43). A relevância da narrativa cinematográfica é expressa por Stadler, que afirma que ela é um “meio de comunicação visual com a habilidade de evocar e representar o material de forma cativante e realista (apesar de entendermos que seja apenas uma representação), o filme é uma forma de narrativa com qualidades de expressão e impacto que difere de qualquer outra” (STADLER, 1990, p. 39). A autora ainda afirma que outros meios de comunicação não são capazes de articular a experiência humana com a mesma precisão, impacto ou ênfase como um filme consegue. A autora acrescenta: “Narrative film is a medium in which the stories of human lives and the cultural contexts in which they are situated are inscribed in a way that can foster understanding of people, issues, and circumstances the viewer might not otherwise consider” (STADLER, 1990, p. 39-40).
Walter Benjamin aborda a narrativa em um contexto mais amplo, afirmando que, na modernidade, a individualização da narrativa substitui as formas coletivas de narrativas orais pré-modernas. O autor também reflete acerca da relação entre experiência e memória, e afirma que ela é o motivo do colapso da narrativa (BENJAMIN, 1936, p. 440).
» Nostalgia
De acordo com Holbrook e Schindler, pesquisadores de consumo, “a nostalgia é uma emoção pessoal e é considerada uma atitude positiva ou preferência em relação a objetos, pessoas, lugares ou coisas” (HOLBROOK E SCHINDLER, 1991).
Já no âmbito dos estudos da memória e da cultura, Stauth e Turner afirmam que “a nostalgia constitui tanto uma forma de conhecer o mundo – ou melhor, uma forma de conhecer mundos – e um discurso sobre o conhecimento. Como um discurso sobre o conhecimento, a nostalgia tem sido associada tanto com a melancolia quando com uma resposta conservadora às incertezas da modernidade” (STAUTH E TURNER apud RADSTONE, 2010, p. 188).
Em relação ao modo como a nostalgia opera no indivíduo, Radstone afirma que ela “costura, juntos, o subjetivo e o objetivo, o psíquico e o social. Na nostalgia, afeto e significado são unidos e conhecimento e crença falam a língua do tempo” (RADSTONE, 2010, p. 189). De acordo com os estudos de Sedikides et. al. (2016), ser nostálgico não é estar preso ao passado – e que, na verdade, sentir-se assim aumenta a vitalidade e deixa o indivíduo mais preparado para lidar com o presente e com o futuro. Segundo os resultados da pesquisa, voluntários que participaram do teste relataram sentimentos de “autocontinuidade”- o que, para os pesquisadores, significa que ao olharmos para o passado, temos uma melhor compreensão de quem somos. Por isso, relembrar temos melhores cria sensações positivas, que ajudam a romper o aspecto negativo da solidão.
A pesquisa de Autio (2013), desenvolvida pela Wageningen University, observou que muitos consumidores da Finlândia consideram a comida local uma escolha mais sustentável do que a comida convencional, pois ao consumirem os alimentos produzidos no próprio país, eles apoiam a economia local e contribuem para o crescimento das comunidades. Além de apreciarem o melhor sabor da comida local por ser mais saudável e saborosa, eles consideraram itens produzidos, processados por eles ou que eles mesmos caçaram ou pescaram, como sendo a comida local mais autêntica, pois esta ideia está associada à produção caseira e artesanal. O objetivo da pesquisa foi observar como a nostalgia está associada à produção de comida local, especificamente como isto justifica certas compras. Foi analisado também como sentimentos nostálgicos são manifestos por estímulos sensoriais, como, por exemplo, a forma que a comida é exibida e exposta. Como conclusão deste estudo, os entrevistados relataram que a comida local era considerada ‘comida de verdade’ e desejaram voltar ao passado, no qual a percepção da comida era simples e saborosa e não algo arriscado para o corpo e a saúde.
Fonte: Google Trends <https://trends.google.com.br/trends/explore?q=nostalgia> Acesso em: 03 mar 2020.
Fonte: Google Trends <https://trends.google.com.br/trends/explore?q=nostalgia> Acesso em: 06 mai 2020.
Em relação à procura do termo “Nostalgia”, é possível observar uma certa linearidade na primeira pesquisa – enquanto na segunda, mais tardia, nota-se um pico consideravelmente alto e repentino nas buscas, que ocorreu entre os dias 22 e 28 de abril. De acordo com os gráficos da plataforma, esse pico coincidiu com o lançamento de um álbum de músicas pop da cantora Dua Lipa, com o título “Future Nostalgia”, o que justifica o aumento das buscas nesse período de tempo.
» Memória coletiva
Pierre Nora, um dos principais teóricos dos estudos de memória, ressalta a necessidade da vivência da memória coletiva: “Quanto menos a memória é vivida colectivamente, mais ela tem necessidade de homens particulares que fazem a si mesmos homens-memória. É como uma voz interior que dissesse aos Corsos: ‘Tu deves ser Corso’ e aos Bretãos: ‘É preciso ser Bretão!’ ” (NORA, 2016, p. 62). De acordo com Assmann, a memória social não pode ser distinguida da individual, já que uma faz parte da outra. “É por esta razão que é difícil, ou mesmo impossível, distinguir entre uma memória ‘individual’ e uma memória ‘social’. A memória individual é sempre social num nível mais elevado, tal como o são, em geral, a língua e a consciência” (ASSMANN, 2016, p. 89).
Articulações: A pesquisa de temas relacionados à hipótese (Identities + Experiences + Nostalgia) em diversas fontes , como livros, revistas, jornais e artigos científicos, nos mostrou que os assuntos em questão são amplamente abordados em diversos nichos. Essa recolha de materiais nos levou a perceber que a Identidade, enquanto tema de pesquisa cultural, é vista como mutável e em constante transformação. Em relação às Experiências, notou-se que a vida urbana trouxe questionamentos e alterações para a forma como elas são vivenciadas – e que questões sensoriais e corporais possuem grande impacto nesse aspecto. A nostalgia, por sua vez, aparece como um mecanismo de resposta às incertezas da modernidade – em que o passado é visto como positivo e a memória funciona como válvula de escape. A Globalização é vista como determinante nesses três aspectos – as identidades passam a ser mais fluidas com a velocidade da transformação, as experiências físicas tornam-se mais valorizadas após o avanço tecnológico e a compressão do espaço leva à nostalgia, que busca raízes nas origens e no passado. Em relação às narrativas, foi possível compreender que elas são uma forma de compreensão da própria vida e de conectar-se aos outros. As transformações em questões formais – passagem do oral para o escrito e, mais recentemente, para o audiovisual – nos levou a entender o cinema como uma fonte expressiva de narrativas para a hipótese, por reforçar a relação com as identidades.
Referências e Fontes:
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AUTIO, M., Collins, R., Wahlen, S., & Anttila, M. 2013. Consuming nostalgia? The appreciation of authenticity in local food production. International Journal of Consumer Studies, 37(5), 564-568. https://doi.org/10.1111/ijcs.12029
BASSANI, Jaison José; RICHTER, Ana Cristina; FERNANDEZ VAZ, Alexandre. 2013. Corpo, educação, experiência: modernidade e técnica em Walter Benjamin. Educação, vol. 36, núm. 1, enero-abril, 2013, pp. 77-87 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil.
BENJAMIN, Walter. 1936. ‘Der Erzähler’, GS II.2.
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EUROMONITOR, 2020. How to Prepare for the 2020 Consumer. <https://blog.euromonitor.com/how-to-prepare-for-the-2020-consumer/> acesso em: 01 mar 2020.
EUROMONITOR, 2019. Key Takeaways from Cannes Lions Festival 2019 <https://blog.euromonitor.com/key-takeaways-from-cannes-lions-festival-2019/> acesso em: 01 mar 2020.
FRANCISCO. 2020. Querida Amazônia. <http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20200202_querida-amazonia.html> acesso em: 01 de mar de 2020.
HALL, Stuart, 1994. Cultural Identity and Diaspora. In Colonial Discourse and Post Colonial Theory: A Reader, Edited by Williams. P & Chrisman. p. 227-237, London: Harvester Wheatsheaf.
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TEIXEIRA, Maurozan Soares. 2018. O conceito de experiência em Jonh Dewey: contribuições para uma epistemologia naturalizada. Revista Fundamentos – Vol. 1, Nº 1.
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Capítulo 2
2.1. Um Período que Sublinha Desigualdades
(Julia Rocha, Ni Min, 2021)
Vivemos em tempos modernos onde o crescente desenvolvimento da ciência e da tecnologia, de forma um tanto quanto acelerada, tem alterado não só a ideia que temos do tempo, que adquire um ritmo mais apressado, mas também a nossa forma de ver os outros e a nós mesmos. As incertezas sobre quem somos, onde pertencemos, além dos nossos papéis dentro da sociedade, começam a emergir aos poucos, afetando as nossas relações interpessoais, assim como a nossa visão sobre diversos aspectos da realidade humana.
Com esse contexto em vista, Bauman (2000, pp. 2-7) propôs uma visão da modernidade enquanto “líquida”, o que significa dizer que cada vez mais vivemos em uma sociedade fluida, leve, móvel, inconstante e que se transforma mais facilmente e rapidamente ao longo do tempo. A flexibilidade do mundo moderno tem “derretido”, dessa forma, a solidez das estruturas e instituições sociais, trazendo, como uma de suas principais consequências, uma diversidade de padrões e configurações não “auto-evidentes” que divergem do tradicionalmente estabelecido, muitas vezes chocando-se entre si.
De acordo com Hall (1992/2006, pp. 12-13), a identidade do indivíduo “pós-moderno”, que antes era considerada fixa, estável e permanente, também está se fragmentando em várias outras identidades, devido às mudanças estruturais e institucionais na sociedade. Isto trouxe uma “mobilidade” para o conceito de “identidade”, que agora é formada e transformada continuamente, de acordo com o sistema cultural ao seu entorno.
Além disso, Hall (1992/2006, p. 13) também afirma que “à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis”, o que significaria dizer que, ao longo da vida, conforme temos contato com diferentes grupos e ambientes sociais, vamos encontrando novas possibilidades, às vezes até contraditórias, de definir a nossa própria identidade.
Dessa forma, segundo Silva & Silva (2019, p. 456), a nossa identidade é formada por diferentes traços ou elementos que se relacionam com questões de gênero, etnia, classe social, nacionalidade, sexo, entre outros, que refletem diretamente a vida moderna, multifacetada e “líquida” descrita por Bauman. Seguindo essa linha de raciocínio, a nossa pesquisa procurou entender melhor as principais temáticas que envolvem a pluralidade das identidades nos dias de hoje, focando-se em termos relacionados à discriminação racial e étnica, diversidade e igualdade de gêneros, pluralidade familiar, entre outros.
Considerando as questões relacionadas com o racismo e diferenças étnico-raciais, um ponto que chamou atenção no último ano foi o agravamento da desigualdade e discriminação racial. Segundo a United Nations Human Rights (2021), a pandemia teve um impacto maior sobre grupos mais vulneráveis e desfavorecidos na sociedade, como é o caso das minorias étnicas, religiosas e raciais. Devido a desigualdades estruturais, essas minorias não só vivem em lugares menos privilegiados e mais populosos, onde o risco de contágio é maior, como também enfrentam maiores dificuldades de acesso ao diagnóstico e tratamento do Covid-19. Além disso, ao longo do último ano, as minorias sofreram fortemente com ataques físicos, discurso de ódio e teorias da conspiração, por serem consideradas as principais culpadas de propagar o vírus.
Dentro desse cenário desigual e caótico da pandemia, casos de assassinatos cruéis a afro-descendentes, como o do americano George Floyd (Nakhaie & Nakhaie, 2020) e o do brasileiro João Alberto Silveira Freitas (Jornal Nacional, 2020), ambos mortos por policiais brancos em seus países de origem, assim como as notícias dos constantes ataques físicos e verbais a pessoas de origem asiática, principalmente a chineses (Human Rights Watch, 2020), contribuíram muito para o crescimento exponencial de movimentos anti-racistas como o #BlackLivesMatter e o #StopAsianHate. Os dois movimentos promoveram uma enorme quantidade de protestos contra a discriminação racial em diversos países do mundo, chegando até mesmo, segundo Song & O’Donnell (2021), a unir as duas minorias em prol da luta contra os crimes causados por “ódio”.
Já considerando a temática de gêneros, observou-se durante a pandemia um aumento das taxas de desemprego e, principalmente, da disparidade entre homens e mulheres empregados. Segundo o World Economic Forum (2021, p. 6), aparentemente cerca de 5% de todas as mulheres empregadas anteriormente perderam os seus empregos, em comparação com 3,9% dos homens empregados. Uma das possíveis causas para essa diferença nas taxas de desemprego entre os gêneros masculino e feminino é o fato da mulher ainda desenvolver um papel muito mais participativo que o homem no cuidado e criação dos filhos, o que pode ter levado a um menor desempenho no trabalho durante o período de quarentena causado pela pandemia, tendo em vista que com as escolas encerradas e os filhos constantemente em casa, as mulheres tiveram maior dificuldade em equilibrar os papéis de “mãe” e “profissional”.
Além disso, ainda segundo o World Economic Forum (2021, p. 6), a pandemia trouxe um grande declínio na busca por profissionais mulheres para papéis de liderança, causando um regresso de 1 a 2 anos na luta pela igualdade de gêneros em diversos setores do mercado. Sendo assim, esse cenário trará efeitos drásticos nas oportunidades de crescimento profissional das mulheres, que sofrerão com as perspectivas inferiores de realocação no mercado de trabalho e uma consequente queda no valor de seus rendimentos anuais.
Outro ponto que comprova o impacto do Covid-19 sobre a luta por igualdade de gêneros, além da redução de outras desigualdades sociais, é a declaração (ONU News, 2020) do secretário geral da ONU, António Guterres de que a pandemia pode “atrasar em décadas” o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Segundo a Direção-Geral da Educação (n.d.), a agenda, criada em 2015 pela ONU, tinha estabelecido 17 objetivos para orientar as lideranças globais à favor, principalmente, da luta pela prosperidade e o bem-estar humano, tendo como um dos focos (Nações Unidas, n.d.) a promoção da inclusão sociopolítica e econômica de todas as pessoas, independente de gênero, origem, etnia, religião, classe social, entre outros, até 2030.
Apesar do efeito da pandemia no aumento da desigualdade e discriminação de minorias em geral, as classificações de gênero e sexualidade tem sido uma temática muito discutida nos media e nas redes sociais. Segundo Kim (2020), em nossa sociedade, nós fomos condicionados a ver como sendo “natural” ou “normal” em outros humanos os gêneros “masculino” e “feminino”, além da heterossexualidade, sem nos questionar se poderiam existir outras possibilidades na forma de expressarmos o nosso gênero e sexualidade. Desse pensamento, nasceu a Teoria Queer, que subverte as instituições tradicionais da sociedade, baseadas no modelo heteronormativo da sexualidade humana, e reconhece a pluralidade das identidades de gênero e orientações sexuais. De acordo com a American Psychological Association (2015, pp. 20-22), “identidade de gênero” e “orientação sexual” são conceitos muito diferentes e, por isso, não devem ser confundidos. A “identidade de gênero” de uma pessoa diz respeito à sua autopercepção de gênero, independentemente do sexo biológico com o qual ela nasceu, tendo em vista que alguém que nasceu com a anatomia masculina, por exemplo, pode não se identificar com o gênero masculino, mas sim com o gênero feminino ou com outros gêneros alternativos. Já a “orientação sexual” diz respeito à forma como uma pessoa se atrai sexualmente e emocionalmente por outra, além do comportamento que pode resultar dessa atração.
Dessa forma, segundo Pimenta (2020), as identidades de gênero mais comuns são: cisgênero (quando a pessoa se identifica com o seu sexo biológico), transgênero (quando não se identifica com o seu sexo biológico, muitas vezes se identificando com o sexo biológico oposto), não-binário (quando não se identifica completamente com o sexo feminino nem o masculino, podendo também se identificar um pouco com os dois), agênero (quando não se identifica com nenhum gênero existente). Já as orientações sexuais mais comuns são: heterossexualidade (atração por pessoas do sexo oposto), homossexualidade (atração por pessoas do mesmo sexo), bissexualidade (atração por ambos os sexos), panssexualidade (atração por pessoas, independente do sexo e gênero) e assexualidade (não sente atração por ninguém).
Em 2016, a Comissão de Direitos Humanos de Nova York (Ring, 2016) decidiu oficializar a diversidade das identidades de gênero, reconhecendo e liberando o uso de 31 tipos diferentes de gênero. Eles também deixaram claro que todas as identidades listadas estão protegidas pela lei de anti-discriminação e que qualquer tipo de desrespeito por parte de empresas à identificação de gênero ou à forma de tratamento preferencial de alguém é crime, passivo de multa de até 250 mil dólares. Em 2019, segundo Keneally, Nova York também aprovou uma lei que permite a alteração do gênero na certidão de nascimento a todos os cidadãos nascidos na cidade, sem a necessidade de apresentar uma avaliação médica. Dessa forma, qualquer cidadão, desde que seja maior de idade ou tenha autorização dos pais, pode alterar seu gênero para feminino, masculino ou X, uma opção neutra para pessoas não-binárias ou que se identifiquem com outros gêneros.
Já em relação às orientações sexuais, de acordo com Brabaw (2019), existem atualmente mais de 20 termos para expressarmos preferências sexuais. Além dos conhecidos “heterossexual”, “homossexual”, “bissexual”, “gay” e “lésbica”, termos como “androssexualidade” (atração pela “masculinidade”), “ginessexualidade” (atração pela “feminilidade”), “demisexualidade” (sente atração somente depois de estabelecer conexão emocional ou romântica com o parceiro), “queer” (sente atração pelo sexo oposto ou por ambos os sexos, mas acredita que os termos “gay”, “lésbica” ou “bissexual” são limitantes demais para descrever a sua sexualidade), entre outros. Apesar de haver uma grande diversidade de nomenclaturas sendo utilizadas tanto para identificar gênero quanto para descrever tipos de sexualidade, é importante frisar que, segundo a nossa pesquisa, ainda não existe um consenso sobre a definição de todos os termos, assim como não existe uma quantidade certa de gêneros ou orientações sexuais.
Outro fator identitário que tem sofrido atualizações ao longo dos últimos tempos é a “família”. O termo, que é tradicionalmente associado à ideia de “pai, mãe e filhos”, tem ganhado novas conotações, tendo sido até mesmo redefinido no dicionário. Prova disso é que, segundo o jornal Extra (2016), o Dicionário Houaiss lançou uma campanha publicitária em que pedia ao público brasileiro para enviar as suas próprias definições de “família” com o objetivo de tornar a definição oficial da palavra mais próxima de como é usada na prática nos dias de hoje. Depois de ouvir sugestões de mais de 3 mil pessoas, o Dicionário optou por atualizar a descrição do verbete “família” para “Núcleo social de pessoas unidas por laços afetivos, que geralmente compartilham o mesmo espaço e mantém entre si uma relação solidária”, um conceito muito mais “inclusivo, contemporâneo e sem preconceitos”.
Segundo Castanho (2018), a família é uma instituição que tem se tornado cada vez mais plural, podendo ser constituída de várias formas diferentes. Além do formato tradicional, composto por pais heterossexuais e filhos, outros formatos já são comuns, como é o caso da família monoparental (composta por um pai ou mãe solteiros), família reconstituída (pais e mães solteiros que se casam e formam nova família com filhos de parceiros anteriores), família homoafetiva (casais homossexuais ou LGBTQ+, podendo ter ou não filhos), famílias poliamorosas (união formada por múltiplos parceiros sexuais, com ou sem filhos), entre outros. No entanto, apesar da resistência de algumas pessoas em reformularem o conceito de “família” e aceitarem os novos formatos, acredita-se que muitos novos arranjos ainda irão surgir para se adaptar às possíveis mudanças de mentalidade na sociedade nos próximos anos.
Referências e Fontes:
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2.2. Identidades para além dos Códigos.
(Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos, 2020)
Durante esta fase da pesquisa, foi possível perceber que o que permeia como cerne da hipótese é a questão das identidades e suas diferentes e novas formas de expressão. Além disso, a busca por igualdade de uma forma ampla, em seus diferentes campos, seja de gênero, racial ou de qualquer outro grupo que de alguma forma esteja à margem da sociedade também é um componente forte.
Considerando as questões identitárias, buscamos definições de identidades e de gênero em órgãos como a OMS (Organização Mundial da Saúde) e APA (American Psychological Association) no qual nos deparamos com termos como gender norms, gender parity e gender dynamics; que mostraram-se ser termos presentes em alguns artigos do Fórum Econômico Mundial (FEM); relatórios de diversidade da Apple, Facebook e Google. A grande maioria dos artigos e textos dessa temática apresentam como conteúdo discussões relacionadas à igualdade de gênero no mercado de trabalho, representatividade e dinâmicas de gêneros. O aspecto que mais chama a atenção nos relatórios de diversidade analisados vem da Google, que no último ano levantou o primeiro senso de identificação não binária. Dos 39% dos funcionários que quiseram ser identificados 1% se auto identificam não binários e 8,5% LGBQ+ e/ou Trans (Parker, 2019). Sobre ações de inclusão sobre a temática seguem: LGBTQ+ frameworks; social discrimination and LGBTQ+; National legislation and LGBTQ+ rights; LGBTQ+ workplace inclusion; mental health and LGBTQ+ inclusion; economic impact of LGBTQ+ exclusion (FEM, 2020).
Em outras fontes como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (SDG – Sustainable Development Goals) das Nações Unidas, Fórum Econômico Mundial, mais uma vez, Forbes e McKinsey & Co, encontramos questões em torno da igualdade de gênero; discriminação; características comportamentais e discriminação zero; identidade e identidade digital.
O Fórum Econômico Mundial (2020) apresenta em seu relatório Gender Gap uma imagem mista, dizendo que no geral (e considerando o benchmark de 153 países listados), a busca pela paridade de gênero melhorou, diminuindo menos de um século e registrando uma melhoria se comparada com índices de 2018. Uma maior representação política para as mulheres contribuiu para esse resultado, mesmo sendo a dimensão de pior desempenho. No outro extremo da escala, prevê-se levar apenas doze anos para atingir a paridade de gênero na educação. O relatório ainda aponta três razões principais para disparidade de gênero: as mulheres terem maior representação nas funções que estão sendo automatizadas; não haver mulheres suficientes ingressando em profissões que envolvam o uso de tecnologia, e as mulheres enfrentam o eterno problema de baixa assistência e acesso a capital. Os pontos principais observados em relação à igualdade de gênero são: gender norms and roles; balance of care and careers; the case of gender parity; gender dynamics and future jobs; inclusive work practices; education gender gaps. (FEM, 2020).
Uma das vertentes das novas expressões identitárias que já não cabem nos códigos hoje existentes, é o uso de tecnologias para o aprimoramento do corpo humano, que pode se manifestar de diferentes formas: enhanced longevity; humanness and autonomy; equity and social justice; enhanced genes, bodies and minds; como mostra o Fórum Econômico Mundial (2020).
Um dos movimentos que mais abrange estas práticas é o transhumanismo, termo que começou a ganhar notoriedade em 1990, após sua criação formal por Max More, CEO da empresa Alcor Life Extesion, que o define como uma crença otimista no aprimoramento da condição humana através da tecnologia em todas as suas formas (Trippet, 2018). Atualmente há diversos especialistas sobre o assunto como Hans Moravec, Raymond Kurzeil, Andy Schwartz e até mesmo o historiador Yuval Noah Harari, que em seu recente livro, Homo Deus, sugere que nossa habilidade para nos aprimorar através de tecnologias e bioengenharia já iniciou uma nova era na história humana (Knight, 2019).
O implante de microchips já é uma realidade. Na Suécia, em 2018 mais de 3 mil pessoas já possuíam implantes com a tecnologia RFID (Stephen, 2018), os possibilitando realizar simples ações como abrir uma porta, bloqueio do metrô ou fazer algum tipo de pagamento. São diversas as empresas que se especializaram neste tipo de cirurgia, como a Cyborg Foundation, que possui o programa chamado Transpecies Society, uma comunidade para pessoas que se identificam como não humanos (SVD), ou a Jenova Rain que realiza biohacking upgrades, usando tecnologia para permitir que o corpo humano realize novas ações (Nye, 2018). O fundador da Tesla e SpaceX, Elon Musk, também anunciou sua nova empresa Neuralink, que tem como objetivo conectar a mente humana a uma nuvem de computadores, criando micro chips que serão implantados ao cérebro (Singularity University, p.15).
Grupo que também compartilha da mesma filosofia, os Biohackers são biólogos amadores que realizam experimentos em biomedicina, porém fora de instituições tradicionais, trazendo melhoramentos através da utilização de implantes ou até mesmo medicamentos ou suplementos que de alguma forma os aprimore (Nye, 2018). São diversos os exemplos de pessoas adeptas a esta prática, como o profissional de software Tim Cannon, o artista Moom Ribas que possui um sensor sísmico implantado que o permite sentir vibrações de terremotos ou Neil Harbisson que impossibilitado de enxergar cores, tem em seu crânio um dispositivo que o possibilita sentir as cores através de vibrações (Klaiman, 2019).
Ainda neste sentido, o desenvolvimento de novas tecnologias genéticas como o CRISPR, que é capaz de editar genes com custo muito mais baixo que antigas tecnologias, possibilitando o combate de doenças e também alterando características de um bebê antes mesmo de seu nascimento (Page, 2019) , parece serem promissoras nesta evolução do ser humano.
Podemos observar também que o tribalismo pós-moderno é a tensão fundadora que caracteriza a socialidade contemporânea, uma espécie de “nebulosa” de pequenas entidades locais ou microgrupos. É a reunião em grupos de afinidade dialogando com diferentes etnias, gêneros e as mais variadas condutas e estilos de vida (Souza, 2016). Com a reduzida ou inexistente representatividade de minorias que ainda permanece, vem também a falta de visibilidade das necessidade e direitos destes grupos que têm por vezes estereótipos discriminatórios ratificados pela mídia, como por exemplo o que acontece com os negros, normalmente aparecendo como trabalhadores braçais, atletas ou mulatas sensualizadas. Segundo estudo, realizado pela agência Heads, em parceria com a ONU Mulheres, mulheres negras aparecem como protagonistas em apenas 7,4% dos comerciais de televisão no Brasil (Estarque, 2019).
Outra questão é relativa ao universo infantil. As crianças não se sentem representadas nos brinquedos com que brincam, especificamente, as negras. Existe uma escassez de bonecas da sua etnia. Essa carência é prejudicial, uma vez que a dimensão formativa da brincadeira lida com aspectos da realidade social em que a criança está inserida (Moreira, 2018).
Ainda foi possível constatar um desencanto com a política, grande desconfiança acerca de boas ações praticadas por empresas e sobre a transparência dos sites no tratamento dos dados pessoais. Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos, Canadá, Japão, Austrália, França e Reino Unido pela IPSOS Mori a pedido da Internet Society and Consumers International mostra que 65% dos consumidores se preocupam com a forma como aparelhos conectados coletam dados. Mais da metade (55%) não confia em seus aparelhos conectados quando o assunto é privacidade (Santillana, 2019).
A pesquisa de 2017 realizada por Edelman Trust Barometer em 28 países constatou que a população em geral não confia nestas quatro instituições, sendo que a média de confiança nestas instituições combinadas está abaixo de 50% (Harrington, 2017).
Por fim, através da análise de conteúdo da desk research, advinda dos temas relacionados às palavras da hipótese: aceitação; polarização; crise; autenticidade; e no-gender; seguimos com as palavras-chave:identidade; diversidade; igualdade; discriminação; representatividade; política; tribalismo; autoridades; intolerância; população; desconfiança; humano; transhumanismo; tecnologia; robô, cyborg; corpo; CRISPR; futuro. Essas palavras-chave, ou tags, servirão como direcionadoras de pesquisa de sinais e padrões cool. As palavras são consideradas importantes neste trabalho dada a abrangência da hipótese em estudo.
Referências e Fontes:
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Capítulo 3
3.1. Acessos Digitais
(Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Indivíduos com 16 e mais anos que utilizam computador e Internet em % do total de indivíduos: por nível de escolaridade mais elevado completo (dados de 2019):
Agregados domésticos privados com computador, com ligação à Internet fixa e com ligação à Internet através de banda larga (%) em Portugal (dados de 2019):
80,9% Ligação à Internet fixa // 78,0% Ligação à Internet através de banda larga (https://www.pordata.pt/Municipios/Agregados+dom%c3%a9sticos+privados+com+computador++com+liga%c3%a7%c3%a3o+%c3%a0+Internet+e+com+liga%c3%a7%c3%a3o+%c3%a0+Internet+atrav%c3%a9s+de+banda+larga+(percentagem)-797)
Referências e Fontes:
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Mobilidade Digital – Desafios para uma visão de rede https://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/3894/1/movel25julv2.pdf (2013 RCAAP)
Avaliação dos Mecanismos de Privacidade e Personalização na Web https://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/3894/1/movel25julv2.pdf (2009 RCAAP)
Estratégia Nacional para a Inteligência Artificial – AI Portugal 2030 https://www.incode2030.gov.pt/en/ai-portugal-2030 (Portugal INCoDe – Iniciativa Nacional Competências Digitais)
Estratégia de Inovação Tecnológica e Empresarial 2018-2030 https://www.ani.pt/pt/valorizacao-do-conhecimento/valorizacao-de-politicas/estrat%C3%A9gia-de-inova%C3%A7%C3%A3o-tecnol%C3%B3gica-e-empresarial-2018-2030/
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Capítulo 4
4.1. A Sustentabilidade do Slow.
(Ana Manhique, Lucas Corrêa, 2021)
Como reduzir a pegada humana no planeta? Como fazer dos nossos produtos mais sustentáveis e menos poluentes? Como garantir que as indústrias reduzem a produção a sua pegada energética? São questões que requerem uma reformulação do funcionamento global e holístico da sociedade na sua relação com o planeta e recursos disponíveis num sistema capitalista, e na era do Antropoceno. Se antes da pandemia a fuga por uma forma mais lenta de vida era considerado um privilégio de alguns, hoje ela assume um papel cada vez mais determinante nas indústrias como a do Turismo, Moda, Criativas, Urbanas e Tecnológicas.
Nascido de um protesto em Itália nos anos 80 realizado por Carlo Petrini contra a inauguração de um restaurante “fast food”, o “Slow” assumiu nas últimas décadas uma adesão global, principalmente com a obra de Honoré, In Praise of Slow (2004) um bestseller na matéria. Começando pela Slow Food (Hendrikx, B., & Lagendijk, A. (2020), passando pela Slow Fashion (Lagere, A. & Kang, J. (2020), Slow Tourism (Serdane, Z., Maccarrone-Eaglen, A. & Sharifi, S. (2020), até ao Slow Living e Slow Cities (Tranter, P. & Tolley, R., 2020; Chi, X., & Han, H.,2020; Oliveira, E. E., 2021). O movimento tem crescido de um modo gradual e consistente, alcançando uma escala macro de impacto, nos sistemas de funcionamento social, urbano e económicos no presente. O movimento Slow contribui para a produção de novos estilos de vida num processo de readaptação, reformulação, renovação e reutilização, em que o equilíbrio entre o bem-estar, a qualidade de vida, e o ambiente estão no cerne do movimento. O movimento slow aborda assim a “falta de tempo” a escassez e pobreza de tempo para viver, produzir e partilhar no quotidiano. Ao propor a redução na velocidade na produção, partilha e consumo, é estabelecida uma maior relação com o habitat, o ambiente a ecologia na sua totalidade de forma mais consciente e sustentável, convidado as empresas e indústrias a prestarem mais atenção às preferências e exigência dos consumidores que gradualmente assumem o papel de produtores, inovadores e artesãos. O movimento slow tem a capacidade de produzir uma participação sustentável a vários níveis, do individuo, à comunidade, sociedade civil, organismos e empresas e por fim indústrias, a responsabilidade individual tem espaço para crescer de tal maneira que passa a ser um dos principais motores do movimento, o sentimento de mudança e contributo para a transformação, nas múltiplas formas que fazem com que o slow não desapareça enquanto tendência e sim, se reinvente e renove ao longo do tempo. Prova de que, não obstante, este movimento tenha surgido há mais de 30 anos, esteja agora em voga perante a pandemia.
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4.2. Uma Sustentabilidade dos Sistemas
(Marianna Rosalles, Francisco Mateus, 2020)
A Organização das Nações Unidas(ONU) declarou que em 2020 se inicia a década da ação, período determinante para a conquista dos 17 objetivos para o desenvolvimento sustentável no planeta: 1. Erradicação da pobreza; 2. Fome zero e agricultura sustentável; 3. Saúde e Bem-estar; 4. Educação de qualidade; 5. Igualdade de Gênero; 6. Água potável e Saneamento; 7. Energia Acessível e Limpa; 8. Trabalho decente e crescimento econômico; 9. Indústria, Inovação e Infra-estrutura; 10. Redução das desigualdades; 11. Cidades e comunidades sustentáveis; 12. Consumo e produção responsáveis;13. Ação contra a mudança global do clima; 14. Vida na água ; 15. Vida terrestre; 16. Paz, justiça e instituições eficazes; 17. Parcerias e meios de implementação. Essas metas estão diretamente relacionadas com a sustentabilidade e revelam uma urgência de iniciativas governamentais, corporativas e sociais para que sejam atingidas até o prazo estipulado.
É possível perceber que há um empenho em cumprí-las, que se revela a partir de congressos sobre o assunto que ocorrem ao redor do mundo, documentos governamentais que visam promover ações de sustentabilidade, estudos acadêmicos que avaliam as transformações desde que medidas ecológicas foram implementadas e até a publicação de livros sobre branding e sustentabilidade.
No entanto, também é possível perceber uma disparidade entre a realidade dos diversos continentes do mundo, a europa tem políticas públicas muito mais incisivas em termos de sustentabilidade ao passo que o Presidente Donald Trump retirou os EUA, um dos países com mais alto índice de emissão de carbono, do Acordo de Paris, tratado que visa uma cooperação internacional para responder à mudança climática. O Ministério do meio ambiente brasileiro possui uma agenda que favorece o agronegócio em detrimento da preservação da Amazônia, por exemplo. Há um descompasso global o que torna a conquista dessas metas de forma isonômica pouco provável.
A Europa apresenta em seus relatórios oficiais bons resultados em termos de racionamento e tratamento de água, o que lhes confere água potável em torneiras domésticas. No que tange o uso da água para irrigação na agricultura ainda há uma necessidade de se adequar às políticas da Common Agriculture Policy (CAP). A preocupação com as emissões de gases se relaciona ao crescimento do turismo, o desenvolvimento urbano e das indústrias.
Há diversas instâncias e tratados que visam acompanhar a evolução dessas políticas e propor novas soluções sustentáveis como por exemplo o Multiannual Financial Framework (MFF), European Maritime and Fisheries Fund (EMFF),Global Monitoring for Environment and Security (GMES), Urban Waste Water Treatment (UWWTD), Plant Protection Products (PPPD), Industrial Emissions Directives (IPPC-IED),Emission Limit Values (ELVs), Best Available Techniques (BAT), Millennium Development Goals (MDGs), Integrated Water Resources Management (IWRM), EU Water Initiative (EUWI), entre outros.
Um documento importante para ter uma visão panorâmica das políticas europeias em torno da sustentabilidade é a European Strategy 2020 que reúne soluções para temas como emprego; pesquisa e desenvolvimento; mudança climática e energia; educação; pobreza e exclusão social. O documento foi criado em 2010 e tem a expectativa de que até 2020 75% da população entre 20 e 64 anos esteja empregada, que haja uma redução de 20% das emissões de gases em relação aos anos de 1990, que haja um aumento de 20% no uso de energias renováveis, que a eficiência energética aumente em 20%, que a evasão escolar reduza em 10%, que 40% da população entre 30 e 34 anos atinja o terceiro grau de escolaridade e que pelo menos 20 milhões de pessoas saiam da faixa de risco da pobreza e exclusão social.
Em 2020 Lisboa foi selecionada para ser a capital verde europeia, o projeto promove uma série de iniciativas que incentivam a sustentabilidade e firma um compromisso com as diretrizes do Acordo de Paris, a Rede de Liderança Climática das C40 Cities e propõe a implementação do Plano de Ação para as Energias Sustentável e o Clima (PAESC).
É possível verificar que há uma facilidade de encontrar relatórios de Sustentabilidade de empresas portuguesas de ramos diversos, há um estímulo em desenvolver ações dessa temática. Multinacionais como a Volkswagen, a Citröen, Adidas e a C&A também investem em carros elétricos, consultoria com ativistas ambientais e redução do plástico.
A partir do início da pandemia do vírus Sars-cov-2 os noticiários começaram a relatar que o isolamento social trouxe benefícios para o planeta: houve uma redução das emissões de CO2 em razão da interrupção de voos, redução da poluição sonora pela pausa na circulação de automóveis, a melhora na qualidade do ar, entre outros avanços reportados. O surgimento do vírus também suscita uma reflexão sobre o consumo de carne, a degradação ambiental e a relação do ser humano com o planeta.
Adicionalmente a pandemia escancara as desigualdades sociais e se apresenta como um obstáculo na linearidade das políticas públicas de sustentabilidade uma vez que exige que a saúde, os auxílios governamentais e as estratégias de contenção da doença sejam priorizadas. O projeto de Lisboa verde, por exemplo, perdeu destaque no noticiário uma vez que se trata de uma iniciativa com forte apelo turístico, inviabilizado pelo isolamento social. Diversos artigos foram publicados nos últimos meses tratando dos impactos que o covid-19 teria no turismo, no desenvolvimento sustentável e na pobreza global.
Articulações: As marcas e instituições devem atender à demanda dos consumidores por produtos sustentáveis; As instituições internacionais enxergam essa década como limite para uma mudança de comportamento em relação à sustentabilidade; Para além do novo paradigma de consumo as corporações têm um papel de colocar em prática posturas que levem em consideração o esgotamento dos recursos naturais; É preciso repensar o sistema econômico atual de forma a garantir o bem estar das futuras gerações; Corporações têm feito mais relatórios sobre sustentabilidade; A sustentabilidade se tornou um valor para as pessoas; Há uma preocupação com a adoção de medidas sustentáveis no entanto essas estão muitio focadas na lógica do consumo; O covid-19 apresenta a necessidade de repensar a mobilidade urbana uma vez que os transportes coletivos promovem aglomerações; O teletrabalho é uma alternativa para a redução da poluição causada pelos automóveis e autocarros; A pandemia é um sintoma do esgotamento planetário, é preciso repensar nossas relações com a natureza;
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Resultados do Grupo 5/2020
Capítulo 5
5.1. Estilos de Vida e o Passado que Encoraja.
(Amanda Melo, Luísa Cortés, 2021)
Nas narrativas atuais, a presença do passado ainda é uma constante, e quando em contato com o presente, ele acaba por ser ressignificado. Portanto, o passado é sempre novo. Essa novidade é construída em função da memória de um mesmo acontecimento que é reconcebida num contexto inédito. Do ponto de vista da psicanálise, a novidade constitui sempre a condição do gozo , portanto, entendendo que “uma das características importantes dos bens de consumo em nossas sociedades é que eles mudam e que nós os trocamos indefinidamente” (Lipovetsky, 2007 p. 67), o passado necessita se apresentar “remodelado” nas narrativas do presente. Para Halbwachs, essa reconstrução do passado opera a partir de dados ou de noções comuns presentes em nós ou nos outros, pois “ela passa incessantemente desses para aquele reciprocamente, o que só é possível se fizeram e continuam a fazer parte de uma mesma sociedade” (Halbwachs, 1990, p. 34).
A pandemia redesenhou o nosso modo de vida e comprometeu a saúde emocional de todos. Segundo o relatório de Tendências para 2021 da Euromonitor International, em uma das tendências listadas, intitulada Rising Above Adversity, fica clara a necessidade das empresas em articularem os seus produtos com narrativas que encorajem, que transmitem resiliência para os consumidores e que também contemplem emoções que os toquem profundamente. Para atingir essa narrativa citada acima, as empresas estão se ancorando mais no passado na procura do que nos dá sentido à vida.
Reafirmamos aqui a necessidade das empresas compreenderem as narrativas dos seus consumidores para assim refletirem esse discurso nos seus produtos, pois afinal a “excitação e sensações é que são vendidas, e é experiência vivida que se compra, assemelhando-se todo consumidor, mais ou menos, a um ‘colecionador de experiências’” (Lipovetsky, 2007, p. 68). Entendendo que a narrativa atual está ancorada nesse passado com objetivo de buscar o simples e sólido para assim aliviar as tensões atuais que todos vivem, “ninguém pode negar que essas memórias se tornaram uma parte vital da cultura atual com suas experiências e reivindicações tão próprias” (Assmann, 2011, p. 20). A memória do passado é acionada de modo a resolver uma questão do presente, objetivando um futuro diferente, sendo assim, “a memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no eterno presente” (Nora, 1993, p. 9). Sobre a memória coletiva, Halbwachs nos diz que ela só existe pois somos seres sociais, que em nenhum momento deixou de estar confinado em alguma sociedade (Halbwachs, 1990, pp. 36-37).
Com a pandemia e a necessidade do isolamento social, ao mesmo tempo que as portas das casas se fecharam para a vida lá fora, elas se abriram mais para o mundo digital. “Lives” realizadas nas cozinhas dos artistas, reuniões de trabalho on-line com cada profissional na intimidade da sua casa, professores de diversas áreas necessitando vender as suas aulas pelo meio digital, tudo isso colaborou para tornar a vida privada de cada um uma importante mercadoria comercializada tanto pelas grandes marcas, como por cada indivíduo. Outro sinal onde podemos ver como os estilos de vida também estão a ser vendidos está relacionado com os crescentes canais de streaming que no início transmitiam apenas jogos, mas que agora transmitem toda a rotina das pessoas: cozinhando; estudando; trabalhando. Essa rotina que pode dar rendimentos recebe diariamente mais seguidores. Observamos aqui, que neste nosso mundo cada vez mais líquido (Bauman, 2000), a “venda” desses estilos de vida ganha também uma importante proporção simbólica, na medida que essa venda é entendida como uma aceitação do indivíduo. As pessoas se reconhecem e se comunicam por uma narrativa comum de vida.
Com esta desk research podemos perceber como o passado ainda funciona como âncora para a construção das narrativas atuais que personificam o simbólico em diversos meios: nos espaços físicos; nas nossas roupas; nas mídias; nos produtos e serviços que nos é oferecido. A constatação da modernidade líquida apresentada por Bauman (2001), acentua ainda mais a necessidade desse repositório simbólico como escape para um retrato do presente com ambições de um futuro projetado. A pandemia veio e nos fez questionar a razão de estarmos nesta vida, fazendo-nos buscar nas nossas memórias, exemplos que expressam o que é essencial para estarmos bem. Nesta busca, o simples passa a ser apresentado como uma opção leve para se viver a vida, as memórias do mundo no qual sentimos falta, são a força motriz para as novas histórias que iremos contar daqui por diante. O estilo de vida tratado como mercadoria pode ser observado tanto na relação das narrativas das empresas com os consumidores, como nas narrativas das pessoas com o mundo. Esta “venda” do estilo de vida, que já possuía principalmente uma proporção simbólica de “aceitação”, com a pandemia ganha uma potência real de monetização, atingindo principalmente o mundo digital.
Referências e Fontes:
Assmann, Aleida (2011). Espaços da Recordação: formas e transformações da memória cultural. Campinas: Editora Unicamp.
Bauman, Zygmunt (2001). A Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Editora Zahar.
Halbwachs, Maurice (1990). A Memória Coletiva. São Paulo: Vértice.
Lipovetsky, Gilles (2007). A Felicidade Paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras.
Nora, Pierre (1993). “Entre a Memória e a História: A problemática dos lugares”. Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História da PUC-SP. ISSN 0102-4442. Recuperado em: https://pt1lib.org/book/6068518/6b3654
5.2. Saúde e Novos Estilos de Vida.
(Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes, 2020)
A depressão e o estresse não são problemas recentes da humanidade, mas se agravam na medida em que o uso de ferramentas tecnológicas passou a ter uma importância central no dia a dia das pessoas. Associadas a isso, temos mudanças nas formas de interação social e no mundo do trabalho, que provocaram o aumento na incidência de doenças psicossomáticas, aliado ao surgimento de novas enfermidades.
Pesquisas recentes da Organização Mundial de Saúde (OMS, 2020) identificaram que 90% da população mundial é estressada; que a saúde mental afeta um quarto da população europeia; que as formas mais comuns de problemas de saúde mental na União Europeia são distúrbios de ansiedade e depressão.
Um levantamento realizado pela Comissão das Comunidades Europeias (LIVRO VERDE, 2005, p. 4) constatou que mais de 27% dos europeus adultos experimentem pelo menos uma forma de doença mental durante um ano. As formas mais comuns de problemas de saúde mental na UE são distúrbios de ansiedade e depressão. Até o presente ano, espera-se que a depressão seja a causa mais alta de doenças no mundo desenvolvido.
Além disso, até 28% dos trabalhadores na Europa relatam estresse no trabalho. Já a Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional publicou estudo a afirmar que o estresse ocupacional afeta 59% dos trabalhadores em Portugal (JUNQUEIRA, 2017). Em maio de 2019, a OMS anunciou que passou a incluir na lista de doenças o «burnout», estado de esgotamento físico e mental causado pelo exercício de uma atividade profissional.
A We Are Social divulga anualmente dados relacionados à exposição da população à internet e às mídias sociais. Na pesquisa mais recente (KEMP, 2020), constatou-se que 4,5 bilhões de pessoas utilizam a internet em todo o mundo; dessas, 3,8 bilhões estão nas mídias sociais. O levantamento verificou ainda que cresce a preocupação das pessoas com a privacidade na rede – quase metade dos usuários da internet utilizam bloqueadores de anúncio pop-up. Diante da massiva exposição aos meios digitais de comunicação, em especial as redes sociais, o programa Dependência de Internet, realizado pelo Hospital das Clínicas de São Paulo, no Brasil, verificou uma estreita relação entre o uso do Facebook e a manifestação de efeitos psicológicos negativos em seus usuários, o aparecimento de sintomas depressivos e o aumento marcante de uma insatisfação pessoal (NABUCO, 2017). O programa realiza atendimento multidisciplinar e acompanhamento de pacientes com dependência tecnológica.
Outro indício de que o mau uso das redes sociais pode causar prejuízos psicológicos é a pesquisa #StatusOfMind: Social media and Young people’s mental health and wellbeing, realizada pela Royal Society for Public Health. O estudo constatou que redes sociais mais focadas em imagens, como Instagram e Snapchat, são mais prejudiciais ao bem estar e à saúde mental, pois podem gerar sentimentos de ansiedade e inadequação (RSPH, 2017). A instituição sugere, como forma de evitar esses resultados negativos, a aplicação de avisos pop-up quando se faz uso prolongado das mídias sociais, a identificação de utilizadores que podem estar sofrendo de problemas de saúde mental em suas postagens e discretamente indicar apoio e a informação destacada quando imagens forem manipuladas digitalmente. Considerando que a saúde física e mental depende também do ambiente em que se vive, dados da Organização Mundial de Saúde apontam que atualmente 55% da população mundial vive em áreas urbanas (até 2050 esse percentual deve subir para 68%) e que essas regiões ainda sofrem com habitação e transporte inadequados, falta de saneamento, de tratamento adequado de resíduos, além de outras formas de poluição, ruído, contaminação da água e do solo, escassez de espaços para vida ativa (WHO, 2020). Soma-se a isso o fato de que os modos de vida e sistema de produção das cidades urbanizadas são os grandes impulsionadores das mudanças climáticas prejudiciais à saúde do ser humano.
Para fazer frente às necessidades de se buscar formas de vida mais saudáveis e que sejam compatíveis com a crescente urbanização, o Governo de Portugal instituiu políticas públicas para garantia da protecção da saúde mental através de medidas que contribuam para assegurar ou restabelecer o equilíbrio psíquico dos indivíduos, para favorecer o desenvolvimento das capacidades envolvidas na construção da personalidade e para promover a sua integração crítica no meio social (SAÚDE/PORTUGAL, 2016). As medidas incluem ações de prevenção primária, secundária e terciária da doença mental, bem como as que contribuam para a promoção da saúde mental das populações.
A pandemia de coronavírus vem mudando a forma como as pessoas se relacionam, os modelos laborais, de negócios e de controle social pelo Estado. Essas mudanças devem impactar no bem estar e privacidade das pessoas. Já há, inclusive, um movimento em direção ao maior controle sobre a vida e as atividades das pessoas. O argumento é que essas ferramentas de controle visam a garantir a segurança epidemiológica da população (TIDY, 2020).
Reuniões sobre a distribuição de uma identidade padrão global estão a ocorrer desde 2017, a cúpula do ID2020, uma parceria público-privada que está empenhada em promover esse objetivo de desenvolvimento sustentável para 2030, a utilizar tecnologia blockchain. A Accenture e a Microsoft participam como parte deste projeto, apoiado pelas Nações Unidas, para fornecer identificação legal para 1,1 bilhão de pessoas pelo mundo sem documentos oficiais (REUTERS, 2017). O teste para o programa já começou e foi lançado ano passado (2019), na cúpula anual em Nova Iorque, em colaboração com o Governo de Bangladesh, a aliança de vacinas Gavi e outros parceiros, para alavancar a imunização como uma oportunidade de estabelecer identidade digital. A ideia é que esse programa de identidade digital armazene, em um único local, todas as informações referentes ao indivíduo, inclusive as vacinas que ele tiver. Antes da concretização da tecnologia citada acima, países europeus consideram que uma ferramenta tecnológica de rastreamento e de alerta deve ser importante para controlar o vírus quando a população voltar às ruas (LINDE & COLOMÉ, 2020). Espera-se também que durante e após a pandemia, para garantir o acesso à outros países e ter um maior controle, seja necessário a comprovação de uma vacina, assim como a da febre amarela, por exemplo, que já é exigido em alguns países.
Referências e Fontes:
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REUTERS. Accenture e Microsoft trabalham em rede de identificação digital. Publicado em 19 de junho de 2017. Disponível em https://exame.abril.com.br/tecnologia/accenture-e-microsoft-trabalham-em-rede-de-identificacao-digital/. Último acesso em 27.02.2020.
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TIDY, Joe. Coronavírus leva governo de Israel a se dar ‘poderes especiais’ de espionagem. Publicado em 18 de março de 2020. Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/amp/geral-51938946. Último acesso em 27.02.2020.
WHO – World Health Organization. Urban Health, 2020. Disponível em https://www.who.int/health-topics/urban-health. Último acesso em 27.02.2020.
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Capítulo 6
6.1. Da criação ao movimento maker
(Julia Rocha, Ni Min, 2021)
Making is fundamental to what it means to be human. We must make, create, and express ourselves to feel whole. There is something unique about making physical things. Things we make are like little pieces of us and seem to embody portions of our soul. (Hatch, 2014, p. 11)
Segundo Ihde & Malafouris (2019, pp. 195-200), os seres humanos são fabricantes autoconscientes que enxergam o seu envolvimento criativo com o mundo material como um meio de moldar e expandir as suas mentes e corpos, ao contrário de outros animais, que criam e manipulam ferramentas para fins predominantemente utilitários. Essa característica essencialmente humana foi o que nos permitiu recriar, mudar e adaptar as condições de nossa própria existência, de forma a não só permitir a nossa evolução, como também a dar significado para nossas vidas, já que, de acordo com Hatch (2014, p. 11), a criatividade, ou seja, o ato de criar e produzir algo é fundamental para dar sentido ao que chamamos de “ser humano”.
Segundo Anderson (2012, p. 13), o ser humano já nasce “maker”, ou seja, somos criadores e inventores por natureza e isso é fácil de se observar nas crianças, que crescem fascinadas por qualquer brincadeira que estimule sua imaginação e criatividade, como desenhar, montar blocos e realizar outros trabalhos manuais. Ao longo do tempo, no entanto, fomos deixando o nosso lado inato como “inventores” e “criadores” de lado durante a fase adulta, estimulando-o na maioria das vezes somente através de hobbies, como cozinhar, fazer jardinagem, tricô, pintura, desmontar e consertar objetos em casa, entre outros.
Uma das explicações possíveis acerca do motivo que fez o homem moderno se afastar de seu lado “criador” e “inventor” foi a crescente implementação, graças às Revoluções Industriais, de um sistema de divisão ou especialização de trabalho ao qual o trabalhador urbano se adaptou nos últimos séculos. Segundo a análise realizada por Kish & Quilley (2020, pp. 28-29) sobre o conceito de “alienação do trabalho” de Karl Marx (1844), o modelo capitalista de produção, ao maximizar os lucros, acaba por “desumanizar” o trabalhador ao fazê-lo se especializar e dominar uma função específica, alienando-o em relação ao processo completo de produção do produto. Dessa forma, a especialização transforma o trabalhador em uma simples “mão-de-obra” ou uma “máquina”, negando-o, segundo Marx (1844, como citado em Kish & Quilley, 2020, pp. 28-29), a possibilidade de ser criativo durante o seu trabalho, além de fazê-lo perder a propriedade do que se é produzido. Como resultado, a atividade de trabalho perde também “significado”, faltando um senso de propósito que vá além da obtenção de um ordenado ao fim do mês. Esse processo torna o ser humano insatisfeito, já que ele se sente incapaz de expressar sua criatividade natural, forçando-o a buscar outras formas de satisfação pessoal fora do ambiente de trabalho, como através do lazer e do consumo exacerbado.
No entanto, nos últimos anos, esse contexto começou a mudar. O desenvolvimento da tecnologia e a crescente digitalização dos processos de “design” e “planejamento” não só barateou os custos de produção, como facilitou o compartilhamento de projetos, que agora podem ser executados tanto em menor quanto em maior escala dentro de uma simples oficina. Segundo Anderson (2012, pp. 25-26), a manufatura para fins comerciais em todo o mundo se tornou digital, em rede e aberta, podendo funcionar em qualquer escala, de unidades a milhões. Produzir um produto customizado e em pequenos lotes agora também tem um custo viável e, qualquer pessoa, independentemente de onde ela esteja, pode dar início a uma produção industrial apenas com um “clique” do computador pessoal, o que permitiu que o trabalhador comum pudesse ter o controle sobre o processo de criação e meios de produção em suas mãos, sem precisar se submeter a nenhum dono de fábrica.
Desse contexto, então, nasce o “Movimento Maker”, cujo objetivo principal é resgatar o lado “criador” e “inventor” do ser humano em sua jornada de trabalho, permitindo que ele possa também executar as suas ideias. De acordo com Dougherty (2013, p. 7), o propósito deste movimento, que dá origem à macrotendência das manufaturas culturais, é trazer o retorno do “experimental play”, ou seja, da “brincadeira experimental”, que permite que o ser humano “brinque” com a tecnologia e os objetos, de modo a não só entender melhor como funcionam, mas a também experimentar maneiras diferentes de fazê-los funcionar. É, inclusive, através desse comportamento de “exploração” das coisas, independentemente de ser uma impressora 3D ou um drone autônomo, que surgem ideias novas que podem levar tanto a novas aplicações em produtos quanto a novos empreendimentos. Ou seja, para Dougherty, o processo do “fazer” estimulado pelo movimento Maker é uma importante fonte de inovação para o mercado, sendo considerado também por Anderson (2012, pp. 17-20) como o “motor” da mais nova revolução industrial. Dougherty (2013, p. 8) também salienta que os chamados “makers” são “como artistas, motivados principalmente por objetivos internos” e “não por prêmios externos”, o que resume a busca do grupo por um trabalho de valor simbólico, que não tenha como objetivo primário a geração de lucro ou riqueza material, invertendo, dessa forma, a lógica da produção manufatureira promovida pelo sistema capitalista. O autor também ressalta que os “makers” procuram ainda, enquanto grupo, encontrar um meio alternativo de se tornarem consumidores, de forma a não serem definidos por aquilo que compram e consomem, mas sim por aquilo que criam, produzem e consomem. Nesse contexto, a necessidade de promover uma mudança de mentalidade é inerente ao movimento, já que o grupo tem urgência em transformar o presente, aproveitando as oportunidades que surgem para “criar” e “fazer” algo que promova um impacto positivo na sociedade atual. É por isso que, ainda segundo Dougherty (2016, p. 143), o “maker” acredita que a sua experiência enquanto criador e produtor e, consequentemente, as ideias que surgem dessa experiência, podem mudar o mundo de forma pequena, mas significativa. E é exatamente através do intenso envolvimento com o processo criativo, além do compartilhamento e desenvolvimento de ideias e projetos com outras pessoas, que suas vidas ganham significado e propósito, já que os “makers” se sentem livres e no controle do que querem fazer, sem medo de falharem ou serem julgados, como poderia acontecer se estivessem fazendo o mesmo dentro de uma fábrica ou empresa.
Sendo assim, de acordo com o “Manifesto do Movimento Maker”, criado por Hatch (2014, pp. 11-32), existem alguns princípios ou “regras” que estão presentes na mentalidade e nas atitudes dos “makers”, são eles: “fazer” (criar, colocar as mãos na massa para executar uma ideia); “partilhar” (compartilhar as ideias e possíveis métodos de executá-las com outros makers); “dar” (entregar a sua criação para os outros, como um presente); “aprender” (ter curiosidade e determinação de estar sempre buscando aprender métodos novos e/ou aprimorar o que já se tem de conhecimento); “equipar” (investir e/ou desenvolver todas as ferramentas que sejam necessárias para executar as criações); “brincar” (se divertir ao “fazer”, explorando e descobrindo novas formas de criar e produzir); “participar” (integrar e contribuir com a comunidade de “makers”); “dar suporte” (fazer o possível para ajudar a comunidade local de makers, buscando o apoio de governos e empresas, se for preciso) e “mudar” (abraçar a transformação que ocorrerá em si próprio através do envolvimento no Movimento Maker). Existem muitos locais onde pessoas com a mentalidade “maker” podem ser encontradas. Segundo Dougherty & Conrad (2016, p. 62), o Movimento Maker tem propiciado o surgimento de espaços comunitários que funcionam como oficinas, onde há o compartilhamento a um baixo custo das ferramentas necessárias para a execução de ideias e produtos (como impressoras 3D, cortadoras a laser, ferros de soldar, máquinas de costura, entre diversos outros materiais), “democratizando” ou tornando acessível, dessa maneira, o processo “manufatureiro” para qualquer pessoa. Esses espaços são chamados pelos “makers”, de forma genérica, de “makerspaces” e podem existir tanto com quanto sem fins lucrativos em locais públicos ou privados, como espaços comerciais, escolas, universidades e até dentro de empresas. Alguns tipos de “makerspaces” são mais conhecidos, como os “hackerspaces” (espaço para “programadores” e outras pessoas da área da Tecnologia da Informação terem acesso a ferramentas de fabricação de circuitos eletrônicos, prototipagem física, entre outros) ou os “fab labs” (uma rede de “laboratórios de fabricação digital”, que fornecem uma quantidade de ferramentas, materiais e tecnologia avançada que permitem aos “makers” produzirem quase qualquer coisa que imaginarem). No entanto, segundo Dougherty & Conrad (2016, p. 62), o nome do espaço não é tão relevante, já que o mais importante é que ele tenha como proposta principal o fornecimento de um ambiente que torne possível a colaboração entre pessoas com o mindset “maker” para a criação e produção de novos projetos.
Dessa forma, podem existir uma variedade imensa de makerspaces. Os autores Dougherty & Conrad (2016, p. 63) citam, como exemplo, cinco tipos diferentes e mais comuns de makerspaces, são eles: espaços locais orgânicos, iniciados por uma equipe pequena de fundadores; espaços comunitários que formam uma organização sem fins lucrativos; associações com fins lucrativos, organizadas como um negócio que busca fornecer ferramentas e treinamentos aos “makers”; laboratórios de desenvolvimento colaborativo, financiados por instituições como universidades ou empresas; espaços públicos e normalmente gratuitos, criados por museus, escolas e bibliotecas.
De acordo com o relatório da National League of Cities (2016, p. 1), existiam em 2016 pelo menos 2000 makerspaces espalhados pelo mundo. Na Europa, de acordo com o relatório da Joint Research Centre, também de 2016 (p. 14), foram mapeados 826 makerspaces, sendo 53% deles localizados somente na França, Alemanha e Itália, e 3,5% deles (p. 54) em Portugal, onde foram encontrados um total de 29 makerspaces. Já no Brasil, segundo o relatório do Facebook (2020, p. 23), a “Cultura Maker” foi um dos assuntos mais comentados na rede social entre janeiro de 2018 e junho de 2019, tendo crescido em torno de 60% em menções de um ano para o outro.
Segundo outra pesquisa mais recente realizada pela Pop Machina (2020) em países da União Europeia para entender o quão conhecido é o conceito por trás das manufaturas culturais hoje, foi descoberto que, de uma amostra (p. 19) de 6420 pessoas entrevistadas em 28 países, somente 17,93% e 19,17% (p. 21) tinham familiaridade, respectivamente, com os termos “movimento maker” e “makerspaces”, o que se assemelha à porcentagem de 17,94% relativa à quantidade de pessoas da amostra que já tiveram experiência prévia com o movimento.
Considerando as características individuais da porcentagem de pessoas (17,94%) que afirmaram já terem participado do “Movimento Maker” (consultar Tabela 1 na seção “Tabelas”, depois das “Referências”), é interessante notar que não há uma diferença demográfica muito clara entre elas, o que poderia comprovar a teoria de que o lado “criador” e “inventor” é uma característica inata do ser humano e que gênero, idade e até mesmo nível de escolaridade não é um impeditivo para as pessoas se interessarem a participar de atividades relativas às manufaturas culturais.
Quando consideramos as razões pelas quais os respondentes decidiram participar de um makerspace (consultar a Tabela 2 na seção “Tabelas”), também se confirma que a busca por “criar” ou “fazer”, “aprender” e “participar” presentes no “Manifesto do Movimento Maker” (Hatch, 2014, pp. 11-32) são as principais motivações para fazer parte do movimento, já que “Aprender habilidades novas”, “Desenvolver ideias” e “Encontrar indivíduos com interesses em comum” foram as principais respostas.
Segundo Wolf & Navarro (2017), estimular a cultura maker nas escolas é essencial para melhorarmos não só a capacidade de aprendizado de crianças e jovens, mas também para expandirmos a mentalidade “criadora” e “inventora” do movimento, permitindo, desse modo, que mais adultos se tornem “makers” e, consequentemente, surja um número maior de soluções inovadoras para problemas no futuro.
Referências e Fontes:
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6.2. Conceitos e Valores na Cultura Maker
(Érica Monteiro, Margarida Simões, Tatiana Abrahão, 2021)
1.1. O movimento Maker
O “movimento maker” tem sido debatido em diversas discussões. Várias publicações (ver Rosa et al.,2018, 2017) descrevem o conceito como um ramo do termo faça você mesmo – DIY (Do It Yourself), que combina tecnologias de ponta com atividades de artes e ofícios tradicionais, promovendo a aprendizagem, inovação, distintas abordagens da teoria para a prática. Já Dale Dougherty encara o movimento como uma afirmação sobre o valor dos objetos físicos e representa novas maneiras de produzi-los e conectá-los em rede ou em sociedade. De acordo com o autor Turner (2018) o surgimento do movimento maker origina-se da combinação de fatores culturais, econômicos e tecnológicos. Nessa perspectiva, o fator econômico prende-se com a recessão entre 2005 e 2007. Segundo o autor, a elevada taxa de desemprego nos Estados Unidos impulsionou a procura por novas formas de trabalho. Em 2005, Dale Dougherty, popularizou o conceito quando criou a primeira publicação especializada em cultura maker, Make, nos EUA, e em 2006, organizou a primeira Maker Fair, um encontro anual com espaços para criação coletiva1. Eles tornaram-se tão influentes que o órgão do governo americano Office of Science and Technology Policy sediou a sua própria Maker Fair na Casa Branca, em 2014. Na ocasião, o presidente da época, Barack Obama, assinala o movimento como uma “revolução no processo de manufatura” (“revolution’ in manufacturing”).
1.2. Os Makers
O elemento fundamental do movimento maker são as pessoas que participam da iniciativa, ou seja, os criadores. Segundo algumas definições na literatura, o movimento aparece como pessoas que criam uma variedade de produtos a partir do artesanato em casa (Collier & Wayment, 2018) e indivíduos que desenham e constroem novos dispositivos ou peças e dividem as suas experiências adquiridas neste processo com outros usuários (Wilczynski, 2015). De acordo com estudos qualitativos, os criadores podem ser amadores, como artesãos tradicionais até programadores de software, incluindo também na lista, por exemplo, designers, artistas, músicos, cozinheiros, estudantes, engenheiros, entre outros (Kwon & Lee, 2017). Sendo assim, Dale Dougherty definiu os “makers” (criadores) como – inicialmente para se referir aos leitores da sua revista “Make” –, sendo pessoas que criavam coisas com as próprias mãos ou que têm potencial para fazê-lo: ‘we are all makers’ (Masters, 2018).
Em uma entrevista com Daleesha Kulasooriya, do Center for the Edge da Deloitte, Dale Dougherty distinguiu três estágios de makers, ou seja, zero-to-maker, maker-to-maker e maker-to-market: O primeiro estágio, zero-to-maker, é basicamente o ponto de partida. Nesse estágio, passa-se da inspiração para inventar e transforma uma pessoa consumidora de produtos para participar na sua fabricação. Os aspetos necessários para este segmento são a capacidade de aprender as competências necessárias e obter acesso aos meios de produção. É aqui que começa o perfil DIYer (criador). No segundo estágio, Maker-to-Maker, os criadores tendem a colaborar e procurar a experiência com outros makers e DIYers. Eles também estão a contribuir em várias plataformas de media social. Neste segmento, os makers procuram melhorar, mas também compartilhar com os outros. Os criadores conversam ativamente, aprendem e apoiam uns com os outros. É uma verdadeira sensação de comunidade. No último estágio, Maker-to-Market, é onde a invenção e a inovação florescem. Os makers apelam para um mercado de um grupo muito específico ou para um público amplo, mas, de qualquer forma, é quando o produto chega ao mercado. Um dos maiores mercados para os makers venderem os seus produtos, por exemplo, é a plataforma colaborativa Etsy.
Outra abordagem conceitual é a da PSFK Labs e a Intel que propuseram uma classificação de acordo com o grau de envolvimento, habilidades e conhecimento de um maker ou criador. São identificados cinco grupos diferentes: o DIYer, o Self-Learning, o Educator, o Pro-Maker e o Empreendedor (PSFK Labs, 2015). O DIYer representa o criador amador com experiência em elaborar ou construir. Apesar de DIY ser uma paixão pessoal, o DIYer mantém seu hobby separado da sua profissão. O DIYer médio é curioso sobre as novas tendências, ferramentas e está interessado em expandir os seus equipamentos e conhecimento sem influenciar a sua carreira profissional. Os self-learners são pessoas que nunca têm medo de experimentar novas habilidades e encontrar um maior envolvimento num ambiente educacional prático e está frequentemente ativo em plataformas e fóruns online. O educador representa pessoas que naturalmente tem um talento especial para explicar as coisas e tem grande prazer em ajudar os outros e vê-los crescer nos seus projetos. O foco do educador também consiste em encontrar e divulgar recursos de aprendizagem e o estudo das aplicações criativas do movimento maker para assuntos STEM e artes. Os Pro-Makers usam tecnologias emergentes a fim de adicionar escala e eficiência aos seus projetos. Têm conhecimento avançado de codificação e estão bem conectados com a comunidade de criadores ao seu redor. Por último, os Empreendedores são a subcategoria de makers que comercializam os seus produtos e ideias. Assim, eles estão atentos às tendências do setor. Empreendedores procuram fontes de financiamento e plataformas para criar um produto comercializável, mas também um negócio sustentável.
1.3. Makerspace
A representação física do movimento maker inclui espaços como Makerspaces, FabLabs e Hackerspaces. O objetivo dessas iniciativas é fornecer tanto aos criadores quanto às suas comunidades os recursos tecnológicos necessários para que lhes permitam transformar as suas ideias em realidade. Para Macedo e Santos (2016, p. 72), makerspaces são “[…] espaços utilizados para as mais diversas atividades, cursos e serviços relacionados à informação, cultura e desenvolvimento de habilidades de pesquisa e uso de novas tecnologias”. Os makerspaces existem no mundo todo e estão envolvidos com iniciativas diversas, como a área da educação, causas sociais, inovação, bem como em startups e para fins empresariais. Cada espaço possui público, atividades e um conjunto de ferramentas e tecnologias distintos a cada público. Dougherty (2017) usa o substantivo makerspace como um termo universal para se referir a muitos termos, como: “hackerspaces, fabrication laboratories ou fab labs; e TechShops” que surgiram dentro das comunidades de maker (p. 62).
Em 2001, foi criado um programa pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), pelo cientista Professor Neil Gershenfeld. A sua proposta com a Fablab (abreviação mais difundida para fabrication laboratories), era fornecer o ambiente, habilidades, materiais avançados e tecnologia para tornar as coisas mais baratas e rápidas, além de disponibilizar o local para empresários, estudantes, artistas, e de facto, qualquer pessoa que queira criar algo novo ou personalizado. Estes espaços tinham o objetivo de analisar como o acesso a tecnologias digitais poderiam fortalecer as comunidades carentes (NIAROS et al., 2017). Assim, os espaços makers quando ligados ao MIT podem ser chamados de Fab Labs e dependem da aprovação da instituição realizada pela FabFoundation e um passo a passo para os interessados (A FabFoundation possui um guia para a implantação de um Fab Lab. Disponível em: https://fabfoundation.org/getting-started/#fab-lab-questions).
1.4. Mandamentos Maker
Escrito por Mark Hatch, no livro The Maker Movement Manifesto, os 9 “mandamentos” da cultura maker são traduzidos aqui segundo reportagem na revista HSM Management, em conversa entre Hatch e os brasileiros Ricardo Cavallini e Alon Sochaczewski: Make – Faça: é o que define o ser humano; Share – Compartilhe: é o método pelo qual o maker (criador) se sente completo; Give – Doe: há poucas coisas mais satisfatórias do que, com desprendimento, doar algo que você fez; Learn – Aprenda: é preciso aprender a fazer. E, por mais que você se torne um mestre artesão, há sempre novas técnicas, materiais e processos; Tool up – Aparelhe-se/Equipe-se: você precisa de ter acesso às ferramentas corretas para o projeto que tem em mãos. Invista e desenvolva acesso a elas, que nunca foram tão baratas e fáceis de usar; Play – Brinque: divirta-se com o que está a fazer e ficará surpreendido, animado e orgulhoso do que vai descobrir; Participate – Participe: una-se ao movimento maker e tenha acesso a pessoas à sua volta que estão a descobrir a alegria de fazer; Support – Apoie: esse é um movimento e ele exige apoio emocional, intelectual, financeiro, político e institucional; Change – Mude: acolha a mudança que vai acontecer naturalmente na sua jornada de maker. (CAVALLINI, 2014, p. 26)
Para Hatch (2013), a colaboração é um dos fatores mais importantes, seja a partilha de informações ou de habilidades individuais dos associados de uma equipa a favor de um objetivo comum.
1.5. Interesse pelo movimento nas redes sociais
De acordo com o Twitter Trends USA e Brasil, relatório com as principais tendências culturais baseado na análise de 300 mil tópicos de conversas na plataforma entre dezembro de 2018 e novembro de 2020, divulgado no dia 18 de maio de 2021:
No campo da cultura, os usuários aumentaram em 135% os debates sobre criatividade e discussões sobre mudança de carreira, além de empreendedorismo, hobbies e passatempos. Transformar a criatividade em carreira teve um aumento de 79% nas conversas; também cresceu em 65% a discussão sobre distribuição; 46% sobre hobbies e passatempos; e 61% sobre artesanatos. Além disso, segundo o relatório, hobbies e passatempos se tornaram cada vez mais importantes para a conversa. Com o distanciamento social, as pessoas compartilharam os seus projetos pessoais e jornadas de criação. E ainda, como uma reação contrária à produção em massa, as pessoas passaram a valorizar processos mais lentos e delicados, abrindo cada vez mais espaço para o trabalho manual e artesanal, representado por #feitocomamor e #criarcomasmãos.
Referências e Fontes:
Anderson, Chris, (2016) Makers: A Nova Revolução Industrial Dougherty, Dale; The Maker Mindset. MIT. Disponível em: https://llk.media.mit.edu/courses/readings/maker-mindset.pdf. Acessado em 04 de maio de 2021. Fab Labs No Mundo. Fonte: Disponível em: < https://www.fablabs.io/map>. Acessado em: 04 de maio de 2021 Fabfoundation. Homepage: Disponível em: < http://www.fabfoundation.org/> Acessado em 04 de maio de 2021. Macedo, P. A.; Santos, A. M. S. Design Thinking para Bibliotecas. In: PRADO, J (Org.). Ideias emergentes em Biblioteconomia. São Paulo: FEBAB, 2016. p. 69-77. Disponível em: http://www.febab.org.br/febab201603/wp-content/uploads/2016/07/Ideias-Emergentes-Em-Biblioteconomia.pdf. Acessado em 04 de maio de 2021 Makerspace. Makerspace Playbook: School Edition. [S.l.], 2013. Disponível em: <http://makered.org/wp-content/uploads/2014/09/Makerspace-Playbook-Feb-2013.pdf>. Acessado em: 04 de maio de 2021 Martin, L. The promise of the maker movement for education. Journal of Pre-College Engineering Education Research (J-PEER), v. 5, n. 1, p. 30–39, 2015 Niaros, V.; Kostakis, V.; Drechsler, W. Making (in) the smart city: The emergence of makerspaces. Elsevier, 2017. Rosa, P., Pereira, Â. G., & Ferretti, F. (2018). Futures of Work: Perspectives from the maker movement. Publications Office of the European Union, Luxembourg. Rosa, P., Ferretti, F., Guimarães Pereira, A., Panella, F., & Wanner, M. (2017). Overview of the maker movement in the European Union. Publications Office of the European Union, Luxembourg.
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Turner, Fred. Millenarian Tinkering: The Puritan Roots of the Maker Movement. Technology and culture, v. 59, n. 5, p. S160-S182, 2018.
Unterfrauner, E., Voigt, C., Schrammel, M., & Menichinelli, M. (2017). The maker movement and the disruption of the producer-consumer relation. In International Conference on Internet Science (pp. 113-125).
The Conversation: Twitter Trends, 2021. Disponível em: https://marketing.twitter.com/en/insights/the-conversation-twitter-trends-2021. Último acesso em 21.05.2021.
6.3. Condições de produção e os laboratórios
(Catarina Domingues, João de Atayde e Melo, Luiza Caxiano, 2021)
O movimento maker pode não ser uma ideia recente, mas nos últimos anos foi evoluindo, ganhando novas formas e atingindo uma série de mercados. De acordo com Aguiar, Cesca, Macedo e Teixeira (2017, p.1-2), esse movimento tem como ideal o “DIY (Do It Yourself)”, ou “faça você mesmo”, reunindo pessoas das áreas do artesanato, robótica, culinária e até criatividade a beneficiarem umas as outros, compartilhando conhecimentos e práticas, além de inovarem juntos e, com isso, gerarem ideias criativas entre si.
Segundo Gohn (1997, p.31), “cada tendência cultural tem, atrás de si, um desejo de mudança que está na cabeça das pessoas, particularmente em relação à concepção que têm de si próprias” e, segundo Ribeiro e Savaget (2006, p.2), a comunicação entre o autor e o leitor em uma criação colaborativa está voltada para o processo em si, minimizando a importância do resultado físico final e deixando mais espaço para o diálogo. Deste modo, Juraschek, Bucherer, Schnabel, Hoffschröer, Vossen, Kreuz, Thiede e Herrmann (2018) argumentaram:
“As cities play a major role in reaching the goals of sustainable development based on a high share of the world’s population in spatially close and organizationally established structures, the potential contribution of the functional elements of urban spaces is of high interest” (p. 72-73).
Percebemos então a importância do compartilhamento de experiências, ideias, práticas, surgindo os FabLabs, ou “laboratórios de fabricação”, permitindo que a produção, principalmente tecnológica, seja compartilhada pela comunidade. Segundo Pinto, Azevedo, Teixeira, Brasil e Hamad (2018, p.42-43), um FabLab deve ter como princípios a abertura de portas à comunidade de forma gratuita, deve compartilhar ferramentas e processos com laboratórios do mesmo tipo, devem ser geridos por pessoas qualificadas e possuir softwares e demais aparelhos eletrônicos que auxiliem os frequentadores. Assim como Juraschek, Bucherer, Schnabel, Hoffschröer, Vossen, Kreuz, Thiede e Herrmann (2018, p.74) afirmaram, “cities consist of many different elements and together these functional elements make up a set of components providing urban services and fulfilling the needs of the citizens. Urban factories are one set of these building blocks”.
A Rede Nacional de Incubadoras e Aceleradoras monitoriza a movimentação desse mercado, sendo a própria rede composta por 169 incubadoras no final de 2020, ano de referência para o desenvolvimento do relatório que, segundo a instituição, tem como objetivo medir os impactos das mesmas no ecossistema de empreendedorismo em Portugal. Por meio de um inquérito via e-mail para todas as 169 incubadoras da rede, 57,7% delas tinham como tipologia negócios de impactos regionais, sendo que, na Ilha da Madeira, 100% das incubadoras se enquadram nesse quesito e, em Lisboa, 34% (2021).
A cultura maker tem como princípios o processo de produção e a troca de ideias e experiências durante esta, muitas das vezes, abrindo mão do seu próprio direito autoral em prol de uma democratização do ensino. Segundo Pinto, Azevedo, Teixeira, Brasil e Hamad (2018, p.42), os processos e ferramentas devem ser facilmente compartilhados pelos indivíduos no mundo todo e, de forma geral, os FabLabs focam a experiência e novos recursos para potencializarem trabalhos “comuns”, de forma compartilhada e gratuita (p. 44-45). Dois autores descrevem três categorias de FabLabs que podemos encontrar atualmente. Eychenne e Neves (20, p. 17-19) afirmam que existem os Laboratórios Acadêmicos, sustentados por universidades ou escolas e o seu público se resume a essas entidades. Também existem os Laboratórios Públicos, geralmente sustentados por uma instituição governamental ou por ONGs, fornecendo, de forma geral, workshops e cursos para a população em geral. E, por fim, os Laboratórios Profissionais, funcionando com recursos privados e externos, possibilitando o aluguel do espaço para makers compartilharem as suas ideias, sendo muito frequentados por empreendedores e start-ups a fim de se desenvolverem.
Segundo o relatório “Future of Work: Perspectives from the Maker Movement” (2018) – que tinha como objetivo procurar outras esferas em que o trabalho se insere e onde os indivíduos podem estar reinventando formas de trabalhar – algumas das narrativas discutidas como meios de explorar e pesquisar o futuro do trabalho no relatório (2018, p. 10-11) foram: Os efeitos da automatização no futuro do trabalho e a colaboração entre o humano e a tecnologias; A influência da globalização ao permitir a partilha global de práticas e ajudando a sustentar processos locais de produção; A produção não tradicional de manufaturas “de massa”, mas sim as microfaturas, que não possui como objetivo a criação de produtos padronizados; Uma revisão do termo economia compartilhada, estas que, segundo os participantes, devem estar realmente se preocupando com o compartilhamento de conhecimentos e na forma de tratamento justo aos trabalhadores; Na possibilidade que os makerspaces desenvolvem novas habilidades aos participantes e os ensinam as pessoas a serem mais flexíveis; Ideias de cuidados e paixão estão associadas a economia verde.
Além das temáticas acima foram destacados outros valores pelo relatório, diretamente associados a cultura maker, como: Inovação, habilidades, “Open Everything” (o termo está correlacionado com “open sourse”, modelos de desenvolvimento abertos para criação e modificações, principalmente relacionados a tecnologias e softwares. Ao relacionar os termos, “open everything” é uma forma dos autores expressarem um sentimento de abertura de mercado maker para além da programação, mas podendo ser impostos em outras esferas da criação comunitária.), Compartilhamento, Fantasia, Colaboração, Educação, Diversão, Solidariedade, Autonomia, Cuidado e Tempo. Os autores do relatório ainda trazem uma reflexão dos impactos da cultura maker:
“In the context of the current report, the emergence of makerspaces is enabling new models of education, collaborative work, and manufacture. These spaces function as multidisciplinary learning environments that stimulate new ideas and concepts for products, accelerating invention and design cycles (and thus function as tech incubators)” (2018, p. 25).
A cultura maker e as manufaturas culturais são mais do que apenas gerar resultados, elas possuem ideais de cooperação e comunidade por trás delas, sendo “como fazer” mais importante. Os detentores de poder tradicionais perdem o foco e as produções locais se tornam mais significativas no ponto de vista de não estarem preocupados com o lucro e sim possuem como potencial diferenciador o apoio a uma economia mais sustentável e social. Além disso, a produção comunitária e manual contribui para um desenvolvimento mais autônomo e educacional a ponto de ter como relevância a capacitação dos indivíduos envolvidos no processo de produção.
Referências e Fontes:
Aguiar, F. F., Cesca, R., Macedo, M., & Teixeira, C. S. (2017). Desenvolvimento e
implantação de um Fab Lab: um estudo teórico. Revista Espacios, 38, pp. 1-14.
Eychenne, F., & Neves, H. (2013). Fab Lab: A Vanguarda da Nova Revolução
Industrial. São Paulo: Editorial Fab Lab Brasil.
Gohn, M. d. (1997). Teoria dos Movimentos Sociais: Paradigmas Clássicos e
Conteporâneos. São Paulo: Edições Loyola.
Juraschek, M., Bucherer, M., Schnabel, F., Hoffschröer, H., Vossen, B., Kreuz, F., . . .
Herrmann, C. (2018). Urban factories and their potential contribution to the sustainable
development of cities. 25th CIRP Life Cycle Engineering (LCE) Conference (pp. 72-77).
Copenhagen: Elsevier B.V.
Pinto, S. L., Azevedo, I. S., Teixeira, C. S., Brasil, G. S., & Hamad, A. F. (jan-fev de
2018). O Movimento Maker: Enfoque nos FabLabs Brasileiros. Revista Livre de
Sustentabilidade e Empreendedorismo, 3(1), pp. 38-56.
Rosa, P., Guimarães Pereira, Â. and Ferretti, F., 2018. Futures of Work: Perspectives
from the Maker Movement. [online] Luxembourgo: European Union. Available at:
<https://publications.jrc.ec.europa.eu/repository/handle/JRC110999> [Acesso em: 17 Maio
2021].
6.4. Cultura Maker e permissas para a formação
(Amanda Melo, Luísa D. Cortés, 2021)
A cultura maker está fortemente relacionada com a macrotendência de Manufacturas Culturais. Para entender os valores desse movimento, recorremos ao Manifesto Maker:
“Todo mundo é Maker; o mundo é o que fazemos dele; se você pode sonhar com algo, você pode realizar isso; se você não pode abri-lo, você não pode tem a posse dele; ajudam-se uns aos outros para fazer algo e compartilham uns com os outros o que criaram; não são apenas consumidores, são produtores, criativos; sempre perguntam o que mais podem fazer com o que sabem; não são vencedores, nem perdedores, mas um todo fazendo as coisas de uma forma melhor”. (Gavassa, Munhoz, Mello, Carolei, 2016)
Na plataforma Google Trends, os movimentos de busca em massa que apontam esses valores mantêm-se constantes, sem aumentos fora do padrão ao longo dos últimos cinco anos. As pesquisas foram realizadas com os termos em português e em inglês, com escopo mundial. Há um termo relacionado, no entanto, que apresentou um crescimento em relação ao número de procuras no último ano. É o próprio termo cultura maker, que teve um aumento considerável em outubro de 2020, principalmente em relação a procuras voltadas para a área de educação e ensino.
No Brasil, país com maior incidência de pesquisas desse termo, a inserção da cultura maker no ambiente escolar é discutida ao menos desde 2016, quando a primeira edição da pesquisa Nossa Escola em (Re)Construção, realizada pelo Instituto Porvir, foi publicada. Já naquela época, 19% dos jovens entrevistados queriam fazer projetos práticos no ambiente escolar e 25% preferem escolher todas as disciplinas que vão fazer ou não. Além disso, cerca de 50% dos jovens disseram considerar as aulas dinâmicas, interessantes e divertidas. Nesse contexto pré-pandemia, a metodologia da cultura maker em ambiente escolar já estava em consonância com outros movimentos pedagógicos, as chamadas Metodologias Ativas, como sala de aula invertida, design thinking e a aprendizagem colaborativa e baseada em projetos. O tema começou a ganhar especial atenção de pesquisadores da educação em 2019, quando o número de publicações relacionadas a ele mais que triplicou, segundo o estudo (Pereira, 2020).
Em decorrência do isolamento social que se fez necessário após a pandemia do Covid-19 e a consequente massificação do ensino remoto, esse processo de inserção da cultura maker se aprofundou em certos espaços. Com esse movimento, foi constatado (Nascimento, Brito, Silva, 2020) que esse ambiente multitarefas contribuiu para uma melhoria do dos estudantes em atividades escolares. “Foi possível desenvolver uma aprendizagem criativa a partir dos espaços makers, trabalhando de forma multidisciplinar e engajando os estudantes em sua própria aprendizagem” (Nascimento, Brito, Silva, 2020).
Esse avanço no engajamento dos alunos também foi observado na pesquisa de 2020 intitulada O impacto do ensino maker na educação, da Nave à Vela. Dos educadores respondentes, 43% avaliaram que a participação dos estudantes aumentou consideravelmente no período e 23,9% que aumentou muito. Deles, 70,9% ainda destacaram a melhora do desempenho dos estudantes; 16,2% sublinharam o engajamento dos alunos em aulas online durante a pandemia e 12,8% reconheceram a melhora no engajamento dos próprios professores.
A pesquisa ainda detectou que 65,8% dos respondentes aderiram à cultura maker pela melhora da capacidade socioemocional dos alunos, “ajudando-os a gerenciar emoções, alcançar objetivos, demonstrar empatia e tomar decisões de maneira responsável”, habilidades buscadas em um contexto de crise como o de uma pandemia global. Além disso, a publicação aponta para a possibilidade de criar uma geração mais autônoma e com maiores habilidades sociais. Por enquanto, apenas 9,4% das escolas brasileiras, país onde o estudo foi realizado, estão adotando o ensino maker em contexto de isolamento social. Das instituições que aderiram à metodologia, 85,5% afirmaram que as chances de prosseguir com a metodologia no ano letivo seguinte são altas. Isso porque os benefícios pedagógicos vão ao encontro dos valores procurados em uma sociedade imersa no ambiente digital e profundamente influenciada por ele: Do ponto de vista pedagógico, a experimentação, quando aberta às possibilidades de erro e acerto, mantém o aluno comprometido com sua aprendizagem, além de estimular sua criatividade. Ela auxilia o aluno na busca de diferentes estratégias para resolução de um problema, do qual ele toma parte diretamente, inclusive do processo de produção. O ambiente criado em um Fab Lab proporciona aos alunos e professores as condições ideais para a experimentação, disponibilizando ferramentas, manuais e acesso à informação, de forma mais colaborativa e menos formal do que se encontra em experimentos científicos tradicionais (Medeiros, Bueira, Peres, Borges, 2016).
A prática, além disso, converge com valores de democratização do conhecimento, o que vai ao encontro de uma tendência para o ano de 2021 de maior envolvimento em questões políticas e sociais, como aponta o Euromonitor de 2020. Nesse sentido, Paulo Blikstein, responsável pela FabLearn na Universidade de Stanford, teoriza um movimento maker relacionado à educação, principalmente a ideais construtivistas ligados a Dewey, Piaget e Paulo Freire (Mannrich, 2019, p. 7). Ele descreve como:
“o estudante no centro do processo de aprendizagem ao realizar e criar projetos que envolvem habilidades, competências e conhecimentos STEAM (acrônimo para Science, Technology, Engeering, Ars and Mathmatics) e promover autonomia para a prática plena da cidadania. Para Blikstein, a educação progressista dá conta de responder às demandas que o mundo do trabalho almeja, organizadas em torno das ditas habilidades do século XXI, e também à pedagogia crítica, que pressupõe a formação para a cidadania”. (Mannrich, 2019, p. 7)
Desta forma, a cultura maker, dentro da macrotendência das Manufacturas Culturais, está em convergência com valores urgentes à sociedade contemporânea, tanto pela inserção mais efetiva da população em geral no ambiente digital quanto pelas mudanças sociais provocadas pela pandemia do coronavírus. É um movimento que já estava em curso teve suas alterações durante esse período para abarcar as necessidades pontuais que surgiram desde então, especialmente no campo da educação. Valores como inteligência socioemocional, criatividade, engajamento, autonomia, habilidades multitarefas, senso de comunidade, democratização do conhecimento, cidadania e capacidade crítica estão inseridos neste contexto.
Referências e Fontes:
Angus, A. & Westbrook, G. Top 10 Global Consumer Trends 2021. (Euromonitor
International). Recuperado de:
https://go.euromonitor.com/white-paper-EC-2021-Top-10-Global-Consumer-Trends.html
Gavassa, R. C. F. B., Munhoz, J. B., Mello, L. F., & Carolei, P.. (2016). Cultura Maker,
Aprendizagem Investigativa por Desafios e Resolução de Problemas na SME-SP (Brasil).
Consultado em 25 mai. 2021. Disponível em
https://fablearn.org/wp-content/uploads/2016/09/FLBrazil_2016_paper_127.pdf
Mannrich, J. P. (2019, junho). Um Olhar sobre o Movimento Maker na Educação
(Científica). Apresentada em XII Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em
Ciências – XII ENPEC Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN
Medeiros, J., Bueira, C. L., Peres, A., & Borges, K. S. (2016). Movimento maker e educação:
análise sobre as possibilidades de uso dos Fab Labs para o ensino de Ciências na
educação Básica. Consultado em 25 mai. 2021. Disponível em
https://fablearn.org/wp-content/uploads/2016/09/FLBrazil_2016_paper_33.pdf
Nascimento, E. R., Brito, I. P. L., & Silva, A. G. P. (2020). Aprendizagem em ambientes
multitarefas: uma realidade na cultura maker. Revista de Estilos de Aprendizaje,Vol. 13,
Núm. Especial, 157-170.
Pereira, A. P., & Arthur, T.. (2020, agosto). Cultura maker e ensino de ciências: um
mapeamento sistemático. Apresentada em Congresso Internacional de Educação e
Tecnologias. Encontro de Pesquisadores em Educação à Distância. Consultado em 04 de
jun. de 2021. Disponível em
https://cietenped.ufscar.br/submissao/index.php/2020/article/view/1096
O impacto do ensino maker na educação: 1ª Pesquisa Nacional do Impacto do Ensino Maker
na Educação. (2020). Nave à Vela. Consultado em 25 mai. 2021. Disponível em
https://materiais.naveavela.com.br/motim-ebook-pesquisa-impacto-maker
Relatório de Resultados: Nossa escola em (Re) Construção. (2016). Porvir. Consultado em 25
mai. 2021. Disponível em https:/porvir.org/nossaescola relatório/
6.5. Colaboração e Espaços Maker
(Andressa Maia, Isabel Gomes, Maria Frederico, 2021)
No processo de investigação da hipótese das manufaturas culturais como tendência encontramos diversos conceitos recorrentes associados principalmente à questão da partilha e da co-criação. Parecem nos ser questões chave: o paradigma dos bens comuns colaborativos, o desenvolvimento de uma cultura de partilha associada às sociedades em rede e o ser humano como inteligência criadora e fabricadora tanto de objetos materiais como imateriais.
O estudo desta mentalidade se apoia necessariamente em uma pesquisa mais abrangente da sociedade contemporânea e de suas práticas. No contexto desta, encontramos vários autores a apontar para uma mudança de paradigma emergente que parece responder à nossa vivência cada vez mais global e cosmopolita. Essa sociedade, que se torna a cada dia mais urbana, cria novas formas de se relacionar e produzir que vão ao encontro de suas atuais demandas econômicas, políticas e sociais.
Na virada do século Castells (2002) já nos falava sobre: “o avanço de expressões poderosas de identidade coletiva que desafiam a globalização e o cosmopolitismo em função da singularidade cultural e do controle das pessoas sobre suas próprias vidas e ambientes.”(p. 18). Para Castells teríamos uma nova forma de sociedade, a sociedade em rede, introduzida pela revolução tecnológica e reestruturação do capitalismo. O impacto das tecnologias emergentes nas estruturas sociais é também tópico essencial para Jemielniak & Przegalinska (2020):
“Emerging technologies, thanks to their direct collaboration-enabling features and their engagement of much broader populations, act as super-multipliers for many effects of collaboration that would otherwise be less noticeable. We perceive this phenomenon to emanate from what we call collaborative society: an emerging trend that changes the social, cultural, and economic fabric of human organization through technology-fostered cooperative behaviors and interactions”. (p. 4)
Segundo Jemielniak & Przegalinska essa crescente sociedade colaborativa apoia-se em diferentes modos de cooperação, partilha, criação conjunta, produção, distribuição e consumos de bens e serviços por indivíduos, comunidades e organizações. (2020, p. 5). Essa produção colaborativa baseada em recursos comuns representa para Rifkin (2014) um deslocamento do capitalismo de mercado para um novo paradigma econômico, que de acordo com o autor se assenta em uma produção cada vez mais descentralizada e democratizada. Segundo Rifkin os Collaborative Commons já estão impactando profundamente nossa vida: possuir perde cada vez mais espaço para acessar, mercados dão lugar a redes de partilha e os interesses comunitários passam a se sobrepor aos interesses individuais (p. 34).
Uma estrutura de análise que nos parece interessante para os Commons é proposta por Bollier & Helfrich (2019). Segundo os autores, cada Commons depende de processos sociais e da partilha de
conhecimentos e recursos físicos. E esta estrutura tripla fornece um enquadramento de padrões que nos permite estudar estes fenômenos e também replicá-los. Aqui talvez seja interessante indagar o que definimos como Commons, ou Comuns, Dardot & Laval (2017) concebem os comuns como práxis, de acordo com os autores somente a atividade prática dos homens podem tornar as coisas comuns e criar um novo sujeito coletivo. O comum é para os mesmos “um princípio político a partir do qual devemos construir comuns.” (pp. 52-53) Dentro dessas novas práticas colaborativas e comunitárias, o “pôr a mão na massa” parece surgir como atividade central das identidades e comunidades urbanas. Indicando ao retorno dos comuns, Coriat (2015) discorre sobre a importância da capacitação, da partilha dos saberes e práticas, para uma verdadeira experiência dos comuns: “En effet, il n’est pas de communs qui n’incluent comme une dimension toujours cruciale la nature des savoirs et des savoir-faire liant et associant les commoners dans la gestion de la ressource partagée” (p. 248). Para Coriat os bens comuns e a economia da partilha surgem como alternativa aos impasses e exclusivismos impostos por uma economia altamente financeirizada e para tais alternativas é crucial a partilha de conhecimentos e informações.
A cultura maker, nos parece também referência essencial ao pensar as manufaturas culturais. Dougherty (2016), um dos fundadores do movimento, fala-nos sobre a importância do fazer e da criação como conceito basilar do que é ser humano:
“Making is so central to what makes us human that the term Homo faber was coined to describe what sets us apart from other animals […] The term Homo faber reminds us that humans both transform materials into tools and transform the world using those tools. This makes us who we are: makers” (p.20). Apoiado em pilares como: criatividade, colaboração, sustentabilidade, escalabilidade, democratização e empoderamento, o movimento maker segundo Dougherty é um agente de mudança social que engloba todos os modos de fazer e todos os tipos de criadores.
Intimamente ligado ao reconhecimento de que fazer e criar define quem somos (p. 34).
Dougherty identifica cinco diferentes tipos de espaços maker: espaços orgânicos locais, inaugurados por um pequeno time de fundadores; espaços comunitários que instituem uma organização, geralmente sem fins lucrativos; espaços afiliativos organizados que promovem acesso a ferramentas e treinamento a partir do pagamento de taxas; laboratórios de desenvolvimento colaborativo financiados por instituições públicas e empresas; e espaços públicos de criação criados intencionalmente em museus, escolas e bibliotecas (2016, p. 76).
Em nossa recolha de informações dos meios de comunicação encontramos estas variações de locais onde as manufaturas culturais parecem florescer, desde espaços institucionais e organizados a espaços mais orgânicos e comunitários. Percebemos constante ligação com as práticas de DIY, o faça você mesmo, e resgate de uma produção manual e artesanal que se embasa também em uma mentalidade de consumo mais sustentável e de uma economia circular que se apoia na reciclagem e reutilização de materiais e bens.
Jackson (2016) em sua proposta de uma prosperidade sem crescimento discorre sobre a necessidade de mudança da lógica social do consumismo, o crescimento pelo crescimento, que é prejudicial a prosperidade tanto ecológica quanto psicológica, precisamos criar novas formas de lidar com os recursos disponíveis para a nossa sobrevivência de acordo com o autor.
Entidades como a ONU e UE têm promovido planos de ação pautados por diversas questões ressonantes com esta mentalidade, focados em cooperação, educação e no estabelecimento de uma economia circular, debates que parecem essenciais para os indivíduos contemporâneos. No âmbito do projeto Urban Manufacturing da UE, que define como objetivo o êxito de makerspaces colaborativos, existem um conjunto de boas práticas indicadas para produção de objetos através da colaboração. O projeto acredita que esta forma de trabalho fornece inúmeros benefícios como: elevado senso de comunidade e novos e aperfeiçoados produtos. É relevante notar que Lisboa figura no projeto com seu próprio programa local de desenvolvimento. Outro projeto pertinente para esta investigação é o Fab City que se apresenta como um novo modelo urbano de produção local e conexão global para cidades auto suficientes.
No seu manifesto são listados princípios como: participação, produção local, inclusão, “glocalismo”, crescimento econômico e empregabilidade, entre outros. O projeto lança o desafio de que cidades produzam tudo que consomem até 2054. De acordo com Hill (2020) a manufatura urbana ajuda as cidades a enfrentar importantes necessidades, estas são, para o autor, inseparáveis de seu contexto urbano e contribuem fortemente para o desenvolvimento das cidades (p. 31).
Referências e Fontes:
Bollier, D., & Helfrich, S. (2019). Free, Fair, and Alive: The Insurgent Power of the
Commons. New Society Publishers.
Castells, M. (2002). A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura. Vol. II, A
Sociedade em Rede. Paz e Terra.
Coriat, B. (2015). Le retour des communs. Les Liens Qui Libèrent.
Dardot, P., & Laval, C. (2017). Comum: Ensaio Sobre a Revolução no Século XXI.
Boitempo.
Dougherty, D., O’Reilly, T., & Conrad, A. (2016). Free to Make: How the Maker
Movement is Changing Our Schools, Our Jobs, and Our Minds. North Atlantic Books.
Hill, Adrian V (ed.). (2020) Foundries of the Future: a Guide to 21st Century Cities of
Making. TU Delft Open.
Jackson, T. (2016). Prosperity without Growth: Foundations for the Economy of Tomorrow
(2nd ed.). Routledge.
Jemielniak, D., & Przegalinska, A. (2020). Collaborative Society. The MIT Press.
Rifkin, J. (2014). The Zero Marginal Cost Society: The Internet of Things, the
Collaborative Commons, and the Eclipse of Capitalism. St. Martin’s Press.
A Avó Veio Trabalhar. https://www.fermenta.org/pt/
All Hands Boatworks. https://www.guidestar.org/profile/80-0927982
COM (2020). Mudar a forma como produzimos e consumimos: Novo Plano de Ação para a
Economia Circular mostra o caminho a seguir para uma economia competitiva e neutra em
termos de clima, aberta aos consumidores. https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/pt/ip_20_420?
fbclid=IwAR306g8Eo9kkPGLiXtWINuremU0U69Pt-pSTPhM6ODecHRlylG6-
LtrdPug%252Fsmo
COM (2015). Fechar o ciclo – plano de ação da UE para a economia circular.
https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:8a8ef5e8-99a0-11e5-b3b7-
01aa75ed71a1.0007.02/DOC_1&format=PDF
Expedição Mundo Maker: Laboratório Itinerante. https://fundacaotelefonicavivo.org.br/imprensa/expedicao-mundomaker_para-leva-
laboratorio-itinerante-de-criacao-mao-na-massa-de-sao-paulo-ao-para-estimulando-a-
aprendizagem-criativa-em-diversas-instituicoes-de-ensino/
FABCITY (2018). Fab City Manifesto. https://fab.city/uploads/Manifesto.pdf
MPP (2018). MIT Portugal Program: Digital Transformation in Manufacturing.
https://www.mitportugal.org/research/research-areas/digital-transformation-in-
manufacturing
Rede Design Possível. http://www.designpossivel.org/sitedp/sobre/
St. Elmo Village. https://stelmovillage.org/who-we-are-2/
UN (2021). Digital Cooperation in the Decade of Action.
https://sdgs.un.org/events/special-event-digital-cooperation-decade-action-32704
URBANM (2017). Urban Manufacturing – Stimulating Innovation Through Collaborative
Maker Spaces. https://www.interregeurope.eu/urbanm/
.
6.6. Mudanças nas práticas
(Eduardo Altafim, Vanja Favetta, 2021)
Nos últimos anos estamos a presenciar uma mudança radical na forma de se produzir e de se consumir. O poder de produção e distribuição que, desde a revolução industrial, esteve sob domínio dos detentores dos meios de produção começa a ser descentralizado e chega ao nível dos indivíduos. Percebe-se com isso que o advento da tecnologia (internet, novos media, impressão 3D, laser cutters, crypto-moedas) facilitou a comunicação entre os indivíduos, democratizou a produção e a difusão e acabou por revolucionar a lógica de produção e consumo. Percebe-se que podemos segmentar esse processo em relação à escala de impacto, do maior para o menor: os Estados, as pequenas e médias empresas, as cooperativas e os indivíduos. Estes últimos até o final do século passado eram denominados “consumidores”. Entretanto são esses indivíduos que, unidos, partilham saberes e estão empoderados pelas novas tecnologias, permitindo-lhes assumir o papel de criadores e consumidores ao mesmo tempo.
Essas inversões nas estruturas de poder (como por exemplo na lógica por detrás das crypto-moedas) abalaram as estruturas das grandes organizações – afinal a criatividade e produção de valor simbólico não estava mais dentro de suas fronteiras. Portanto, essas grandes organizações começam a implementar mudanças nos seus processos para replicar a tendência de co-criação em dois níveis: horizontal no que se refere às áreas internas da empresa e Vertical na relação com seus públicos (shared design, co-creation). As criações desses indivíduos têm forte valor simbólico e carregam as suas identidades e, quando em conjunto, traduzem as reais necessidades emergentes da comunidade e impactam positivamente os ambientes nos quais estão inseridos (principalmente cidades). Nesse sentido assistimos a uma inversão das hierarquias.
Os makerspaces também são realidade em Portugal e corroboram o facto de que a sua incidência não se encerra apenas em grandes centros urbanos, mas também em áreas mais periféricas. Este tópico tem como objetivo analisar a tendência a partir do que já foi coligido em uma revisão bibliográfica/estado da arte da qual se destacam Harnecker et al., Keltie, Panuwatwanich, Loeffer e Derr et al. Com base nesses autores procura-se articular os conceitos que tangem às dinâmicas das manufacturas culturais.
Para tratar das manufacturas culturais há que ter em conta a democratização da produção e do consumo graças às novas tecnologias introduzidas nas mais diversas geografias com o advento da globalização. Mesmo que variável, o impacto dessas tecnologias demonstra a importância dos participantes de uma comunidade em trabalhar fora de uma hierarquia, tornando a descentralização do poder uma realidade (Harnecker et al., 2019). Para ilustrar, pode-se considerar Keltie (2017) como exemplo de como este aspecto se articula na indústria cultural:
“Participatory culture practices such as digital storytelling and Web series enable audiences to share their own stories and add to the spectrum of representations made possible by digital technology in the broader cultural landscape. These alternative sites of storytelling are disrupting industry practice by providing alternative content for consumers. Participatory culture and media convergence are markers of a transition period: it may well be that this evolving industry will see the end of older media business models and a shift in production and distribution methods. In a converged media landscape, periphery and marginal content may exist alongside the products produced by the culture industry” (Keltie 2017, p. 119).
A procura colaborativa para alcançar objetivos criativos e sanar necessidades é visível tanto na esfera individual quanto também nas pequenas e grandes organizações. Os fab-labs e maker-faires apresentam indícios de uma mudança definitiva de mentalidade que é baseada na noção da interdependência e autonomia. As grandes empresas começam a se inspirar nas práticas dos indivíduos e pequenas empresas e começam a incorporar estas práticas como comportamento empresarial. No caso vislumbra valor em mudar as dinâmicas produtivas e de consumo tradicionais, introduzindo práticas de co-criação com o seu público-alvo (ex. co-design para projetos de produto).
Tais práticas também se expandem para fora das organizações e percebe-se uma intenção em co-criar caminhos e colaborar com soluções open-source para influenciar o mercado num sentido que seja melhor para todos. Panuwatwanich, na 10ª Conferência Internacional sobre Engenharia, Projetos e Gestão da Produção de 2019, chega a estas conclusões quando defende que a resolução de problemas complexos envolve a aplicação de conhecimentos interdisciplinares para lidar com a heterogeneidade dos vários elementos inerentes ao sistema.
Por fim, essas mudanças chegam ao nível das entidades estatais e governativas, as quais, impulsionadas pelas novas necessidades, estão procurando soluções partilhadas, de acordo com Loeffer (2021), especialmente nos âmbitos dos serviços públicos, como a saúde, a assistência social e a segurança:
“[…] with the emergence of the COVID-19 crisis in January 2020, there has come increasing awareness that this crisis cannot be solved by governments alone and that more effective citizen co-production is a ‘must-have’ to achieve better quality of life outcomes and public governance. It is to be hoped that this crisis, for all of the sadnesses which come with it, will therefore bring a widespread recognition of how citizen co-production can make this world a safer and better place” (Loeffer, 2021, p. vii)
O circuito todo se completa quando estas mesmas entidades e governos passam a ver valor e estimular a liderança comunitária com base em diferentes necessidades e objetivos locais uma vez que “são parte central no estabelecimento de autênticos programas que possam contribuir com uma mudança duradoura na comunidade” (Derr & Chawla & Mintzer, 2018, p. 14). Percebemos, portanto, que a deslocação do poder se reflete nas práticas sociais, empresariais e estatais. Para as duas últimas é possível salientar uma intenção de retomada da centralização do poder ao absorver práticas maker para “industrializar” produtos e parcerias e fomentar lideranças locais.
Referências e Fontes:
Cepiku, D. & Marsilio, M. & Sicilia, M. & Vainieri, M. (2021). The Co-production of Public Services: Management and Evaluation. Palgrave Macmillan.
Derr, C. & Mintzer (2018). Placemaking with Children and Youth: Participatory Practices for Planning Sustainable Communities. New York: New Village Press.
Harnecker, M., Bartolomé, J., López, N. (2019). Planning from Below: A Decentralized Participatory Planning Proposal. New York: Monthly Review Press.
Keltie, E. (2017). The Culture Industry and Participatory Audiences
DOI 10.1007/978-3-319-49028-1_6
Loeffler, E. (2021). Co-Production of Public Services and Outcomes. Glasgow: Palgrave Macmillan.
Panuwatwanich, K. & Ko, C. (2020). The 10th International Conference on Engineering, Project, and Production Management. Singapore: Springer.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Fase 1 – Coolhunting” open=”no”]
Sinais Cool e Criativos
Programa Bairro Feliz
(análise de Érica Monteiro, Margarida Simões, Tatiana Abrahão, 2021)
Descrição: A rede de supermercados Pingo Doce criou a iniciativa Bairro feliz para apoiar com até 1.000€ uma causa escolhida pela comunidade local da loja, para tornar o bairro mais feliz nas seguintes áreas: saúde, bem-estar e desporto; apoio social e cidadania; cultura e património, turismo e lazer; educação e ambiente, e causa animal.
Natureza Cool: É atual: lançamento em 05 de maio de 2021; É relevante e irreverente por incentivar a vizinhança a mobilizar-se para a melhoria da comunidade; Gera curiosidade dos moradores e reforça o envolvimento do Pingo Doce nas comunidades locais; O potencial de crescimento surge frente à crise econômica mundial e a demanda por estabelecer conexão entre marcas e comunidade local; É disruptiva no momento que promove um impacto positivo na comunidade onde se insere as lojas da rede de retalho.
Adidas MakerLab (Singapura, NY)
(análise de Érica Monteiro, Margarida Simões, Tatiana Abrahão, 2021)
Descrição: A loja trabalha com o conceito “cultura maker” onde estão disponíveis para os consumidores a personalização de peças de roupas esportivas da marca, variando de impressão a quente, impressão direta e patches de bordado. Além disso, a fabricante convida artistas locais para a criação de novos produtos e designs. Há ainda um espaço chamado “Adidas’s Runners”, para workshops virtuais e eventos gratuitos para membros do programa de fidelidade do Creators Club da marca. Na loja asiática, inclui uma masterclass de futebol do esportista Fandi Ahmad. A decoração da loja é feita para exposição de artistas locais.
Natureza Cool: É relevante para os usuários que queiram customizar um produto da marca e para os artistas locais que podem divulgar seus trabalhos nas lojas de alta circulação. Tem potencial de ganhar escala em outros mercados, já que a empresa é multinacional. É atual: inaugurado em abril de 2021. É irreverente e instigante já que une ideias de “faça você mesmo” com a colaboração de artistas locais no compartilhamento de seus ofícios. É disruptiva já que a marca Adidas está dividindo seu espaço e colaborando com os artistas locais. A Adidas aposta em modelos de inovação aberta (descentralizado), na colaboração (parceria local) e na cultura maker.
#neweuropeanbauhaus
(análise de Eduardo Altafim, Vanja Favetta, 2021)
A “New European Bauhaus” é um dos mais recentes projetos da União Europeia, que visa concretizar os propósitos do European Green Deal envolvendo diretamente a participação dos cidadãos. Configura-se como uma iniciativa criativa e interdisciplinar que se coloca na conexão entre arte, cultura, inclusão social, ciência e tecnologia, exortando todos os europeus a propor as próprias ideias e submeter os próprios projetos que miram a construir uma Europa mais sustentável e inclusiva, podendo eles ganhar apoio financeiro direto e aproveitando das interligações entre profissionais de diferentes setores que a plataforma incentiva. O projeto configura-se como extremamente interessante, uma vez que, como visto nas seções anteriores do presente trabalho, Estados e entidades supranacionais visam cada vez mais procurar soluções co-participadas entre os próprios Estados e entre Estados e cidadãos. O projeto apresenta-se relevante e atual também em relação aos temas de sustentabilidade e de capacitação dos indivíduos. A “New European Bauhaus” é um dos mais recentes projetos da União Europeia, que visa concretizar os propósitos do European Green Deal envolvendo diretamente a participação dos cidadãos. Configura-se como uma iniciativa criativa e interdisciplinar que se coloca na conexão entre arte, cultura, inclusão social, ciência e tecnologia, exortando todos os europeus a propor as próprias ideias e submeter os próprios projetos que miram a construir uma Europa mais sustentável e inclusiva, podendo eles ganhar apoio financeiro direto e aproveitando das interligações entre profissionais de diferentes setores que a plataforma incentiva. O projeto configura-se como extremamente interessante, uma vez que, como visto nas seções anteriores do presente trabalho, Estados e entidades supranacionais visam cada vez mais procurar soluções co-participadas entre os próprios Estados e entre Estados e cidadãos. O projeto apresenta-se relevante e atual também em relação aos temas de sustentabilidade e de capacitação dos indivíduos.
Magic Bus – Makerspace móvel para crianças
(análise de Júlia Rocha, Ni Min, 2021)
A ideia de reciclar um ônibus escolar antigo e transformá-lo em um makerspace para crianças é relevante, por alguns motivos: reflete a mentalidade de economia sustentável ao dar uma nova utilidade ao ônibus; promove o espírito de criação e colaboração entre “makers” e “designers” para tangibilizar um novo projeto; fomenta o desenvolvimento da comunidade local através de um espaço dedicado à educação “maker” para crianças. É viral, porque é uma ideia com um propósito interessante que tem potencial de ser reproduzida por “makers” de outros lugares em outros ônibus ou veículos maiores. É atual, porque aconteceu há um ano e meio. É irreverente, porque é inovador à medida que une a mentalidade de reciclagem criativa através da transformação artística e funcional do ônibus com a de uma educação que promova o desenvolvimento dessas mesmas habilidades em crianças. É instigante, porque gera curiosidade em ver o processo de transformação do ônibus e como ele será utilizado pelas crianças depois. Contém em si uma proposta de descontinuidade ao demonstrar o crescimento do interesse pela cultura do “criar/fazer em conjunto” através da reciclagem de um veículo para transformá-lo em um espaço que promova o mesmo mindset para crianças.
INEDIT Project
(análise de Andressa Maia, Isabel Gomes, Maria Frederico, 2021)
Descrição: O INEDIT é um projeto que pretende criar uma iniciativa europeia aberta de um ecossistema do fazer coletivo para a co-criação sustentável de móveis. Segundo texto de apresentação, a iniciativa pretende demonstrar por meio da sua plataforma dupla – digital e física – a potencial inovação em torno de uma manufatura social e no interior de uma economia circular, construindo designs globalmente e produzindo localmente.
Natureza Cool: Podemos considerar este sinal como cool, devido: a sua relevância, estando engajado com diversos conceitos de uma mentalidade atual e colaborativa; Nesta proposta o consumidor imagina e co-desenha o móvel que deseja, recebendo feedback da comunidade e de profissionais, a partir de aprovado o design da mobília é encaminhado a um produtor local para fabricação, criando uma cadeia de valor, criatividade e produção ética. Este sinal é também irreverente propondo um novo modelo de produção que é ao mesmo tempo global e local, desenvolvendo valor e engajando o consumidor no processo de criação do seu móvel, estimulando a criatividade e inspirando novas ideias e modelos, apoiados também em um pilar de personalização. É instigante, rompendo com o padrão vigente de produção: industrializado, centralizado e uniformizado e propondo um novo modelo, descentralizado e comunitário de criação. A mentalidade por trás deste sinal tem grande potencial de replicação e extensão, podendo vir a ser viral. Criando comunidades de criadores e produtores autogeridos e auto suficientes, estabelecendo um novo modelo de manufatura cultural. E finalmente podemos perceber uma proposta de descontinuidade, o objetivo do projeto é impactar a cadeia produtiva em diversos níveis, de forma a estabelecer uma nova abordagem do fazer coletivo, de modelos de negócio, e do uso da tecnologia em uma produção mais consciente e humana, focada em atender necessidades e criar novos
produtos.
Insight: Em um mundo cada dia mais global e urbano é importante aliar o local e o global criando novas formas de produção que dialoguem com ambas demandas. Estas demandas tendem a ir de encontro a uma produção mais humana e ética, comprometida com a economia circular e o fazer coletivo de forma comunitária e inovadora. Aqui os consumidores convertem-se cada dia mais em prosumers, procurando oportunidades que os permitam conjugar consumo e produção..
RUTE
(análise de Amanda Melo, Luísa D. Cortés, 2021)
Descrição: Instruções para construir um kit de educação maker. Kits prontos costumam custar entre U$100 e U$300, com valores acima de U$2.000 para escolas. Com as informações do site, é possível montar um kit como esse a partir de sucata e algumas poucas peças compradas, com valores entre R$6 e R$32 (o equivalente, hoje, a U$1,16 e U$6,19, respectivamente).
Natureza Cool: A iniciativa é relevante, irreverente, atual e com uma proposta de continuidade por apresentar uma solução para o problema da falta de acesso ao ensino de qualidade, especialmente quando esse ensino envolve práticas alternativas, como a aprendizagem voltada a projetos. Ela é viral devido à sua natureza democratizante.
Insights: A cultura maker e sistemas de cocriação colaborativos devem ser acessados por todos. É preciso simplificar os meios necessários para a realização desses projetos e seu acesso.
Making Education Makers at Home
(análise de Amanda Melo, Luísa D. Cortés, 2021)
Descrição: A FabSchool abriu uma chamada para que educadores, makers, designers e qualquer pessoa interessada disponibilizasse o arquivo aberto de seu projeto. A plataforma abriga todos os projetos enviados, que podem ser utilizados gratuitamente para projetos educativos, especialmente aos alunos com aulas à distância, em contexto da pandemia de Covid-19.
Natureza Cool: A iniciativa é viral, pois há um alto teor de replicação da mentalidade open source, como é possível observar em outros sinais cool deste relatório. Ela é atual e relevante, pois utiliza-se dessa mentalidade para solucionar um problema recente: a educação no contexto da pandemia e das aulas remotas. É irreverente, instigante e traz uma proposta de descontinuidade, pois democratiza a cultura maker na educação, possibilitando a mais pessoas o acesso a práticas alternativas de aprendizagem, o que possibilita mudanças sociais profundas a longo prazo.
Insights: A educação não deve ser entendida apenas no ambiente escolar e de responsabilidade dos educadores, mas deve abranger e estar em sintonia com as inovações presentes na sociedade. O modelo pedagógico conteudista não é o único possível, e cada vez mais iniciativas têm surgido com propostas de aprendizado por projetos. A pandemia nos fez pensar novos modelos educativos em meio ao ambiente digital.
Camiseta Simples – A primeira T-shirt comprada através de assinatura anual
(análise de Eduardo Altafim, Vanja Favetta, 2021)
Descrição: “Camiseta Simples” é a última ideia vanguardista em perspectiva sustentável da marca brasileira de roupa “Reserva”, já conhecida por ser a única marca de moda da América Latina a possuir o certificado BCI (Better Cotton Iniciative), que estimula a produção sustentável de algodão. Trata-se de uma coleção de T-shirts que é comprada através de uma assinatura anual e inserida dentro de um ciclo 100% sustentável: ao aderir à assinatura, o comprador terá direito a três camisetas por ano, uma no ato da compra, e as outras a cada 5 meses, além do mesmo valor em cashback a cada mês para novas compras. Ao final do ciclo de cada camiseta, a mesma é devolvida para a Reserva, que vai reciclar a peça e torná-la num novo produto, eliminando qualquer desperdício de tecido.
Natureza Cool e Insights: Com esta coleção, a Reserva pretende introduzir uma nova ideia de consumo de roupa, em linha com as expectativas do seu público, pois a ideia foi desenvolvida a partir de uma pesquisa que envolveu 3 milhões de clientes e seguidores das suas redes sociais.
Máscaras biodegradáveis que podem virar flor no seu quintal
(análise de Andressa Maia, Isabel Gomes, Maria Frederico, 2021)
Descrição: Concebido e realizado em Utrecht, Países Baixos, a marca Marie Bee Bloom, da designer gráfica Marianne de Groot-Pons que afirma “também poluir a terra com os seus desenhos para impressões e embalagens, por isso quer fazer algo pela a terra. Ao mesmo tempo, quer trazer de novo à ribalta o tema “roaming e afundamento do plástico descartável e a sua proibição a partir de 1 de Julho de 2021”. Depois de ter tropeçado durante semanas sobre todas as máscaras descartáveis azuis na rua, acordei uma manhã com a ideia de uma máscara biodegradável com sementes de flores no interior. Terra feliz, abelhas felizes, natureza feliz, pessoas felizes. Vendo a máscara com o nome de Marie Bee Bloom. Bloom para o mundo!” (Marianne de Groot-Pons).
Pode ser plantada para trazer flores para o seu jardim. Isto é possível graças às sementes de flores incorporadas no acessório original. A máscara é feita de papel de arroz e contém sementes de
flores. As suas tiras são feitas de pura lã de ovelha. Até a cola utilizada para fixar certas partes é feita com amido de batata e água. Permite ao mesmo tempo ser um fertilizante orgânico repleto de nutrientes, que pode ser utilizado nos jardins ou em vasos contribuindo assim dar um destino mais correto à quantidade de máscaras que vão para o lixo diariamente. São também mais caras do que as máscaras descartáveis normais. O seu preço é de 3 euros (aproximadamente 3,58 dólares) cada ou, mais precisamente, a partir de 15 euros (ou aproximadamente 17,88 dólares) por cinco máscaras.
Natureza Cool: É relevante, está alinhado com o momento atual em que nos encontramos, está em sintonia com as mentalidades emergentes, age como força de mudança, provocando alterações entre si e nas mentalidades associadas revela novos modos de responder a necessidades atuais. Tem potencial para marcar e ter impacto. Está na Média.
É viral, está a gerar um buzz e uma corrida ao site e entrevistas nos jornais. Tem um índice de contágio elevado, pelo seu caráter “inovador”, O caráter inovador das máscaras poderem ser biodegradáveis ocorre motivado pelo desenvolvimento de um produto e que, resultará num outro permite a sua utilização como fertilizante, tornam jardins mais floridos, que certamente impactará nas redes sociais e nos próprios locais, na melhoria do conforto e na qualidade dos espaços urbanos, oferecendo material de cor, textura, movimento e perfume à população urbana, contribuindo assim o equilíbrio psicofisiológico dos citadinos no seu recreio e lazer.
É atual e irreverente. Faz parte dos tempos atuais, existem de todas as cores e texturas, grandes marcas internacionais criaram os seus próprios modelos, estes processos têm-se tornado mais dinâmicos, as máscaras faciais fazem agora parte da nossa vida quotidiana e são susceptíveis de permanecer assim durante meses, senão anos, por esta razão através da observação da sociedade, podemos encontrar indícios de mudanças e comportamentos e de mentalidades emergentes que sustentem a implementação de novos conceitos, produtos, serviços como exemplo as máscaras biodegradáveis.
Apresenta em si uma proposta de descontinuidade, propondo novos significados e
funções para as máscaras faciais.
Insight: Como já mencionado, carrega em si uma proposta de descontinuidade com o fim da pandemia, mas ficam os jardins a florescer, desfrutando das flores e das abelhas felizes e uma mensagem feliz: Plante a sua máscara no jardim ou num vaso de flores; Use-o da forma correta, manuseie-a com cuidado; NÃO é plástico! Não sabemos se as máscaras biodegradáveis vão alcançar o mainstream, seguindo o percurso de difusão. No entanto, fica claro que se trata de uma manifestação de tendência e um sinal cool, alinhado ao espírito do nosso tempo.
The Tales of Courage and Kindness Story Collection – Disney
(análise de Andressa Maia, Isabel Gomes, Maria Frederico, 2021)
Descrição: A coleção “Contos sobre Coragem e Gentileza” consiste no lançamento de 14 novos contos para as princesas da Disney, na forma de uma coletânea digital e gratuita. O projeto tem uma pretensão global desde a escolha de autores e ilustradores de diversos países para criação das estórias, como também de crianças que representam os personagens. Os contos baseados em princesas da Disney se ancoram nas histórias de 14 crianças que demonstraram coragem e gentileza em suas vidas, impactando todos ao seu redor. Cada estória te convida ao final a conhecer estas crianças e a pensar como as ações de cada indivíduo podem impactar a sua comunidade.
A natureza cool deste sinal pode ser percebida na própria proposta de mudança e adaptação de histórias clássicas da marca. Em um mundo que revê constantemente seus valores e repositórios se vê necessária a recriação de narrativas que se alinhem melhor com os desejos e padrões de comportamento atuais. Neste caso as estórias se utilizam também de um grau de personalização, se ancorando em narrativas reais e corporificadas de origens culturais diversas. O sinal se mostra extremamente atual e relevante, ecoando expressivas demandas em ascensão, propondo novas formas de interagir e se relacionar com as princesas e contos de fada. Tem potencial de viralização, o conteúdo de alta capilaridade somado a distribuição digital e gratuita tornam o objeto acessível e facilmente partilhável. Apresenta descontinuidade em forma, conteúdo e apresentação, desenvolvendo uma nova experiência de engajamento com a literatura de fantasia da Disney. E é também irreverente e instigante, rompe com os padrões estabelecidos e possui características atrativas e inspiradoras, interagindo com o público a partir de perguntas e propostas de ação a cada leitor.
Insight: A personalização de estórias e narrativas se torna cada vez mais um índice de grande importância para criação de narrativas, estas parecem ganhar mais corpo, poder de engajamento e interatividade com seu público ao se ancorar à vivências individuais e corporificadas.
Outdoor Studio de Yoga
(análise de Amanda Melo, Luísa Cortés, 2021)
Descrição: Aulas de yoga e fitness feitas ao ar livre, porém dentro de cúpulas individuais e transparentes nas quais as temperaturas excedem 100 graus Fahrenheit (para assistir ao vídeo das aulas acesse https://youtu.be/e_4M1OtAELc).
Natureza Cool: A pandemia trouxe fortes mudanças no nosso estilo de vida, tanto na nossa rotina diária, quanto na rotina de muitos profissionais que tiveram as suas atividades suspensas. Com o medo do vírus e toda a instabilidade emocional que ele trouxe, as pessoas procuram aliar o seu bem-estar com um sentimento de segurança em relação a sua saúde. Com isso, os espaços outside foram valorizados, bem como atividades que proporcionam o melhor para a mente e o corpo em um ambiente livre do vírus, pois ao mesmo tempo que o contato com a natureza é fundamental, o distanciamento entre as pessoas ainda é primordial. Totalmente adaptado ao novo mundo que foi redesenhado, o sinal é atual, pois teve início em 2020, e relevante ao conseguir unir tudo que é necessário nesta nova realidade, sendo assim, também é viral e responde à toda descontinuidade necessária para uma sociedade saudável no corpo e mente. A estrutura física do sinal é instigante e irreverente ao provocar os limites entre a liberdade de estar em um ambiente externo e ao mesmo tempo totalmente recluso em uma cúpula sem contato físico com nada e ninguém.
Insight: O consumidor está em busca de saúde e de uma qualidade de vida aliada a uma experiência que lhe proporcione contato com o ambiente exterior. No atual mundo pandêmico, a criatividade se faz necessária para unir em uma mesma experiência a aproximação com o meio ambiente e o distanciamento social.
Projeto “Now Upon a Time”
(análise de Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques, 2020)
Fonte: Springwise. Acesso em 5 mar 2020.
Descrição: O projeto usa tramas originais de contos de fadas, mas muda detalhes para apresentar personagens femininas mais fortes e modelos mais positivos para meninos e meninas. A agência norte-americana The Martin Agency refaz as histórias e produzem novas versões visuais on-line, podcasts e audiolivros gratuitamente.
Natureza Cool: Ao revisitar histórias infantis e nos colocar em contacto com a nostalgia, essas narrativas são repensadas para melhor servir e inspirar o público infantil. Sabendo que os contos de fadas são fortemente estereotipados pelas questões de gênero, onde a mulher indefesa deve ser salva e o homem é sempre ativo e deve prover um resgate, o projeto chega para desconstruir esses padrões e iniciar um nova geração com outra perspectiva ligada ao seu desenvolvimento pessoal e não aliada ao seu gênero. Observamos que as narrativas que envolvem a desconstrução do estereótipo de gênero já estão sendo muito mais abordadas nos livros, álbuns de música, podcasts e em propagandas publicitárias. Reinventar histórias que estão em nossa memória e ressignificá-las é uma ótima maneira de não propagar questões limitadoras ligadas ao gênero.
Insight: Histórias e crenças que são impostas desde a infância estão a cair por terra quando temos criadores de narrativas empenhados em desconstruir qualquer estereótipo ligado a raça, gênero e orientação sexual.
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#AsianBeauty
(análise de Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques, 2020)
Fonte: Twitter. Acesso em 18 março 2020.
Descrição: Anteriormente utilizada para sexualizar corpos asiáticos, a #AsianBeauty entrou para os Trending Topics do Twitter no dia 16 de março ao ser ressignificada pelos usuários como forma de reafirmação da identidade asiática.
Natureza Cool: Usa as redes sociais para uma campanha que traz a identidade como fator principal e ajuda a combater um estereótipo ligado às mulheres asiáticas. Ressignifica uma hashtag e a coloca como um meio de capacitar as mulheres asiáticas a partir de sua própria identidade.
Insight: Retratar assuntos como preconceito racial, objetificação e aceitação para ressignificar e se apropriar da hashtag com uma conotação positiva é também um meio de relembrar as origens e ascendências.
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The Meet Vincent van Gogh Experience
(análise de Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques, 2020)
Fonte: Meet Vincent van Gogh Experience. Acesso em 20 março 2020.
Descrição: O Van Gogh Museum traz uma experiência multissensorial das obras mais importantes de Van Gogh. As actividades sensoriais permitem sentir e tocar em elementos da vida do artista, como puxar uma cadeira e sentar-se à mesa ou subir ao monte de feno, em Arles. A exposição reúne obras do grande pintor de uma forma inovadora, visto que é possível interagir com as obras de arte expostas.
Natureza Cool e Insight: Ao alinhar narrativas experienciadas com obras de arte, o museu quebra um estereótipo de ser um lugar somente para observação. Nesse caso, o museu é um lugar onde é possível tocar, sentir, senta-se à mesa e interagir com grandes obras da pintura. Proporcionando, assim, experiência, curiosidade e interesse de uma maneira diferente quando relacionada a uma exposição de artes plásticas.
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Festival – “Eu Fico em Casa”
(análise de Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques, 2020)
Fonte: Instagram. Acesso em: 17 março 2020.
Um festival via múltiplas plataformas online, criado em tempos de pandemia, onde diversos músicos portugueses uniram-se em um projeto musical virtual feito a partir de suas casas para o público que assistia também de suas respectivas residências.
Natureza Cool e Insight: Com a impossibilidade de sair de casa por conta de uma pandemia, músicos tornam shows acessíveis transmitidos via redes sociais para entreter o público. Mesmo em tempos difíceis, a arte toma protagonismo ao oferecer projetos culturais gratuitamente para espectadores em suas casas. Muitos festivais surgiram a partir dessa ideia. Abrangendo outras formas de expressão, além da música. Vê-se um movimento grande nos vídeos em direto nas redes sociais para levar entretenimento a quem está isolado em suas casas. Sem poder reunir multidões em festivais artísticos, a cena criou um festival online que consegue conectar virtualmente pessoas e promover um momento de lazer no meio de uma grande crise. A conexão entre artista e público ficou mais próximo, já que a interação online acontece muito mais e melhor do que quando um artista apresenta-se de cima de um palco. Mas não são só pontos positivos, a questão enfraquece a artistas e trabalhadores técnicos como roadies, técnicos de som e iluminação, por ser um modelo pouco sustentável economicamente, já que as lives estão acontecendo de maneira gratuita.
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O hiper-realismo de Filipe Custic
(análise de Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos, 2020)
Fonte: Instagram.
Descrição: O corpo da obra do artista plástico multidisciplinar espanhol-sérvio de 26 anos, utiliza-se do hiper-realismo para explorar a fisicalidade do corpo humano através de diversas plataformas como instalações, esculturas, fotografia e artes digitais.
Natureza Cool: O trabalho de Filip salta aos olhos e causa estranheza ao retratar o corpo humano de forma não convencional, trazendo uma nova estética transhumana ainda pouco explorada. Nos incita a desafiar os limites do próprio corpo e sua materialidade e as diversas formas possíveis de representação de nossas identidades através dele. As obras do artista dialogam com a crescente necessidade do indivíduo de expressar sua identidade além da condição humana física, com a liberdade de não se enquadrar em nenhuma categoria já estabelecida, criando seus próprios códigos, reforçado pela avanço da tecnologia, que permite uma nova visão do EU pós-humano.
Insight: Marcas e instituições devem estar atentas às novas representações de identidade, que vão muitas vezes além da materialidade do próprio corpo, entendendo que as categorizações já hoje pré-estabelecidas não são mais suficientes. Vale reforçar o uso da tecnologia para expressão destas novas identidades.
.Inovação e Diversidade: a poderosa combinação por trás da nova formação da Barbie
(análise de Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos, 2020)
Fontes: Barbie Mattel; Forbes.
Descrição: Uma nova linha de bonecas Barbie acaba de ser lançada reforçando-a como a boneca mais diversificada do mundo. Nesta edição esportistas profissionais são transformadas em modelos e são homenageadas no Dia Internacional da Mulher.
Natureza Cool: O sinal se torna cool por ser uma iniciativa que diz respeito à quebra de estereótipos e raças, não há um padrão de pele ou cabelo. Assim criam novas maneiras de ajudar as crianças a aprender a desafiar os estereótipos de gênero. As bonecas se apresentam com características externas diferentes das Barbies mais populares, a exemplo da boneca negra inspirada na atleta britânica Dina Asher Smith. A ação do fabricante, lançando produtos diferentes dos habituais inspira por se constatar uma adaptação a resposta das necessidades de várias meninas, pois ao alargar o olhar até a posição daquelas que por algum motivo não se sentem representadas, o fabricante também acaba se aproximando tanto do público mirim quanto dos seus pais.
Visto que hoje se busca um mundo cada vez mais igualitário onde todos possam ter os mesmo direitos, existe um grande potencial de crescimento nesta ação, uma vez que estas modelos atuarão como fontes de motivação para que meninas se vejam em mulheres de sucesso e possam inspirar-se a lutar pelos seus sonhos.
Insight: Mais empresas e marcas precisam desenvolver ações como esta, que além de homenagear pessoas que lutaram e se dedicaram para alcançar um objetivo, ao criar uma linha que saem do padrão ortodoxo, transportam-se do seu status para dialogar com minorias, mostrando-se assim mais próximas delas e compreensiva às suas necessidades.
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Consubstantiation : um Drag show somático e pós-mimético por Dinis Machado (análise de Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos, 2020)
Fonte: http://www.dinismachado.com/consubstaciation.html
Deslocando-se de uma perspectiva de género e de identidade sexual binários, a performance desenvolve-se a partir da criação de um imaginário de “um espaço entre”, tanto sexual como de género, e da sua personificação: um corpo humano que se aproxima de um género-objecto. Por se tratar de uma performance disruptiva, a estranheza das características da apresentação como a utilização de formas geométricas e outros objetos usados na construção de narrativas identitárias contribuem para um olhar mais “naturalizado” ao que referem-se características pessoais e consequentemente, de identidade de gênero.
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VTREE SOLAR
(análise de Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Equipamento, em forma de árvore, que, através de energia solar, acumula e gera energia eletrónica, com o objectivo de fornecer wifi e bateria a telemóveis. O primeiro dispositivo deste tipo colocado em Portugal foi instalado na Praça do Comércio, em Lisboa, em 2017.
Vtree Solar chama à atenção por, atualmente ser um aparelho de acesso público pouco comum. Não costuma haver nas ruas um dispositivo no qual se pode, gratuitamente, carregar o smartphone a aceder à internet. Para além disso, gera debate acerca da constante necessidade (seja por razões recreativas ou profissionais/académicas) de estarmos ligados ao mundo digital e da importância do uso de energia renovável. O seu potencial de replicação é notável a partir do momento em que o conceito de Vtree Solar já foi posto em prática em várias regiões do Mundo, como por exemplo na Roménia, no Brasil e no Chile.
O conceito de um dispositivo como Vtree Solar faz-nos refletir acerca de questões relacionadas com a sustentabilidade e com a necessidade de estar constantemente ligado ao virtual. Contudo, mantendo sempre uma faceta que remeta para a natureza. Por essa razão, o design do dispositivo assemelha-se a uma árvore e é colocado em locais ao ar livre. Através de Vtree Solar, estes dois universos (a natureza e a tecnologia digital) não são apresentados como opostos. Há uma junção de ambos que permite ao utilizador sentir-se mais chegado à natureza, mesmo enquanto usufrui de um serviço facilitado pela tecnologia digital.
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QSTAMP® – Sensor Alimentar
(análise de Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Site oficial: http://qstamp.io/
Fonte:https://www.publico.pt/2019/11/12/p3/noticia/sensor-para-alimentos-criado-por-portugueses-chega-ao-publico-em-2020-1893395
QStamp® é um sensor criado pela startup portuguesa Mater Dynamics. Através de um formato em autocolante transmite informação sobre a temperatura, a luz e a humidade das embalagens de alimentos, com ajuda da sua aplicação.
QStamp pode considerar-se atrativo porque é inovador, especialmente por se apresentar no combate ao desperdício alimentar. Inspira e simplifica o dia-a-dia do consumidor, enquanto sujeito ativo na tomada de decisões mais conscientes e sustentáveis. Além disso, faz-nos refletir também acerca do tipo de alimentos que consumimos. O formato subtil e discreto de QStamp (um autocolante) apresenta a possibilidade de ser replicado em outros setores diferentes do setor alimentar, como o setor da saúde, por exemplo. Ajudando, assim, à gestão de novos serviços, tratamentos e produtos de outras áreas.
A criação de etiquetas inteligentes aborda questões como a tecnologia, a sustentabilidade e a sociedade. Através da mesma, é possível produzir discursos sobre a importância que a tecnologia representa para a sociedade atual e para a natureza, mais especificamente na luta por um planeta mais sustentável e uma vida mais saudável. Desta forma, através do controlo de vários parâmetros, é possível acompanhar, a cada momento, a evolução do estado do produto através de um simples smartphone.
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INMOTION – RECUPERAÇÃO FÍSICA VIA VIDEOJOGOS
(análise de Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Fonte:https://www.publico.pt/2017/12/13/p3/noticia/os-videojogos-tambem-podem-ser-receitados-pelo-medico-1828970
O projeto InMotion, criado por um grupo de alunos do Instituto Técnico de Lisboa, dedica-se à reabilitação física através do conceito gamification, juntando o conhecimento de três áreas (tecnologia, engenharia e medicina). A recuperação física é feita através de fisioterapia, com exercícios adequados a cada articulação. Para além disso, uma câmara permite medir e monitorizar a evolução do utilizador e enviar estes dados para o médico ou fisioterapeuta, oferecendo um novo índice de avaliação.
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AI GAHAKU
(análise de Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Fonte:https://ai-art.tokyo/en/?fbclid=IwAR2dFoT1EZ9__49AZGVJB4EtgDY6RdxcQyaJi1N1x1wPAnK6ACsJFy72EFE
Homepage do site AI Gahaku, acedido em Abril de 2020
O robot Gahaku de inteligência artificial, criado pelo programador japonês Sato, transforma fotografias submetidas no site, pelos utilizadores, em retratos de séculos passados.
Numa era em que a maioria do processo fotográfico é feito de modo digital ou analógico, retratos pintados à mão são raros. E é exatamente por isso que AI Gahaku é atrativo. Numa época consumida por tantos dispositivos tecnológicos, surge curiosidade em saber como a nossa aparência seria retratada através de uma prática que era mais comum nos séculos pré-digital. É atrativo porque não é comum.
Al Gahaku pode ser inspirador na medida em que tem o poder de gerar uma análise acerca de questões de nostalgia e representação de estéticas mais antigas. Gera debate sobre o porquê de, atualmente, haver uma romantização e curiosidade acerca do antigo, séculos XVI, XVII, etc, especialmente de elementos estéticos e artísticos relacionados com as épocas referidas.
O conceito de AI Gahaku será fácil de viralizar porque pode observar-se um crescente interesse em eras diferentes da História. Neste caso, interesse na estética da arte do passado e na em retratos de pessoas desenhados em telas e pintados com tinta. O interesse por estéticas de décadas passadas continua a existir. Continua presente um fascínio por objetos vintage, retro e antigos, sejam eles referentes aos anos 50 do século XX ou reproduções contemporâneas de feiras medievais.
O ADN criativo de AI Gahaku assenta, essencialmente, em sensações nostálgicas e na possibilidade do regresso a períodos passados. A curiosidade humana é, muitas vezes, estimulada por conceitos pouco comuns e diferentes. A pintura não é uma prática pouco comum nem diferente, mas a conceção de um retrato pintado é, nos dias de hoje, pouco comum. E é isso que suscita interesse. No Mundo de hoje, já conhecemos a aparência de selfies e de fotografias digitais. AI Gahaku tenta reproduzir uma prática pouco utilizada, actualmente. Temos curiosidade em saber como seríamos retratados através de técnicas de pintura respetivas a séculos passados. O potencial de viralização de um conceito como o de AI Gahaku – o interesse em estéticas de eras passadas – é visível através de, por exemplo, o surgimento de aplicações para smartphones que aplicam filtros com pouca definição e com algum pó a fotografias tiradas com dispositivos digitais. Simulando, assim, fotografias analógicas, que, embora não necessariamente um símbolo de épocas antigas, eram mais usadas quando não havia qualquer acesso à tecnologia fotográfica que há actualmente. É quase como houvesse, de certo modo, uma vontade de voltar ao antigamente.
.Boring Phone
Boring Phone
(análise de Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Fonte:https://boringphone.com/
Homepage do site Boring Phone, acedido em Abril de 2020
BoringPhone é um telemóvel smartphone minimalista, que inclui apenas funções consideradas necessárias e úteis. O seu slogan é “O único telemóvel que requer menos do seu tempo”. BoringPhone é isento de funcionalidades consideradas distrativas que possam prejudicar a produtividade do utilizador ou causar-lhe stress e ansiedade provenientes de um constante uso da tecnologia. As funções do BoringPhone incluem chamadas, mensagens, câmera, GPS, podcasts, música, ferramentas úteis, HotSpot (Wi-fi), MP3, calculadora, fotogaleria, bloco de notas, calendário, relógio, rádio, gravador de áudio e lanterna. As funcionalidades não incluídas neste telemóvel são acesso a Emails, Navegador de Pesquisa, Redes Sociais e Loja de Aplicações.
BoringPhone torna-se atrativo porque está fora da expectativa que se tem acerca de um smartphone, não está dentro da norma. É um telemóvel que oferece mais funcionalidades que os primeiros telemóveis que apareceram no mercado. Contudo, por opção, não oferece tantas quanto o modelo actual de telemóvel inteligente. Fá-lo por escolha, está a marcar uma posição. Pode gerar debate em torno de como, actualmente, usamos grande parte do nosso tempo a utilizar dispositivos tecnológicos. Incentiva uma análise acerca do modo como nos servirmos da tecnologia e dos respectivos aparelhos que temos à nossa disposição. Coloca questões como “Quanto tempo passamos, realmente, online?”, “Devemos focar a maioria da nossa atenção no mundo não-virtual? Ou um equilíbrio de ambos?”. No geral, o conceito de BoringPhone coloca em perspetiva o modo como vivemos num mundo tão consumido pela tecnologia. O conceito de BoringPhone até já está a ser adaptado e colocado em prática por outros serviços. Um exemplo é o Hotel Bellora, na Suécia, no qual o valor da estadia varia consoante o uso da internet, por parte do cliente do hotel. A ideia por trás de ambos os projectos, BoringPhone e Hotel Bellora, é a mesma: o incentivo a não usar tanto as redes de tecnologia que estão à nossa disposição, uma desconexão virtual.
ADN por trás do conceito de BoringPhone é incentivar o pouco uso de dispositivos tecnológicos nos quais passamos demasiado tempo simplesmente a scrollar, sem propósito. O conceito de desconexão incentiva a uma utilização do nosso tempo noutras actividades que nos façam estar mais presentes, atentos e focados no próprio momento em que nos encontramos. De certo modo, promove a poupança de saldo e energia (se utilizarmos pouco o telemóvel não é necessário carregá-lo com dinheiro e bateria tão frequentemente). Além de tudo isto, promove também a privacidade, porque não permite acesso a redes, aplicações e sites nos quais, normalmente, se partilham detalhes sobre a vida quotidiana de várias pessoas. O conceito de BoringPhone assenta na desconexão tecnológica e na privacidade.
Esta busca pela privacidade que, nos dias de hoje, parece um conceito longínquo e antiquado, está a ganhar cada vez mais popularidade. É uma ideia que pode ser transferida para outros projectos e objectos. Um exemplo de uma outra manifestação desta microtendência é a “pulseira do silêncio”, uma pulseira que, quando activada, proíbe dispositivos de inteligência artificial como a Alexa e a Siri de recolherem informação. No geral, o ADN de BoringPhone assenta, sobretudo, na desconexão digital, num retorno à privacidade e na boa gestão de tempo pessoal.
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AMAZON GO GROCERY – Just walk out
(análise de Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Site: https://www.amazon.com/b?ie=UTF8&node=20931388011
Fonte: https://www.retailconnections.co.uk/articles/amazon-go-grocery-the-web-giants-first-cashier-less-supermarket/
Alison Clements, Amazong Go Grocery : The Web giant’s first cashier-less supermarket, acedido em Abril de 2020
É uma aplicação baseada na tecnologia de compras e de pagamento móvel. Amazon Go Grocery tem mudado a maneira como as pessoas compram e experienciam as compras em supermercados. A tecnologia de Just Walk Out detecta quando um item é removido ou colocado de volta nas prateleiras, enquanto regista tudo isso num carrinho de compras virtual. Assim que o utilizador terminar de fazer compras pode simplesmente sair da loja. Não tem que esperar em filas ou passar por uma caixa registadora. O pagamento e o recibo serão feitos através da sua conta na plataforma da Amazon.
NATUREZA COOL: A aplicação Just Walk Out torna-se atrativa pois ajuda a gerir e a poupar tempo. A aplicação permite fazer compras no supermercado, sem ter que esperar nas filas das caixas registadoras, para pagar. Just Walk Out possibilita o debate acerca dos prós e dos contras das novas tecnologias (tema que irá estar desenvolvido mais a fundo no sector do Insight). O conceito de Just Walk Out, uma aplicação que permite a automatização de serviços, já está presente noutras áreas e é visível em outros setores, como por exemplo aplicações de bancos e transferência de dinheiro. Aplicações como a MBWay e a Moey permitem que o utilizador realize as funções que pretende através de um simples clique, onde quer que esteja, sem ter que se deslocar. Surgem cada vez mais aplicações que têm a possibilidade de descartar o contacto humano nos mais diversos serviços.
O ADN criativo de Just Walk Out baseia-se numa melhor gestão de tempo e na ajuda a utilizadores que sofram de ansiedade ou de distúrbios anti-sociais. Este tipo de aplicação pode contribuir para a análise acerca dos prós e contras de novas tecnologias cada vez mais assentes na automatização. Uma aplicação como a Just Walk Out pode ser útil e eficaz ao permitir uma melhor gestão do tempo em vidas muito ocupadas e ajudar também quem tem dificuldade em lidar ou em comunicar com outras pessoas, como no caso de distúrbios ou condições mentais relacionadas com a ansiedade. No entanto, pode também ser um tipo de aplicação perigosa, porque se se tornar popular e usada por grande parte da população, contribuirá para o aumento da taxa de desemprego, pois serão cada vez menos os funcionários necessários para o atendimento ao público nas caixas registadoras de determinados supermercados.
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Embalagens de televisores Samsung se transformam em objetos
(análise de Marianna Rosalles, Francisco Mateus, 2020)
https://news.samsung.com/global/samsung-to-introduce-eco-packaging-for-its-lifestyle-tv-lineup
A Samsung criou novas embalagens para sua linha “Lifestyle” de televisores com o intuito de prolongar a vida útil das caixas transformando-as em novos objetos. As caixas “eco-packaging” além de serem feitas a partir de material reciclado, podem se tornar casas de gatos, revisteiro, prateleiras para decodificadores e suportes para controle remoto.
A proposta da Samsung é atrativa uma vez que ressignifica o ciclo de vida das embalagens criando alternativas ao descarte. As caixas trazem uma proposta sustentável que vai além do material de fabricação e repensam a relação do indivíduo com um material de iria para o lixo.
Essa criação é inspiradora uma vez que instiga as empresas a mais do que se preocupar meramente com a reciclagem, pensar em novos destinos para os resíduos para que eles tenham uma função, tornem-se objetos utilitários.
Há um potencial de crescimento uma vez que foi uma iniciativa inovadora que eleva a discussão das embalagens a um outro nível, o de pensar formas de transformá-las de modo que possam ser inseridas na vida das pessoas e não apenas descartadas.
É preciso que as empresas vão adiante em termos de sustentabilidade e não fiquem apenas focadas em seu material mas sim em pensar em como transformar seus resíduos em algo utilitário.
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Disco de vinil feito a partir de plásticos descartados no mar leva a sustentabilidade para a música
(análise de Marianna Rosalles, Francisco Mateus, 2020)
Em 2019 a música “In the Anthropocene” do cantor Nick Mulvey ganhou um vinil de 10mm feito com plásticos descartados no mar da Cornualha. Este é considerado o primeiro LP 100% sustentável do mundo. https://www.youtube.com/watch?v=qBuE-Z_DPwE&feature=emb_title
O vinil contém a música “In The Anthropocene” do artista Nick Mulvey que aborda a questão da preservação ambiental, mas além da parte poética, o disco chama a atenção por ser feito com plástico descartado no mar, mostrando que é possível dar outros fins ao lixo.
Nos faz pensar que é possível dar um ressignificado ao lixo plástico que é descartado muitas vezes de forma incorreta, visto que ele é um material que demora para se decompor e que impacta negativamente o meio ambiente.
O “ocean vinyl” aproveita o crescente mercado de discos de vinil que tem lançado títulos clássicos e novos, alguns deles em edições especiais, em que o disco é prensado em cores diferentes, ao invés do preto padrão. Um disco feito a partir de materiais reciclados chama a atenção dos consumidores de vinil e também dos artistas.As gravadoras e fábricas de discos podem utilizar materiais reciclados como alternativa ao vinil, isso mostraria que o mercado de música física está se adaptando não somente ao consumo digital, mas também a um cenário onde os produtos sustentáveis vêm ganhando cada vez mais importância entre os consumidores.
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Massagem sem contacto humano
(análise de Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes, 2020)
Fonte:https://capsix-robotics.com/
A Capsix Robotics desenvolveu uma nova tecnologia, única no mundo, permitindo o cuidado do corpo com um robô colaborativo! O sistema se adapta à morfologia do paciente e permite uma interação em tempo real.
Com a soma de respostas físicas e mentais causadas pelo estresse, há um desgaste que atinge o corpo humano que é causado por esse processo, que pode até gerar nódulos nos músculos. Esses nódulos podem ser desfeitos ou prevenidos com pressão e toque adequados, sendo o robô massageador de grande atrativo, para além da autonomia, pois pode ser utilizado a qualquer momento sem a necessidade de terceiros com um sistema completamente moldável e independente ao corpo.
O robô massageador possui potencial de replicação pois com a possibilidade de surgimento de outros vírus, o contato humano poderá ficar cada vez mais raro, implicando em soluções que possam atender as demandas de estresse e tensão.
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Roupa com filtro de proteção contra patógenos
(análise de Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes, 2020)
Fonte: https://www.bioscarf.com/
Com o surgimento cada vez mais constante de patógenos, como vírus e bactérias, a Bio Scarf lançou o G95, o primeiro equipamento com tecnologia de filtragem integrada para ajudar na proteção da poluição do ar, alérgenos, bactérias, fumaça, PM2.5 e outros contaminantes transportados pelo ar que podem ser nocivos para a saúde.
É atrativo pela facilidade de obter a proteção contra patógenos e ao mesmo tempo poder. É inspirador porque oferece uma tecnologia incorporada à roupa e descarta o uso de máscara a parte.
Tem potencial de replicação massificado, já que é prevista a chegada de novos vírus no planeta, que forçam mudanças de comportamento e no uso de tecnologias que possam auxiliar na proteção contra esses patógenos.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Fase 1 – Clipping dos Media” open=”no”]
Resultados de Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques (2020)
O resultado da recolha do conteúdo presente nos meios de comunicação para o clipping revela que as macrotendências predominantes são a nostalgia, a experiência e a identidade. A nostalgia e o revivalismo estão bastante presentes na sociedade actual e na vida da população, sendo estas temáticas expressadas em diversos sectores culturais como: cinema, moda, música ou jogos. Por outro lado, a experiência, especificamente, a experiência imersiva, é uma temática e recurso cada vez mais usado, contribuindo como resposta às necessidades e desejos da população/consumidores e possuindo uma importância associada à tecnologia, provocando uma realidade virtual, aumentada, mais realista, apelando a todos os nossos sentidos (multisensação, Experience Economy e VR will Merge Ubiquitously). Para além disso, gera impacto nos negócios, na aplicação empresarial, nas marcas e nos mais diversos sectores profissionais. As narrativas experienciadas, por sua vez, são um tópico bastante abrangente e comum nas notícias e artigos divulgados. A identidade surge como fator de aproximação entre marca e público, ou espaço e consumidor, ao sentir-se parte o espectador sente-se mais confortável para explorar o novo ambiente ou produto. Outro fator também possível de identificar neste macrotema é a identidade própria, de cor, etnia, cultura, posições políticas e gostos pessoais, a identidade como “tribalismo”, que emerge ao sentir-se parte de um grupo, também é presente nas pesquisas registradas até aqui.
Resultados de Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos (2020)
Após a coleta de notícias publicadas nos media nacionais e internacionais, foi possível levantarmos trinta e uma matérias relacionadas a nossa hipótese. Estas notícias foram agrupadas por afinidade e associação das palavras-chaves. Após a análise das reportagens e o seu agrupamento, foi possível chegarmos às seguintes conclusões:
» A temática de transhumanismo não é nova. Porém, ainda aparece com menos presença e muito relacionada às novas tecnologias, com um certo ar de ficção científica, apesar da existência de um movimento e especialistas que chancelam suas teorias;
» Diversas tecnologias e experimentos recentes indicam que a expansão do corpo humano para uma ligação com a máquina ou aprimoramento genéticos serão possíveis em um futuro não tão distante;
» Devido à atual situação da COVID-19, há uma série de matérias que mostram preocupação com as consequências desta crise, com previsões negativas mas também uma visão de esperança e de oportunidade para um novo recomeço.
» Matérias relacionadas com a diversidade de uma forma geral foram as de maior número dentro de nossa hipótese, com destaque para a abordagem do tema no ambiente de trabalho e igualdade de gênero.
» É possível observar de forma menos expressiva questões raciais e LGBT+ em mídias de massa, o que pode indicar a chegada destes temas no mainstream.
» Há indicativos de que questões relacionadas a polarização devem crescer, principalmente no campo político.
Resultados de Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang (2020)
Verifica-se que a maioria das notícias recolhidas abordam os serviços possibilitados pelas novas tecnologias como algo positivo, que pode contribuir para o bem-estar dos indivíduos e para benefício da sociedade. Exemplos disso são as notícias acerca de como o desenvolvimento tecnológico está a impactar positivamente o setor da saúde, e como durante a pandemia de Covid19 várias plataformas online disponibilizaram informação, cultura, arte e entretenimento de maneira a tornar os dias de confinamento ligeiramente melhores e menos aborrecidos, dentro das circunstâncias. No entanto, também existem várias notícias que referem algumas desvantagens do uso, aliás, do mau uso ou do uso excessivo, das novas tecnologias e dos respetivos produtos e serviços disponibilizados por estas.
Resultados de Marianna Rosalles, Francisco Mateus (2020)
O que se nota no clipping é que há cada vez mais programas institucionais que apoiam iniciativas sustentáveis, desde a elaboração de leis, congressos para debater o tema, até bolsas de incentivo para criação de produtos sustentáveis.
No entanto, após a declaração da Pandemia do Covid-19 houve uma mudança no discurso sobre sustentabilidade, a palavra recebeu um novo sentido de utilização e passou a se referir a atividade econômica e social. Para além disso, também surge nos media a discussão dos impactos do isolamento social, estratégia utilizada mundialmente para conter o contágio do vírus, no meio ambiente, como por exemplo a redução da poluição, a limpeza dos canais de Veneza, entre outros.
Há reportagens que afirmam que a pandemia evidenciou o impacto das desigualdades sociais e as consequências da má relação das pessoas com o planeta. A indústria da carne por exemplo foi alvo de críticas e denúncias quanto à insalubridade dos locais de trabalho, que se transformaram em novos focos da covid. O uso consciente da água também foi apontado como algo primordial em períodos de pandemia uma vez que torna-se primordial garantir que todos tenham acesso a ela, principalmente para garantir a higiene adequada. Outra preocupação levantada é com o descarte de lixo, que além de ter se transformado em um vetor de contágio, aumentou significativamente em razão da pandemia.
Resultados de Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes (2020)
Para a realização do clipping foram pesquisadas as seguintes fontes: www.público.pt; www.expresso.pt; www.sabado.pt; www.dn.pt
As reportagens analisadas foram publicadas entre os dias 11 de junho de 2019 e 13 de maio de 2020. Entre os assuntos mais debatidos estão discussões acerca das doenças desencadeadas pelo atual ritmo e sobrecarga de trabalho. Tanto as consequências físicas de atividades repetitivas, quando sintomas ou doenças psíquicas (burnout, ansiedade, tristeza e confusão mental).
O debate sobre o potencial científico do estudo sobre a felicidade, necessidade de atividades físicas ao ar livre e a procura por tratamentos e métodos terapêuticos alternativos, bem como a busca pelo envelhecimento saudável e ativo também ganham espaço nos media.
Em outra vertente, reportagens sobre privacidade (ou a falta dela) dentro do ambiente virtual e como isso impacta na vida e na saúde mental das pessoas também são facilmente encontradas em veículos de comunicação. E aproveitando o momento de pandemia de coronavírus no mundo, algumas reportagens abordam a necessidade de manter a saúde mental em dias para enfrentar o confinamento e sugerem atividades de autocuidado durante a quarentena.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Fase 1 – Análise Audiovisual” open=”no”]Através do website Filmspot teve lugar o levantamento de todos os filmes exibidos nos cinemas de Portugal entre os anos de 2015 e 2019. Neste intervalo temporal, foram considerados 1.860 filmes, destes, 23 eram reposições.
Resultados para a tendência I (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques,2020)
ANO | FILMES (TOTAL) | FILMES (HIPÓTESE) | % |
2015 | 387 | 124 | 32% |
2016 | 267 | 85 | 31,8% |
2017 | 382 | 132 | 34,5% |
2018 | 404 | 157 | 38,9% |
2019 | 404 | 188 | 46,5% |
TOTAL: 37,2% |
Tabela 1: Dados quantitativos que ilustram a representatividade da hipótese 1 nos filmes exibidos nos cinemas de Lisboa entre os anos 2015 e 2019.
Fonte: autoria própria.
A hipótese esteve presente em 686 dos 1844 filmes analisados, exibidos nos cinemas entre os anos 2015 e 2019. Esse número representa 37,2% do total de filmes. É possível notar um aumento relativamente gradual na porcentagem de filmes associados à hipótese: com exceção do intervalo entre os anos de 2015 e 2016, em que o número caiu de 32% para 31,8%, o número de filmes relacionados à hipótese apenas cresceu. O número, em 2017, subiu para 34,5%. Em 2018, aumentou para 38,9% e, em 2019, totalizou 46,5% da totalidade de filmes analisados. Dessa forma, é possível afirmar que a representação da hipótese 1 nos filmes exibidos em Lisboa tem crescido nos últimos 5 anos.
No gráfico abaixo, está ilustrada a quantidade total de filmes analisados, exibidos nos cinemas de Lisboa (barra azul), e, a partir desse número, os filmes relacionados à tendência 1 (barra cinza), separados por ano:
Gráfico 1: Dados quantitativos que ilustram a representatividade da hipótese 1 nos filmes exibidos nos cinemas de Lisboa entre os anos 2015 e 2019.
No gráfico a seguir, apresentamos a relação dos filmes associados à hipótese 1 com as macrotendências que são identificadas nessa hipótese. É importante ressaltar que é possível haver a presença do mesmo filme em mais de uma macrotendência. Por meio do gráfico, pode-se notar a expressividade das Narrativas, que totaliza 63% do total de associações às macrotendências. A seguir, a presença mais expressiva é de Nostalgia, com 16%, seguida Globalização com 8% cada. Urbanização e Tribalismo aparecem, cada uma, em 2%.
Sabemos que, por se tratar de uma forma de narrativa, é natural que o audiovisual esteja relacionado. Levando em conta a maior expressividade dessa tendência, decidimos elaborar um gráfico representando a associação dos filmes.Notamos a presença de outras categorias, resultantes de um padrão, que nos saltaram aos olhos: A primeira, Grandes Narrativas, reflete a grande quantidade de filmes contextualizados em meio a grandes acontecimentos da humanidade, a maioria no século XX, ou que são baseados em discursos amplamente difundidos e conhecidos. Alguns dos exemplos mais identificados são: filmes sobre 1ª Guerra Mundial, 2ª Guerra Mundial, Nazismo, Guerra Fria, Apartheid, Refugiados, Terrorismo, Natal, temas bíblicos, entre outros. A separação dessa categoria de outras, como Nostalgia, fez-se necessária pela diferença na rememoração do passado – enquanto a última relembra de forma necessariamente positiva, com anseio de retornar à época em questão, a temática de Grandes Narrativas não tem esse propósito. Em vez de romantizar o passado, essas narrativas são frequentemente retomadas por ainda influenciarem o modo de se pensar o mundo ocidental contemporâneo, devido ao forte impacto que tiveram na construção das identidades coletivas e na ordem global.
A segunda categoria observada nesta análise é identificada pela grande presença de filmes biográficos ou baseados em fatos reais. Parece-nos importante incluir uma categoria que inclua histórias que foram vividas por pessoas e que, posteriormente, foram adaptadas para o audiovisual. Em relação a esse ponto, também observamos que, geralmente, filmes biográficos ou baseados em fatos reais são históricos ou de época – e, muito raramente, são ambientados na contemporaneidade. Também foi possível identificar filmes feitos a partir de Adaptações de Histórias Clássicas – tanto da forma tradicional, em que a adaptação é feita de forma direta e com o objetivo de se assemelhar ao enredo de um livro ou história, quando por meio de versões inovadoras, que recriam histórias amplamente conhecidas em diferentes contextos ou formatos.
Um aspecto que observamos e que também representa um número expressivo de filmes relacionados são as Identidades. Mesmo a partir das sinopses, é possível notar que temas como raça, gênero, etnia, nacionalidade, sexualidade e religião estão ganhando cada vez mais espaço no cinema.
Por fim, dividimos as categorias Filmes de Época e Filmes Históricos. A separação foi feita por entendermos que, enquanto a primeira categoria é englobada por Nostalgia, a segunda possui um objetivo mais documental e que, assim como Grandes Narrativas, não encara o passado com desejo de voltar para ele. No entanto, alguns acontecimentos da história não encaixam-se em Grandes Narrativas, já que tiveram proporções menores ou já foram superados há muito tempo, como é o caso de guerras civis, monarquias, etc.
15 exemplos ilustrativos: Para ilustrar a pesquisa, foram selecionados 15 filmes que representam alguns dos padrões que observamos ao realizarmos a investigação. Dirigido por Christopher Nolan, Dunkirk (2017) é um exemplo que ilustra a presença de filmes que abordam Grandes Narrativas no cinema – neste caso, a 2ª Guerra Mundial, que representam 17% dos filmes relacionados à hipótese. Outras obras, como Filho de Saul (2016) e O Dia a Seguir (2019) também demonstram a presença desse tipo de narrativa nos cinemas de Lisboa. Um dos músicos pop mais conhecidos nos últimos anos, Elton John tem sua trajetória musical representada em Rocketman (2019). Filmes como este, que que buscam retratar, de forma biográfica, a vida de figuras emblemáticas na sociedade, representam 18% da totalidade de filmes relacionados à hipótese 1. Outros exemplos são: Judy (2019) e Bohemian Rhapsody (2018). Produzido na Índia, Bharat (2019) é um filme que aborda, em um contexto pós-colonial, questões identitárias relacionadas à raça, etnia e nacionalidade. Filmes que tratam de identidades representam 13% da totalidade de títulos relacionados ao tema da hipótese 1. Filmes como Roma (2018), Coco (2017) e Chama-me Pelo Teu Nome (2018) trazem às telas questões relacionadas a classe, culturas e sexualidade. Ambientado nos anos 1960, Era Uma Vez… Em Hollywood (2019) retrata os bastidores da indústria cinematográfica de forma nostálgica e saudosista. Filmes desse tipo, que utilizam o passado como ferramenta de rememoração e memória, representam 23% da soma dos filmes relacionados à hipótese 1. Baseado no clássico livro de mesmo nome, escrito por Rudyard Kipling, O Livro da Selva (2016) é uma adaptação live action da história. O filme representa um padrão identificado nos filmes lançados no cinema que são frutos de adaptações de livros e histórias clássicas. Assim, a obra encaixa-se na categoria “adaptação de história clássica”, que representa 4% da totalidade de filmes relacionados à tendência. Ambientado no século XIX, O Grande Showman (2017) é baseado na história de P. T. Barnum, conhecido como o criador do circo. Além de ser baseado em uma história real, o filme também é de época, justamente por sua ambientação e elementos típicos daquele período. Por isso, a obra faz parte dos 13% que compõem a categoria “filmes de época”. Um clássico tanto do cinema quanto do contexto pop, a saga Star Wars representa um exemplo chave para a tendência “from geek to cool”. Depois de 38 anos do lançamento do primeiro filme da franquia, Star Wars: Episódio VII (2015) foi lançado. Com efeitos especiais atuais, porém com diversas referências e homenagens à trilogia original, o filme mescla tecnologia e universo geek (5%) com nostalgia (23%). Indo no sentido contrário de adaptações que têm como objetivo ilustrar a obra original, Orgulho, Preconceito e Zumbis (2016) adapta o livro clássico do século XIX, de Jane Austen, inserindo elementos pop e atuais, como zumbis. Esse tipo de adaptação mescla a categoria “incontrolavelmente pop” e “adaptação de história clássica”.
Considerações: Dos 1844 filmes exibidos em Lisboa nos últimos 5 anos, 686 deles, que totalizam 37,2%, estão relacionados com a hipótese 1. Quando feita de ano em ano, a análise demonstra que a associação filmes/hipótese passa a ser mais expressiva com o passar do tempo. Por meio da análise, foi possível identificar a expressiva presença da hipótese e do tópico Nostalgia. Também percebe-se um grande número de filmes relacionados a Grandes Narrativas, filmes de época ou históricos, biográficos/baseados em fatos reais e adaptações de histórias clássicas. Por estar fortemente presente nas temáticas dos filmes analisados, acreditamos que essa análise audiovisual tenha grande influência na estrutura da hipótese 1. Por isso, ao identificarmos padrões de repetição dos temas acima mencionados, levantamos a hipótese de possíveis microtendências que relacionam-se com essas características.
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Resultados para a tendência II (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos,2020)
Foram analisados um total de 1751 filmes, articulando os títulos e suas respectivas sinopses à hipótese em questão. Após seleção dos filmes relacionados à hipótese, foi realizada a comparação quantitativa em relação ao total de filmes exibidos por ano e no total destes 5 anos.
2015 | 2016 | 2017 | 2018 | 2019 | TOTAL | |
Filmes exibidos | 294 | 268 | 382 | 404 | 403 | 1751 |
Filmes relacionados à hipótese | 26 | 13 | 27 | 24 | 21 | 111 |
Porcentagem | 9% | 5% | 7% | 6% | 5% | 6% |
Pode-se observar uma certa constância na representação de nossa hipótese dentre os filmes exibidos nos cinemas de Portugal nos últimos 5 anos, com uma maior porcentagem no ano de 2015 (9%) e leve queda nos demais anos até 2019. Quando analisamos o impacto da hipótese em relação ao total de conteúdo produzido em todo o período, vemos a presença desta temática em 6% dos filmes, o que pode significar que há uma representação relevante, porém, ainda emergente entre as produções cinematográficas.Pode-se concluir portanto que a hipótese apresenta impacto significativo no conteúdo produzido, porém foi possível observar uma leve queda ao longo destes 5 anos, sendo necessário a continuação desta observação nos anos seguintes.
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Resultados para a tendência III (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
2015: Total de Estreias: 387; Correlação: 10/387 = 2,58%
2016: Total de Estreias: 268; Correlação: 10/ 268 = 3,73%
2017: Total de Estreias: 382; Correlação: 20/ 382 = 5,24%
2018: Total Estreias : 404; Correlação: 11/404 = 2,72%
2019: Total de Estreias: 404; Correlação: 17/404 = 4,21%
Legenda e Fonte: Relação Exibições e Articulações com a Hipótese. Autoria própria.
Fonte do gráfico: Autoria própria
Nos últimos 5 anos, o pico de filmes relacionados com a Hipótese 3 deu-se em 2017, tendo depois diminuído. Contudo, no ano de 2019 houve uma subida notável. Observa-se que, mesmo que a tecnologia, a inovação e a inteligência artificial não façam parte do núcleo principal do filme, integram-se nele como elementos associados ao quotidiano da vida humana. Embora, em alguns dos casos, não façam parte do seu núcleo principal, afetam todo o enredo. Ou seja, sem a presença do elemento das novas tecnologias, o filme seria completamente diferente.
Após recolha e análise dos filmes relacionados com a Hipótese, lançados em Lisboa, durante os últimos cinco anos, observa-se que os quinze mais representativos da Hipótese focam-se, maioritariamente, no uso da inteligência artificial e como pode afectar a vida das personagens. Nota-se uma inclusão do desenvolvimento tecnológico nos enredos, através do qual se coloca mais ênfase nas suas possíveis consequências negativas, do que positivas.
Observa-se que são mais comuns os temas relacionados com a Hipótese estarem presentes em filmes relacionados com um futuro (distópico, talvez), super desenvolvido em que a sociedade e o planeta funcionam à base da tecnologia, como por exemplo, nos filmes Chappie (2015) e Autómata – O Agente do Futuro (2015).
Embora também tenham sido lançados alguns filmes que retratam o uso das novas tecnologias num panorama mais atual, como por exemplo, no filme Her (2015), Clara e Claire (2019) e Countdown (2019).
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Resultados para a tendência IV (Marianna Rosalles, Francisco Mateus, 2020)
Em 2015 contabilizou-se 40 filmes sobre sustentabilidade, o equivalente a cerca de 10,2% do total de peças analisadas. Já em 2016 houve uma queda no número de produções relacionados à essa tendência, contabilizou-se 19 filmes, o equivalente a 7% das peças em cartaz durante o ano. O ano seguinte registrou um montante ainda menor de filmes com a temática de sustentabilidade, registrou-se 24 títulos, o que corresponde a 6,2% dos lançamentos em 2017. Em 2018 os longa-metragens relacionados à tendência foram verificados em 26 lançamentos, o que corresponde a 6,3% do total.
É possível verificar que a temática da sustentabilidade aparece muitas vezes em filmes do público infantil através de narrativas centradas em personagens do reino animal, que tratem sobre biodiversidade, da relação do homem com a natureza construindo de uma forma lúdica uma conscientização sobre a preservação do planeta.
Além disso, outras narrativas recorrentes são as distopias e histórias relacionadas a robôs, escassez de alimento, distribuição agrária, desastres naturais, entre outros. São filmes que projetam o futuro com base na ocupação predatória dos seres humanos na Terra, a mudança climática, e inclusive já previam a existência de vírus que se espalhassem pelo mundo gerando caos.
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Resultados para a tendência V (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes, 2020)
Verificámos que muitos dos filmes efectivamente espelham a pressão social e a presença digital causam stress, que geram várias questões de identidade. No entanto, muitos destes títulos não refletem um novo posicionamento perante as dificuldades acima mencionadas. Não concretizam a procura por um equilíbrio entre bem-estar físico e mental. Não existe um reposicionamento, reconexão a si mesmo ou à natureza (estilos de vida saudáveis) e tão pouco existem momentos de silêncio.
Como é verificável na tabela abaixo dos 1.893 filmes, apenas 84 se relacionam Bem-Estar e Privacidade representando apenas 3,8% da totalidade. Verificámos que esta percentagem baixa é constante nos últimos 5 anos. Apenas verificámos uma percentagem superior a 5% em 2019, o que pode refletir a preocupação crescente dos indivíduos em procurarem um equilíbrio entre as várias vertentes da suas vidas.
Legenda e Fonte: Relação entre as exibições e a Hipótese. Autoria Própria.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Fase 1 – Inquéritos” open=”no”]
Resultados para a tendência I (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques,2020)
Analisando os resultados, constatamos que a maioria das respostas obtidas foram enviadas por pessoas que se identificam com o gênero feminino e entre as faixas etárias entre 18 a 24 anos e 25 a 34 anos. Considerando esse público, foi expressivo o número de pessoas que se identificam como pertencente a um ou mais grupos identitários, totalizando em 77% das respostas. Dentre os grupos mais mencionados na pesquisa, estão: Grupo Etário (55,7%), Gênero (44,3%), Nacionalidade (44,3%), Classe Social (24,6%), Classe Laboral (24,6%), Orientação Sexual (14,8%) e Raça/Etnia (9,8%), considerando que havia a possibilidade de escolherem até três opções. Outro dado interessante é que 60,7% da nossa amostra assinalou que essas identidades são muito ou extremamente importantes na sua formação enquanto indivíduo. Disso, refletimos sobre a expansão das possibilidades de agrupamento identitário e a própria autoconsciência dos indivíduos diante desse processo, bem como do papel central das identidades coletivas na formação dos sujeitos contemporâneos.
Sobre a forma como os moradores se relacionam com o espaço urbano em Lisboa, em uma questão a respeito da diversidade em termos de identidade na cidade, 44,3% das pessoas assinalaram a opção de extremamente diversa. E como exemplos dessa diversidade, os respondentes mencionaram, por exemplo, a expressiva presença de imigrantes na cidade, a promoção de eventos voltados para públicos identitários (como LGBT+), e a visita recorrente de turistas. Bairros e determinadas regiões da cidade também foram citados como representativos da diversidade, como Martim Moniz, Alameda e Bairro da Mouraria, assim como a própria Universidade de Lisboa. Outro tópico trabalhado foi a identificação de traços da memória coletiva no ambiente urbano, em que 86,9% dos participantes responderam de forma positiva, dando exemplos como o Padrão dos Descobrimentos, Ponte 25 de Abril e o Museu do Aljube; complementando com 90,2% de interesse pela história da cidade.
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Resultados para a tendência II (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos, 2020)
O inquérito foi desenvolvido para o público geral e habitantes em Lisboa e esteve disponível de 25 de abril de 2020 à 10 de maio de 2020 no Google Forms e teve um total 43 respondentes.
Sobre o que pode ser observado com análise do conteúdo das respostas recolhidas, apontamos as questões mais expressivas a seguir.
Identidade
- 18,6 % dos respondentes dizem não se encaixar nas denominações de auto expressão de orientação sexual mais tradicionais.
- As identidades Queer e LGBT+ aparecem como últimas colocada no quesito tradicionalidade.
- A inconstância dos dados relacionados à identidades faz conexão com a posição no ranking das produções audiovisuais relacionadas à hipótese, que permanece pioneira em número de produções. É possível dizer que as produções sobre essa temática fazem-se necessárias em resposta à busca de autoconhecimento e representatividade.
Desconfiança
- Redes sociais aparecem como a de menor confiança, seguidas pelos governos municipal e constitucional.
- Profissionais especializados, jornais e revistas, televisão, universidades são as redes de comunicação ou autoridades que as pessoas mais confiam, nessa ordem.
- Ao serem perguntados sobre o impacto do COVID-19 e a relação de confiança dessas redes de comunicação e autoridades, as áreas mais impactadas, segundo os respondentes, são os profissionais especializados e o governo constitucional.
- As medidas de restrição e controle durante COVID-19 auxiliaram no aumento da credibilidade e confiança das pessoas com as instituições governamentais.
- Redes sociais e notícias aparecem como menos confiáveis em meio a pandemia. Em contrapartida, essa desconfiança tem feito com que as pessoas evitem acreditar em notícias falsas, façam revisão de dados, confiram fontes e veracidade de fatos.
Tópicos em discussão e interesse nos temas
- Política, autoridades, desconfiança são os assuntos essenciais e os três tópicos de maior interesse dentro do menu de opções. Essa é uma característica de resposta óbvia e diretamente ligada à situação atual de incertezas em época de um mundo lutando contra o COVID-19.
- Ao que referem-se assuntos essenciais a serem discutidos em cinco anos aparecem os temas igualdade, discriminação, política, autoridades e diversidade.
- Transhumano, no-gender e desconfiança apresentam-se como os tópicos mais controversos e que dividem opinião.
Resultados para a tendência III (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
Após a análise dos resultados dos inquéritos, observa-se que mais de 70% do público inquirido utiliza dispositivos de novas tecnologias diariamente, embora mais de metade do mesmo considere que o uso dessas novas tecnologias pode impactar a saúde física (63%) e a saúde mental (70%) de modo negativo. Pode supor-se que a justificação disso assenta no facto de, actualmente, as novas tecnologias serem consideradas um modo de lazer, por mais de metade do público (55%) e facilitarem o contacto entre as pessoas, para a grande maioria (93%). Porém, 76% acredita que as novas tecnologias contribuem para o afastamento da interação presencial e física entre as pessoas.
Quanto à integração de inteligência artificial na vida em sociedade, as respostas estão quase equilibradas, embora o número de pessoas que considera que essa integração traz mais vantagens (53%) do que desvantagens (47%).
82% do público inquirido considera que o fácil acesso à informação possibilitado pelo desenvolvimento tecnológico é algo positivo, mas essa mesma percentagem confessa também que se sente incomodada por os seus dados serem registados por vários sites e por essas mesmas plataformas terem acesso ao seu histórico online.
No fundo, observa-se que o público inquirido acredita que os benefícios (acesso a mais informação, fácil modo de contacto, lazer e hobbies online, etc) das novas tecnologias se sobrepõem aos malefícios (impacto negativo na saúde física e mental, registo online de dados pessoais, afastamento físico entre as pessoas, etc). Talvez seja essa a razão de continuarem a utilizar tão frequentemente as novas tecnologias e os seus respetivos dispositivos, embora estejam também cientes das suas desvantagens.
Resultados para a tendência IV (Marianna Rosalles, Francisco Mateus, 2020)
Nosso intuito ao elaborar o inquérito foi buscar compreender qual é a ideia de sustentabilidade que as pessoas apresentam, por ser um tema amplo gostaríamos de saber o que vem em mente intuitivamente. Além disso, buscamos compreender se a experiência do confinamento alterou a relação das pessoas com essa tendência. A quarentena nos coloca em contato com a nossa produção de lixo, suscita reflexões a respeito do consumo, que tipo de produtor iremos incentivar em um contexto de crise econômica, entre outros dilemas. Pretendemos compreender se de fato esse potencial reflexivo se concretizou e de que maneiras.
Outra preocupação foi mensurar o que as pessoas sentem a respeito das políticas públicas nacionais e na cidade de Lisboa que levam em consideração a sustentabilidade. Compreender quais são as principais atitudes das pessoas em termos de atitudes sustentáveis também foi uma de nossas inquietações, nossa proposta é lançar luzes sobre que ações de forma pragmática as pessoas têm tomado.
Obtivemos 88 respostas desde o início do inquérito. O público que nosso inquérito conseguiu atingir é formado majoritariamente por pessoas do sexo feminino com 83%, enquanto que o sexo masculino se expressa com 15,9%. Além disso, é maior a quantidade de pessoas com idades de 25 a 34, compondo 33% do público, enquanto que de 18 a 24 anos respondem por 28,4% e de 35 a 44 por 23,9%. Também, os estudantes de licenciatura ou bacharelado são maioria com 59,1%, seguido pelo mestrado com 23,9 e o 12° ano com 14,8%.
Foi interessante reparar que, primeiramente, ninguém afirmou ser indiferente a sustentabilidade, todos, independente do grau de importância que dão ao tema, o consideram pertinente. Além disso, entre as ações cotidianas relacionadas à sustentabilidade a reciclagem se apresenta como principal atividade(80,7%) mas dar preferência a compra de pequenos produtores está logo em seguida (61%) e a compra de itens usados também obteve uma expressiva adesão (44,3%).
Em termos de avaliação de políticas públicas, tanto de Lisboa quanto na perspectiva nacional, as respostas mais escolhidas foram parcialmente satisfatórias e em segundo lugar insatisfatórias. Em geral a avaliação foi predominantemente negativa.
No âmbito da discussão internacional da temática da sustentabilidade, 44,6% avaliam que a discussão ocorre com frequência regular e a segunda maior parte dos participantes, 39,8% respondeu que o tema é pouco discutido.
A questão número 7 questiona se a percepção sobre sustentabilidade mudou no contexto pandêmico e é a única que permite que a resposta seja justificada. Apenas 19 pessoas responderam que o confinamento não alterou sua percepção sobre o tema, a ampla maioria afirmou que passou a reparar na quantia de lixo que produz, passou a consumir menos, comprar apenas o essencial, utilizar os alimentos de forma integral para evitar o desperdício, tentar produzir seus próprios alimentos para não precisar se deslocar para comprar. Algumas pessoas comentam que agora tem mais tempo para reparar na natureza, se dedicar à sua horta, perceber uma diminuição da poluição e até um aumento em sua qualidade de vida. Outra preocupação recorrente é o insight de que as economias locais devem ter mais autonomia para que não fiquem reféns do sistema econômico global, foram sugeridas formas alternativas de abastecimento do alimento, hortas urbanas e incentivo à agricultura familiar.
No entanto, há uma preocupação com o descarte de itens de uso único como os equipamentos de proteção individual utilizado no combate ao covid. As pessoas relatam ter reparado que máscaras e luvas são deitadas na rua.
A ideia de que é necessário que sustentabilidade e crescimento econômico caminhem juntas foi reforçada tanto nessa pergunta como na seguinte, apresenta-se também uma preocupação com a desigualdade social que se evidencia no contexto pandêmico.
Quando questionados sobre a sustentabilidade no desenvolvimento social por unanimidade venceu a afirmação de que pode ser uma forma de melhorar a qualidade de vida sem prejudicar o meio ambiente. Sobre o nível de informação a respeito da sustentabilidade 70,5% afirmam que as pessoas estão pouco informadas. Quanto às empresas, 67% afirmam que as corporações estão informadas mas tomando poucas atitudes sustentáveis. Em se tratando de uma análise da cidade de Lisboa 71% dos entrevistados afirmam que o principal problema ambiental é a poluição do ar causada pela grande circulação de automóveis, em seguida a poluição do rio Tejo foi apontada como o segundo problema mais relevante.
Um dado surpreendente quanto à sustentabilidade nas cidades foi a priorização do uso de energias renováveis, apontada por 77,3% dos entrevistados, a segunda estratégia mais relevante foi a valorização dos espaços verdes (61,4%) e em seguida a adoção de carros e autocarros elétricos. Quando questionados sobre o quanto a economia circular seria relevante para a sustentabilidade a maioria das pessoas afirma que é um método interessante.
Resultados para a tendência V (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes, 2020)
O objetivo do formulário é compreender algumas questões relacionadas ao bem estar, à saúde mental, à privacidade e às pressões nas dinâmicas sociais, neste período de confinamento social de residentes que estudam ou/e trabalham na zona metropolitana de Lisboa.
O formulário foi aplicado via google forms, sendo encerrado com um total de 203 respostas.
As idades dos participantes variam dos 20 aos 72 anos de idade, sendo mais predominante participantes com idade dos 22 aos 48 anos, confirmando o direcionamento correto para o público alvo proposto. Notou-se que duas pessoas não responderam a essa questão, o que não causa grande impacto na análise geral dos resultados. A escolaridade concluída analisada nas respostas é composta, em sua maioria, pelos que possuem ensino superior, totalizando 104 participantes (65,4%), frente a 25 (15,7%) que ainda não ingressaram ao universo acadêmico e o total de 19, que responderam possuir pós doutoramento finalizado (11,9%).
Durante o estado de emergência, os números sugerem uma confiança quanto à estabilidade financeira dos participantes e/ou de seus agregados nesse período. Mais da metade (61,6%) revelam não terem e nem preverem uma quebra nos rendimentos, enquanto (38,4%) responderam que sim.
Embora dois participantes não tenham respondido qual a atual situação quanto à condição de isolamento em casa, 129 responderam que estão a se isolar (82,2%), 25 que em parte (15,9%) e apenas três participantes responderam que não estão a fazer isolamento em casa. Desses três, dois estão categorizados como profissionais de saúde, o que explica a resposta negativa.
No entanto, embora a boa vontade no cumprimento das medidas de isolamento em casa correspondam a maioria das respostas, para que o isolamento seja desempenhado é necessário que a casa esteja abastecida, como mostra o gráfico. Para esta questão, foi disponibilizada a opção de respostas múltiplas e abertas. Sendo assim, somaram-se 137 respostas de saídas para ida às compras do tipo mercearias (86,7%), 51 para caminhar (32,3%), 38 para o trabalho (24,1%), 18 para passear o animal de estimação (11,4%), 12 para apanhar sol (7,6%). Outras opções obtiveram apenas uma resposta, como listadas abaixo no gráfico.
Embora o cenário da pandemia exija um confinamento social e cerca de mais da metade dos participantes (53%) tenham respondido que saem de casa para atividades não essenciais como, passear o animal de estimação, caminhar, apanhar sol, andar de bicicleta e correr, cerca de (70%) dos participantes estariam quase ou totalmente dispostos (de 6 a 10, na escala) a cederem os seus dados de localização, de forma a contribuir para o controle da disseminação do coronavírus, e apenas (29%) estariam nada ou quase nada dispostos a cederem. Esse resultado vai de encontro, ou seja, vai contra com as expectativas geradas na formulação deste inquérito. Possivelmente a falta de mais informações sobre o sistema do “grande irmão” tenha colaborado, ou simplesmente não existe uma importância quanto aos dados de privacidade para os participantes.
Em uma escala de 1 a 10, onde 1 representa nada saudável e 10 totalmente saudável, o número de participantes que se sentiam mentalmente saudáveis, antes do isolamento devido à pandemia do coronavírus, era de alcance relativamente alto, para 121 participantes que responderam de 8 a 10.
Na sequência dessa pergunta, com opção de respostas múltiplas e abertas, 122 participantes marcaram o trabalho (77,7%) como uma das atividades desempenhadas que colaboraram para o bem estar mental antes do isolamento. O tempo com a família (65%) também foi um dos fatores, representando 102 respostas, assim como o tempo para relaxar (59,2%), seguido de atividades físicas (56,7%), estudos (30,6%) e tarefas domésticas (28%). Tempo com os amigos somaram 8 respostas.
Ao contrário das respostas positivas quanto à saúde mental antes do isolamento pela pandemia do coronavírus, onde numa escala de 1 a 10, em que o 1, representa nada saudável e o 10, totalmente saudável, há quase uma inversão nas respostas dos participantes, que apontam uma piora. Durante o isolamento apenas (10,7%) dos participantes sentem-se totalmente saudáveis, uma queda de mais da metade (-52%) comparado com o cenário anterior à pandemia. Quedas maiores referidas ao 9 na escala, de aproximadamente (-66%), e ao 8, de cerca de (-27%) comparados ao cenário anterior. A partir do número 7, as taxas apontam para um crescimento, sendo o 7 (+70%), o número 6 (+237%), o 5 (+566%), o 4 (+25%), o 3 (+150%), o 2 (+400%) e o 1 (+100%), comparados aos números antes do isolamento.
Embora os dados apontem para uma mudança significativa quanto à saúde mental antes e durante o isolamento devido a pandemia do coronavírus, as atividades desempenhadas antes, como colaboradoras para níveis referentes a uma ótima saúde mental, revelam uma pequena queda na fase durante o isolamento, com exceção das tarefas domésticas, que aumentaram (+61%). As quedas constatadas foram relacionadas ao trabalho (-14%), aos estudos (-19%), às atividades físicas (-30%), ao tempo para relaxar (-16%) e ao tempo com a família (-30%). No cruzamento dos dados das quatro tabelas associadas, é possível perceber que as atividades desempenhadas, em um cenário anterior à pandemia, foram relacionadas com níveis positivos de saúde mental. Essas atividades desempenhadas tiveram uma variação pequena que praticamente foram mantidas durante a pandemia do coronavírus. No entanto, o nível de saúde mental durante a pandemia despencou. Importante ressaltar que o aumento do número de tarefas domésticas também colaboram para os números baixos de saúde mental. Isso pode significar que essa queda não está nas atividades em si, mas na qualidade em como elas são exercidas.
Outro gráfico que corrobora com a baixa qualidade no desempenho das atividades relaciona-se com as pressões para entrega de resultados. Seja em relação ao teletrabalho e/ou estudos, seja nas atividades domésticas e/ou escolares dos filhos e/ou familiares, foi constatado, dentro de uma escala de 1 a 10, onde 1 representa nada pressionado e 10 totalmente pressionado, que cerca de (71%) dos participantes sentem-se pressionados, na soma referente às escolhas de 6 a 10. Ao contrário, apenas (17%) dos participantes sentem-se pouco ou nada pressionados, na soma referente às escolhas de 1 a 5.
Essa pressão constante para entrega de resultados, somada ao baixo nível de saúde mental durante o confinamento, pode impactar e exercer em uma quantidade maior de participantes que estariam dispostos a ceder seus dados pessoais para contribuir no combate e tratamento do coronavírus para que assim a “normalidade” pudesse ser estabelecida novamente. Na escala de 1 a 10, onde 1 representa nada disposto e 10, totalmente disposto, apenas 24 participantes (15%) estariam nada ou quase nada dispostos, tendo marcado as opções de 1 a 5, e 134 participantes (84%) estariam quase ou totalmente dispostos.
A alta disponibilidade na cessão dos dados pessoais pelos participantes, sejam eles de localização ou de saúde, para contribuir no combate e no tratamento do coronavírus, pode estar relacionado também com o nível de satisfação com as novas formas de socializar impostas pela quarentena, embora sejam os únicos meios disponíveis. O nível de satisfação estabelecido de 1 a 10, sendo 1 nada satisfeito, e 10 totalmente satisfeito, foi marcado com apenas (7,5%) como totalmente satisfeito e um nível abaixo, 9, com (10,7%). Níveis baixos também, de 1 a 4, considerados como nada ou pouco satisfeito com (11%), níveis medianos 5 e 6 aproximadamente (15%) cada um, e nos níveis de satisfação parcial, 7 e 8, somam (39,6%).
Atualmente, durante o cenário de pandemia do coronavírus, que exige um confinamento social, os participantes responderam que algumas atividades têm ajudado-lhes a manterem-se saudáveis mentalmente. São elas: assistir filmes (68,8%), ouvir música (53,5%), acessar internet (50,3%), leitura (42,8%), caminhada (37,1%), exercícios físicos, inclusive alongamentos e correr na passadeira (15%), yoga (14,5%), não fazer nada (8,8%), dança (8,2%), meditação (5,7%), trabalhos manuais como artesanato e bricolage (1,9%), dentre outras atividades.[/toggle][/accordian][accordian divider_line=”” class=”” id=””][toggle title=”Fase 1 – Entrevistas” open=”no”]
Resultados para a tendência I (Heloisa Keiko, Gabriela Orestes, Gabriela Abreu, Cláudia Marques,2020)
A etapa das entrevistas foi crucial para a consolidação de informações recolhidas em passos anteriores da pesquisa, sublinhadas a partir da fala de especialistas em diferentes áreas atreladas à hipótese e de moradores da cidade de Lisboa. Foi um processo de dar voz aos sinais recolhidos (criativos e em espaços), no clipping, na planificação audiovisual e na própria desk research. Assim, enquanto método etnográfico, as entrevistas permitiram uma maior aproximação com o público, em um processo de validação dos indícios que começavam a despontar, trazendo os fenômenos observados para o plano da percepção e assimilação social.
A partir desse momento, com a potencialização de reflexões sobre temas que se destacavam e a atividade de ouvir a opinião dos moradores de Lisboa, a tendência passou por dois processos distintos e simultâneos: a ampliação dos tópicos e a corroboração por profissionais de áreas correlatas, que agregaram novas perspectivas e possibilidades de aplicação dos insights em formulação, e a indicação de uma mentalidade coletiva mais localizada, refletindo em um primeiro plano o contexto português e, numa leitura mais aprofundada, europeu.
Usando o texto original da hipótese como referencial e o que julgamos pertinente com as informações recolhidas durante a pesquisa, optamos pela elaboração de um roteiro-base, abordando as seguintes temáticas centrais: Reconhecimento identitário; Principais influências/fontes de narrativas; A identidade no espaço urbano; Memória coletiva; Nostalgia; O papel da experiência em escolhas de consumo e lazer; Relação entre memória e espaço urbano; Gamificação; Hibridização de linguagens e plataformas; Relação pessoal com a cidade; Origens e perspectivas futuras; Globalização; Impacto na rotina e atividades gerais causado pelo Covid-19.
Público geral
No que diz respeito ao público geral, formado por moradores de Lisboa, o roteiro foi levemente adaptado conforme as informações prévias sobre o interlocutor ou condução da entrevista, considerando tópicos de maior interesse e rumos de cada conversa. A proposta inicial era de realização das entrevistas em encontros presenciais, o que foi impossibilitado com as medidas de isolamento social, mediante a pandemia do Covid-19. Como alternativa, optamos pelo uso de videochamadas, em conversas que duraram entre 30 minutos e uma hora, realizadas entre 15 de abril e 03 de maio de 2020. É fundamental ressaltar a influência do contexto pandêmico, explicitada na própria forma de viabilização dessa troca, nas respostas e dados coletados, em especial no que diz respeito às reflexões pessoais e vivências urbanas, postas em cheque com a restrição da circulação em vigor durante os últimos meses.
Ao total, entrevistamos oito pessoas, entre 26 e 68 anos, de diferentes nacionalidades (alemã, portuguesa, brasileira, húngara), com trajetórias profissionais e de vida que também se distinguem, e apresentando razões diversas para viver em Lisboa (estudo, trabalho, laços familiares, manifestações artísticas, troca cultural, entre outras). Selecionamos fragmentos de quatro entrevistas, representativos para o passo como um todo.
Especialistas
Com relação aos especialistas, buscamos profissionais relacionados às áreas que consideramos como centrais para a formulação da tendência, que são: identidade; nostalgia; urbanismo; branding e a economia experienciada; experiência digital e gamificação; Para essas entrevistas, o roteiro-base foi adaptado conforme a área de atuação do especialista em questão, com o intuito de explorarmos ao máximo a experiência profissional de cada um deles, para traçarmos uma conexão com os outros dados levantados. 5 entrevistas.
Considerações
A etapa das entrevistas foi crucial para o desenvolvimento da pesquisa, trazendo insights em processo de formulação para o plano das vivências e percepções ao nível do indivíduo. Mais do que o propósito anunciado de lugares e objetos, ou ainda como os conteúdos da tendência são abordados na mídia, foi possível contemplar seus efeitos e relacioná-los à percepção de pessoas reais e suas experiências com cada um dos tópicos investigados. Nas entrevistas com o público geral, os temas da identidade e relação com o espaço urbano da cidade de Lisboa prevaleceram, o que pode ter uma relação direta com as restrições de circulação impostas pelo Covid-19, e uma aparente predisposição para a reflexão sobre origens, narrativas que provocam identificação e o processo de transformação do reconhecimento identitário ao longo da vida – nossos interlocutores demonstraram certo entusiasmo em compartilhar suas histórias e visões sobre o assunto. Nesse ponto, a família apareceu como um fator central na criação de narrativas e valores, bem como processos migratórios, marcantes no contexto da cidade de Lisboa. Os entrevistados também foram capazes de distinguir manifestações de diferentes culturas no espaço da cidade, o que pode ser relacionado com o multiculturalismo em Lisboa e o processo de incorporação e assimilação de expressões identitárias que se diferem da portuguesa. Sobre a memória coletiva, observamos dois caminhos diferentes: um de valorização, como uma forma de ancorar o presente em feitos passados, preservando raízes, e outra de contestação, em que a história oficial e seus marcos passam por um processo de questionamento e reelaboração, a partir de parâmetros contemporâneos e a valorização de outros agentes/marcos. No que tange às entrevistas com especialistas, partindo dos cinco tópicos pré-estipulados, acessamos informações mais personalizadas e nutridas de uma visão mercadológica e/ou acadêmica, agregando argumentos de autoridade contemporâneos no processo de pesquisa, o que foi muito interessante pela contemplação de como os subtemas da tendência operam de forma independente no contexto da “vida real”.
Resultados para a tendência II (Gustavo da Silva, Jefferson Pereira, William dos Santos,2020)
Entrevistas com Criadores
Entre os dias 20 e 29 de Abril de 2020, foram realizadas entrevistas em profundidade com sete criadores de projetos criativos nacionais e internacionais relacionados à hipótese de tendência em pesquisa, entre 24 a 47 anos de idade e com projectos que existem, em média, há 5 anos. As entrevistas foram realizadas por videoconferência, totalizando pouco mais de seis horas de gravação, utilizando o roteiro semi-estruturado que pretendeu: Entender as motivações por trás da criação dos projetos criativos; Ajudar-nos a entender a força de cada uma das temáticas encontradas por nós durante as pesquisas e o quanto fazem sentido para este público e o potencial de crescimento de cada uma, a fim de colaborar na posterior formulação de nossa tendência; Buscar novos Sinais/Espaços Cool na cidade de Lisboa relacionados à hipótese.
Foi possível perceber eixos que se destacaram com maior força e que se interligam entre os entrevistados e temáticas com mais clareza, ainda que todas as palavras-chave e principalmente estes eixos, de alguma forma parecem dialogar entre si.
Igualdade (Aceitação, Gênero/No Gender, Diversidade e Discriminação)
Igualdade certamente surge como a palavra-chave de maior força, apresentando importância entre a maioria dos entrevistados e articulando de maneira mais forte com as temáticas de aceitação, gênero, diversidade e discriminação. Também houve uma ligação, ainda que mais fraca com questões políticas. Os insights possíveis foram:
- Igualdade é um conceito bastante forte para a maioria dos entrevistados, aparecendo como uma luta coletiva e que deve ser realizada de forma ativa por nós mesmos, não esperando que outros, como autoridades, lutem por ela, apesar de haver um entendimento de que a política pudesse ser um instrumento valioso.
- A Igualdade surge como um conceito de aceitação da diferença, ou seja, não somos todos iguais, é verdade, mas devemos aceitar e respeitar estas diferenças. Uma nova palavra que pode definir esse conceito é a equidade, que é o entendimento dessas diferenças e desigualdades presentes na sociedade para que as pessoas sejam tratadas de forma mais proporcional.
- Aceitação é vista de uma forma mais ampla, principalmente referindo-se à aceitação própria e não pelo outro, que parece apresentar uma conotação negativa. Aqui surgem de forma muito forte conceitos como liberdade para ser quem é e se expressar da forma que se sente mais confortável e a conquista de espaços para sua narrativas próprias.
- Ao conceito de gênero/no gender, vemos a possibilidade de ampliação dentro das próprias categorias tradicionais (homem/mulher) e novamente a liberdade para se expressar e vestir da forma que preferir.
- Também foi possível ver a educação, não necessariamente de forma tradicional, mas com maior foco na formação de melhores pessoas, como ferramenta para se alcançar igualdade.
- Apesar desta luta e esperança, a igualdade parece ainda uma realidade distante e utópica, sendo barrada principalmente pelo próprio sistema e classes dominantes.
- As palavras diversidade e inclusão estão em evidência, porém, são vistas com seu uso já gastos e utilizadas de maneira muito superficial. Estes conceitos devem ser ampliados e aprofundados, levando em conta a diversidade dentro das próprias categorias que hoje já são trabalhadas (negros, homossexuais, homens..) e de forma
- Discriminação é vista como algo muito presente, de forma estrutural e enraizada, mantida pelas classes que detém o poder, que tem medo de perdê-lo, e que mesmo com toda a luta é muito difícil de ser combatida.
Política (Autoridades e Desconfiança)
Este eixo, puxado pela palavra-chave Política, também demonstra bastante força entre os entrevistados, estando relacionado ao eixo anterior uma vez que os sentimentos observados aqui se dão em busca de uma igualdade, em sua mais amplo forma. Podemos ter como insights então:
- Há um movimento de desconfiança nas autoridades tradicionais como os grandes media.
- Percebemos a desconfiança como uma ferramenta de proteção contra as opressões sofridas, que são sentidas de forma muito forte, até mesmo contra a própria vida.
- Mesmo não sendo perguntada de forma direta, a raiva também é citada e percebida, principalmente relacionada à política, autoridades e uma luta para driblar o sistema atual e classes dominantes, que sentem medo desta revolta.
- A política também é vista de forma mais ampla e ferramenta de transformação. Nossos corpos são políticos, tudo o que produzimos é posicionamento político.
- Há também o entendimento de e valorização de autoridades genuínas, não políticas mas que tenham estudando, sejam especialistas e tenham capacitação para falar de um determinado assunto, o que em tempos de debates virtuais, se torna cada vez mais importante.
Transhumano
Esta palavra aparece de forma mais desconexa das demais temáticas envolvidas na hipótese. Mesmo entre entrevistados supostamente ligados diretamente ao tema, o movimento parece ser bastante emergente, principalmente em Portugal, porém com potencial de crescimento. Como insights obtivemos:
- A grande questão aqui é a expansão da consciência humana, não apenas através do uso de novas tecnologias (o que na verdade é apenas uma das correntes deste movimento), mas também através de medicamentos e terapias alternativas.
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Resultados para a tendência III (Irina Martins, Filipa Pina, Nanqian Jiang, 2020)
O público entrevistado, num total de quatro entrevistas, apresenta unanimidade referente aos benefícios das novas tecnologias. Consideram que uma das suas grandes vantagens é um acesso mais fácil, rápido e eficaz à comunicação e à informação. Quanto à presença das novas tecnologias na vida em sociedade, alguns dos entrevistados consideram que essa presença não é intrinsecamente má, porque ajuda a facilitar algumas tarefas humanas. Contudo, as opiniões oscilam quanto a uma maior integração da inteligência artificial na vida em sociedade, o que demonstra alguma reticência quanto à mesma. A inteligência artificial é, talvez, a área na qual há algumas dúvidas e não há uma confiança total. As pessoas tendem a usufruir e a usar as novas tecnologias para as ajudar, auxiliar e entreter, mas não para as substituir. Tal acontece porque aparenta haver uma preocupação e atenção dadas à racionalidade humana e aos sentimentos humanos, na tomada de decisões – características essas que alguns entrevistados consideram difíceis de emular e replicar.
O público entrevistado parece concordar quanto ao impacto das novas tecnologias na saúde. A nível mental consideram que esse impacto pode ser negativo, indo ao encontro das opiniões nas respostas recolhidas no inquérito, acerca da mesma questão. Mas, apesar disso, pode também contribuir para uma maior inclusão de pessoas em grupos e comunidades com interesses semelhantes, nos quais podem conhecer outras pessoas e debater pontos de vista. O público entrevistado revela, também, estar alerta do progresso feito na área da saúde física (através de novos tratamentos, novos aparelhos, etc) possibilitado pelas novas tecnologias e pelo respetivo desenvolvimento. No geral, tanto o público do inquérito como os entrevistados estão cientes das potencialidades das novas tecnologias, bem como das suas desvantagens.
O facto de as novas tecnologias e o mundo virtual serem viciantes e estimulantes, através da tão intensa partilha de informação e constante inovação (que causam curiosidade), são causas evocadas como justificação para o grande número de horas que a população passa a utilizar as novas tecnologias e os dispositivos que são fruto das mesmas.
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Resultados para a tendência IV (Marianna Rosalles, Francisco Mateus, 2020)
Optamos por entrevistar pessoas que representassem os diferentes âmbitos da sustentabilidade: membro de uma corporação, agente na política institucional, cidadão com iniciativa autônoma.
A entrevista com a analista de marketing foi realizada por telefone no dia 7 de maio. A conversa durou cerca de 40 minutos e revelou que a empresa está buscando incorporar a sustentabilidade como uma estratégia de engajar as pessoas a utilizarem os serviços do site. Um aspecto interessante foi o fato de que a plataforma não visa incentivar o consumo, não promove anúncios com gatilhos mentais de escassez por exemplo, ela apenas se comporta como um ponto de encontro entre vendedores e compradores. A entrevistada afirma que o aspecto de maior adesão dos consumidores é a “escolha inteligente” de adquirir um bem em ótimas condições por valores abaixo do mercado. Ela afirma ainda que a empresa tem sido associada aos valores da sustentabilidade por exemplo por influencers que os marcam nas redes sociais e está tentando se apropriar disso como uma forma de apresentar que além do benefício econômico, a compra de usados também contribui para a preservação do planeta. Comentou também que há um estudo que aponta que o seu grupo evitou a emissão de 900 mil toneladas de CO2 em 2019. A analista ressalta que a pandemia foi um “acelador” de futuros para a empresa, todos os funcionários estão em teletrabalho e assim devem permanecer até setembro e houve uma atualização do branding da empresa bem como a adoção de pagamentos digitais e do sistema delivery.
A entrevista com a engenheira de ambiente foi realizada por telefone no dia 4 de maio. A conversa, que durou cerca 30 minutos, abordou questões como a agricultura urbana, a ressignificação de espaços urbanos, a economia circular e o cenário pandêmico. Ressalta-se da entrevista o impacto positivo dos projetos urbanos à cidade, promovendo o bem estar, os laços comunitários e a ressignificação de espaços em desuso. Neste momento de epidemia, a agricultura urbana se mostra como alternativa aos supermercados, com fila e escassez de produtos. Mas também, a agricultura urbana é uma forma de democratizar o acesso à comida e também de evitar o desperdício de alimentos, sendo a compostagem uma prática ligada à ideia de economia circular.
A entrevista com o deputado foi realizada no dia 7 de maio de 2020 por meio da plataforma Zoom. A conversa feita por videochamada durou 40 minutos, tendo sido abordadas questões como o ciclismo, a agricultura urbana, a sustentabilidade em tempos de pandemia e os novas modelos econômicos. Na entrevista ficou evidente que o uso da bicicleta durante a pandemia, como forma de promover o distanciamento social, e a agricultura urbana, ligada à ideia de segurança alimentar, são ações que fazem repensar a relação do indivíduo com a cidade, possibilitando uma nova mentalidade a respeito dos espaços. Também, estas duas ações são vistas como formas de organização social e de pacto coletivo que colaboram para uma cidade mais sustentável e com mais bem estar.
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Resultados para a tendência V (Andreia Carneiro, Caroline Rocha, Karliete Nunes, 2020)
Análise das respostas da entrevista a profissionais de saúde em Portugal.
O objetivo das entrevistas é compreender como os profissionais de saúde, de forma geral, sentem-se em meio a pandemia do coronavírus, uma vez que encontram-se no combate de fronte e podem receber pressões que o levem a um quadro problemático, como o de estresse, por exemplo.
As entrevistas foram realizadas do dia 30 de abril a 6 de maio de 2020, com 18 profissionais de saúde que trabalham em área dedicada ao atendimento direto ou indireto de pacientes com suspeita de COVID-19, na região metropolitana de Lisboa. Devido ao problema do coronavírus – que gerou uma demanda maior de requisição aos profissionais de saúde para atendimento nos hospitais, e consequentemente a disponibilidade de horário para concessão das entrevistas – enviámos as perguntas das entrevistas, conforme nos foi solicitado pelos profissionais, via google forms, a fim de facilitar o seu preenchimento, de acordo com o tempo disponível de cada profissional.
Quando perguntados se sentem-se em segurança para exercer a profissão, 14 profissionais afirmaram que sim (77,8%). Um deles ponderou que no entanto, é bastante estressante toda a situação da pandemia e que tem sentido medo de ser contaminado ou que alguém de sua equipa seja. Apenas três profissionais, responderam que não sentem-se seguros ao exercer a profissão, sendo que dois reforçaram que a suas insegurança se dão em virtude da insuficiência de materiais e que os mesmos são de baixa qualidade ao nível da proteção..
Quase todos os profissionais (94,4%) temem ser condutores de alguma doença ou agente parasitário para a sua residência. Apenas uma enfermeira disse não temer.
Importante ressaltar que, nenhum dos profissionais entrevistados recebem algum tipo de atendimento psicossocial neste período da pandemia. Perguntados como se sentem quanto aos resultados dos trabalhos desempenhados como profissionais de saúde, 13 profissionais responderam positivamente, representado no gráfico como “P+” com (72,2%) que se sentem úteis, reconhecidos, orgulhosos, satisfeitos, um pouco aquém do que poderia ajudar e um deles até cobra os colegas e utentes o cumprimento das normas de segurança.
Os outros cinco profissionais responderam negativamente “N-” e um deles, representado por “M+-“, no gráfico, sente que o resultado do seu trabalho é satisfatório, mas que no entanto, acredita ser mal remunerado e pouco reconhecido pela sociedade. Esse criticou, inclusive desabafando, “só agora se lembraram de bater palmas?”. Os outros profissionais utilizaram palavras para definirem como se sentem em relação aos resultados de seu trabalho como: apreensivo; ignorado pela Instituição, pelo Ministério da Saúde e pela sociedade; não reconhecido pelos seus esforços e com receio de ser infectado e infectar seus familiares, mesmo estando em isolamento familiar, desde final de fevereiro.
Podemos concluir que, existe uma preocupação com maior parte dos profissionais da saúde em monitorar constantemente os sintomas relacionados ao coronavírus e de ser condutor de alguma doença ou agente parasitário para as suas residências, embora a maior parte se sinta em segurança para exercer a profissão, exceto quando não há disponibilidade de equipamento de proteção individual adequado, o que pode comprometer o exercício da profissão e desencadear em problemas de saúde mental. Podemos perceber também que não existe uma grande pressão hierárquica, nem familiar dos pacientes, para cerca de doze/treze profissionais dos dezoito entrevistados, no contexto da cidade de Lisboa. Foi possível perceber também, que falta um programa de atendimento psicossocial para ajudar esses profissionais de saúde, que lidam com problemas alheios e vivem um desafio constante para manterem-se em equilíbrio mental e fornecer segurança aos seus pacientes. A falta de um programa de atendimento a esses profissionais pode trazer a impressão de que não existe um reconhecimento dos esforços empenhados, como mencionado por alguns.
Análise das respostas da entrevista à profissionais de saúde mental em Portugal
O objetivo das entrevistas é compreender como os profissionais de saúde mental, de forma geral, sentem-se em relação ao trabalho desempenhado em meio a pandemia do coronavírus, bem como entender os problemas relatados pelos pacientes que eles prestam atendimento.
Devido ao problema do coronavírus – que gerou uma demanda maior de requisição aos profissionais de saúde para atendimento nos hospitais, e consequentemente a disponibilidade de horário para concessão das entrevistas – enviamos as perguntas das entrevistas, conforme nos foi solicitado pelos profissionais, via google forms, a fim de facilitar o seu preenchimento, de acordo com o tempo disponível de cada profissional.
As entrevistas foram realizadas do dia 2 a 7 de maio de 2020, com seis profissionais de saúde mental que trabalham na região metropolitana de Lisboa. A média de horas trabalhadas por esses profissionais variam de 4 a 12 horas diárias. Quatro (66,7%) desses profissionais têm atendido pessoas com problemas relacionados ao confinamento social causados pelos pandemia de COVID-19. Nesses atendimentos, os profissionais relataram que os seus pacientes queixaram-se desde problemas como tosse; febre; medo de isolamento dos seus, caso fosse internado; ansiedade; depressão; bem como medo de não poderem deslocar-se ao hospital porque os familiares não deixam. Desses problemas, os que mais causam preocupação e ansiedade nos pacientes atendidos são as consequências financeiras da suspensão das atividades produtivas; a possibilidade de contrair o coronavírus; o fim da interação social como é conhecido; bem como o medo de perder algum familiar por COVID-19.
Nesses atendimentos, quando questionados sobre como os pacientes têm lidado com o confinamento associados às obrigações laborais (teletrabalho), atividades domésticas e cuidados com a família, as reações têm sido negativas. Foram relatados diversos problemas, desde ansiedade, dificuldades, sentimento de incapacidade, impotência até mesmo desânimo marcado. Dois profissionais de saúde mental também relataram que atenderam pacientes com COVID-19 e que eles lidam com a situação com grande revolta, preocupação e medo.
Nenhum dos profissionais entrevistados receberam algum tipo de atendimento psicossocial nesse período de enfrentamento da pandemia, no entanto, todos relacionaram sentimentos positivos quanto aos resultados do trabalho desempenhado enquanto profissional de saúde.
Podemos concluir que, para além dos problemas já tratados normalmente pelos profissionais de saúde mental em seus pacientes, a pandemia do Covid-19 trouxe outras queixas relacionadas ao bem estar, como preocupações, medos e ansiedades. É possível perceber que falta um programa de atendimento psicossocial para ajudar esses profissionais de saúde, que lidam com problemas alheios e vivem um desafio constante para manterem-se em equilíbrio mental e fornecer segurança aos seus pacientes. A falta de um programa de atendimento a esses profissionais pode trazer a impressão de que não existe um reconhecimento dos esforços empenhados, como mencionado por alguns.